por Mario Sales, FRC.:, S.:I.:;M.:M.:
“Só a arrogância humana faz com se suponha que a humanidade é a raça mais avançada do planeta”, nas palavras do senhor Spock, o imortal personagem de Leonard Nimoy, no consagrado seriado “Jornada nas Estrelas”. Penso nisto enquanto minhas filhas reclamam, enciumadas, da atenção excessiva que minha esposa dá a nossa cadela de estimação, Nina, uma Cocker Spaniel.
Na verdade o contato carinhoso e harmônico com outras espécies nos humaniza, por mais paradoxal que isto possa parecer. É comum dizer que devíamos cuidar mais dos nossos antes de cuidar de animais, com o carinho e dispêndio de recursos materiais que atualmente se gasta com animais de estimação.
Em hipótese alguma, no entanto, esta prática tem uma característica nefasta. Os animais, puro instinto e sentimento, são expressões de vida muito mais em sintonia com a vontade de Deus do que os vaidosos e fantasiosamente autônomos seres humanos. A convivência amorosa com cães, cavalos e golfinhos é didática para todos nós e nos ensina o relacionamento sem a linguagem, o contato do coração. Neste encontro entre espécies que não comungam a mesma linguagem e os mesmos símbolos, a comunicação se concentra em gestos, atitudes, tons de voz e não no que a voz diz. Ou seja, conversamos através da via cardíaca.
Quando fazemos isto aprendemos a confiança, a lealdade, o afeto desinteressado. Acalmamos nosso espírito com as demonstrações de afeição simples e efusivas de nossos animais e cultivamos bons sentimentos.
Por outro lado, isto eleva nossa espiritualidade, melhorando nossa sensibilidade ao outro. Os seres humanos são dos mais diferentes níveis e estão nos mais diferentes níveis espirituais. Alguns são naturalmente altruístas, têm um senso de pertencimento a sua raça, mesmo com suas diferentes compreensões e seus variados comportamentos. Outros, exatamente por esta variedade de seres humanos, sentem-se inseguros e desconfortáveis dentro da própria sociedade, como seu próprio meio biológico lhe seja hostil, o que denuncia uma psicopatia em gestação ou um quadro de agorafobia, o medo das multidões. O contato dos animais domésticos pode sim reverter esta situação, ensinando primeiro aquele indivíduo a arte do relacionar-se, educando-o sem palavras a perceber o outro, a olhar para fora, a preocupar-se com outros além se si mesmo, abandonando o narcisismo perigoso e pouco produtivo.
Quem se sente hostilizado, hostiliza. Quem se sente agredido, agride. Só que quando este indivíduo inseguro, hostil, entra em contato com o amor de outras espécies e se acaba conhecendo a experiência do amor, não apenas verdadeiro, mas intenso e incondicional, a qualidade espiritual deste indivíduo melhora e temos aí um avanço em sua condição humana.
O fato de não cuidar de sua própria raça tem mais a ver com incompetência emocional do que com falta de sensibilidade emocional. E o animal pode , com sua lealdade exemplar, educar o suposto dono, dando-lhe uma estrutura sentimental e emocional mais robusta, graças a anos de convivência e demonstrações de carinho. Quanto aos outros animais, realmente poderíamos buscar uma harmonia maior e mais significativa. Nosso comportamento em todos estes séculos tem sido, no mínimo, desastroso. Muitas espécies destruídas, o equilíbrio ecológico abalado e outras façanhas das quais nenhum de nós se orgulha. Não somos necessariamente os mais avançados, nem os mais poderosos, mas com certeza uma das espécies mais devastadoras. Quanto a nossa inteligência, decantada em prosa e verso,( por que o homem, como Narciso, queda-se fascinado por si mesmo em seus textos e obras de arte), talvez devesse explicar os três lóbulos cerebrais dos golfinhos, os complexos mecanismos de radar dos morcegos, a melhor audição dos cães e a melhor visão das águias. Ao olhar a organização social de formigas e abelhas nossa sociedade, às vezes, parece primitiva. E quanto a nossa propalada força, fica abalada nas batalhas que perdemos e que continuamos perdendo, hoje com menos baixas, para os nossos piores inimigos e que vivem em nós em sua maioria: os microorganismos. Sim, criamos os antibióticos e as vacinas, mas eles ainda estão aí, adaptando-se, mudando sua estrutura de forma a contornar nossas defesas, a ponto de ameaçar a nossa existência.
Não, de forma alguma somos tão poderosos como gostamos de achar. Melhor vivermos em harmonia com nossos companheiros de planeta do que em confronto.
Eles podem nos ensinar e ajudar muito mais do que pensamos, assim como nossa cadela, Nina, nos ensina com sua alegria e seu carinho as possibilidades do amor sem exigências.
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