por Mario Sales, FRC.:, S.:I.:;M.:M.:
“O conhecimento do Espírito absoluto, assim como a refulgência do sol ou o calor no fogo não é outra cousa senão a própria Essência absoluta", diz Shankaracharya. É "o Espirito do Fogo", não o próprio Fogo; portanto, "os atributos deste último, Calor ou Chama não são atributos do Espírito, mas sim daquilo de que este Espírito é causa inconsciente". Não é a sentença anterior a verdadeira tônica da filosofia dos últimos Rosacruzes?"
Helena Petrovna Blavatsky, in “ A Doutrina Secreta”, volume 1, Cosmogênese, pág 75, Ed.Pensamento, 1973
Estou iniciando com um grande amigo, antigo companheiro de Heptada Martinista Guarulhos, um estudo sistemático da Doutrina Secreta.
Começamos, acacianamente, pelo princípio, o primeiro volume intitulado “Cosmogênese” onde Blavatsky principia seu ambicioso projeto de descrever a história do Conhecimento Esotérico em sua totalidade.
Como todos sabem, a metodologia segue a ordem de falar sobre a formação do Universo, a Cosmogênese; depois, o Simbolismo Arcaico Universal, o volume II; no volume III, a história da humanidade,as chamadas raças e sub raças, estudo que ela denominou Antropogênese; no volume IV, O Simbolismo Arcaico do Mundo das Religiões e da Ciência, na tentativa de mostrar a origem comum da cultura humana; no volume V, um comparativo entre Ciência, Religião e Filosofia, na mesma linha do anterior, em busca de conexões entre as diversas linhas de manifestação da cultura; e finalmente no volume VI, a Filosofia Oculta em si, que ela denominou “Objeto dos Mistérios e Prática da Filosofia Oculta”.
Este ambicioso projeto literário foi coroado anos mais tarde pela publicação do Glossário Teosófico, obra fundamental de apoio à leitura dos seis tomos anteriores.
No Brasil, o Glossário, publicado originalmente em 1892, obra póstuma, que veio a luz um ano após sua transição, foi traduzido pela Editora Ground, em 1988, em primeira edição, e em segunda edição em 1992.
O Glossário possui 18000 verbetes e é uma obra de fôlego, fundamental ao estudo do Misticismo, seja o hindu ou o Ocidental.
O que chama atenção na Doutrina Secreta, no entanto, é a mudança de linha de pensamento brusca que ocorre de um parágrafo para outro, como se o texto não fosse de um único autor mais a combinação da colaboração de outras mentes.
Como exemplo, no princípio do volume da Cosmogênese, no alto da página 74 da edição citada.
Kuthumi, Morya e Saint Germain, de pé, atrás. Blavatsky sentada.
Após fazer uma bela e erudita introdução acerca da natureza do Cosmos e da compreensão do que as religiões ocidentais costumam nomear pelo termo Deus, mostrando a peculiar perspectiva que a cultura vedântica e budista tem sobre o tema, repentinamente muda o assunto e discorre por dois parágrafos sobre símbolos esotéricos, relacionados a explicação da Manifestação do Imanifesto e Incognoscível no mundo.
Na verdade, a própria Blavatsky dizia que realmente ela não era a autora do texto da Doutrina Secreta, mas sua redatora.
Seu companheiro de trabalho, o Coronel Olcott, descrevia assim seu trabalho literário:
Olcott
“Vê-la trabalhando era uma experiência rara e inesquecível. Sentávamo-nos geralmente em lados opostos de uma grande mesa, e eu podia ver cada movimento seu. A sua pena voava sobre a página; quando ela parava de repente, olhava para o espaço com o olho vazio do profeta clarividente, diminuía sua visão como que para olhar algo suspenso invisivelmente no ar à sua frente, e começava a copiar em seu papel o que via. A citação terminava, e seus olhos retomavam a expressão natural e ela continuava a escrever até parar novamente por uma interrupção similar… Uma destas caligrafias de H.P.B. era muito pequena, mas clara; uma, grossa e livre; outra, clara de tamanho médio, e muito legível; e uma apressada e difícil de ler, com seus aa, xx e ee singulares e exóticos. Havia também a maior diferença possível no inglês desses vários estilos. Às vezes eu tinha de fazer correções em cada linha, enquanto que em outras eu podia passar muitas páginas com quase nenhum erro de língua ou de grafia para corrigir. Os mais perfeitos de todos eram os manuscritos que ela escrevia enquanto estava dormindo… E havia também uma nítida mudança de personalidade, ou antes, de peculiaridades pessoais, no modo de andar, expressão vocal, vivacidade de hábitos… com agudeza mental diferente, opiniões desiguais sobre coisas, domínio diferente da ortografia, de expressões e da gramática inglesa, e um domínio muito, muito diferente sobre o seu temperamento, que nos momentos mais joviais era quase angelical, e nos piores, o oposto".
O texto riquíssimo desta que é a obra mais densa do misticismo moderno, talvez o verdadeiro tratado de Misticismo como área de conhecimento, segundo seu depoimento, seria o produto da mente de três grandes mestres da Fraternidade Branca: Saint Germain, El Morya e Ku-Thu-Mi, líder e hierofante dos rosacruzes e da Ordem Rosacruz. Hierofante é a designação dos sacerdotes da alta hierarquia dos mistérios da Grécia e do Egito. De modo geral, é assim que são tratados os Mestres da Grande Fraternidade Branca, que está acima de todas as Ordens Esotéricas e que é, em última instância, o objetivo de todo iniciado ao tornar-se membro desta ou daquela escola de mistério.
Todos nós, maçons místicos, rosacruzes, teósofos, em nossas egrégoras, nos preparamos para pertencer a esta nobre Ordem, e tudo que queremos, tudo que sonhamos, é tornarmo-nos, não mestres, mas discípulos destes Mestres Ascensionados, como também são cognominados.
Blavatsky foi, digamos assim, a secretária destes três mestres, os quais lhe ditavam, telepaticamente, todos os dados que ela transformou em páginas e páginas ao longo de anos, e que se esforçou para corrigir sempre e revisar, na busca de maior fidelidade as imagens que recebera, até seu último dia de vida nesta existência.
Dessa forma é preciso ler a obra de Blavatsky com o discernimento de que estamos diante de um volume imenso de informações, que lembram uma divertida imagem que ouvi em um dos programas do Café Brasil, o podcast de Luciano Pires que comentei no texto anterior.
Dizia lá em um dos podcasts, acho que aquele cujo tema era a “Globalização”, que ao pesquisar alguma coisa na Internet, recebia um tal número de informações que se sentia como se estivesse “bebendo água em um hidrante”.
manuscrito de Blavatsky e Morya
Ler um livro de Blavatsky é “beber água no hidrante” do Misticismo, tal o volume de dados que os três mestres lhe passaram durante a execução da obra.
Isto explica a riqueza e também a dificuldade de ler esta obra imensa, se bem que se o leitor possuir uma boa formação na cultura filosófica religiosa hindu sairá com muitos corpos de vantagem neste desafio.
Chama atenção a deferência que a mesma tem pelos rosacruzes, não no seu aspecto formal, mas como movimento transnacional, composto de muitas mentes ao longo dos séculos. Ela nos chama, a nós rosacruzes, de filósofos do fogo, aqueles que foram capazes de perceber a distinção entre a essência da criação e sua manifestação externa.
Além disso, por Ordem de Morya, como mostra o manuscrito acima, ela recebe a incumbência de formar uma escola que tenha por modelo a Rosacruz, para dar andamento aos estudos do misticismo.
Isto mostra a importância e a pertinência que o trabalho rosacruz tem no mundo místico, invadido vez por outra por oportunistas de toda espécie, mas que também é território de intelectuais e pesquisadores da maior importância como é o caso de HPB.
Uma última consideração. Quem leu deve achar estranho o comentário da citação de HPB acerca dos "filosofia dos últimos Rosacruzes".
Estávamos, na época, em período de recolhimento.
Syr Hyeronimus cuidava de preservar nossa herança na Europa e a transição para o século vinte, com o trabalho de Harvey Spencer Lewis, ainda não começara. O estranho é que tendo o contato que tinha com os mestres, Blavatsky desconhecia que os rosacruzes ainda estavam ativos, discretos, porém aptos a
reerguer a estrutura externa da Ordem assim que o momento propício chegasse. Como chegou.
Pra terminar este comentário quem quiser ter o texto deste primeiro volume, digitalizado, em seu computador para agilizar a pesquissa, baixe no endereço
Shânkara (c. 788– 820) foi um metafísico e monge errante indiano. Foi o principal formulador doutrinal do Advaita Vedânta, ou Vedânta não-dualista. Segundo a tradição, foi uma das almas mais excelsas que já encarnaram neste planeta, chegando a ser considerado uma encarnação de Shiva Sua vida encontra-se envolta em mistérios, prodígios e lendas que a tornam semelhante à de outros insignes mestres espirituais da humanidade, como Jesus e Maomé. Outras grafias do seu nome são: Sankaracharya, Sancaracarya, Shankaracharya, Sankara, Adi Sankara, Adi Shankaracharya ou Adi Shankara, também chamado de Bhagavatpada Acharya (que significa "o Mestre aos pés do Senhor"). Escreveu profundos comentários sobre os Upanishades, o Bhagavad-Gita e outros livros da sabedoria hindu.