Multi pertransibunt et augebitur scientia (Muitos passarão, e o conhecimento aumentará).

domingo, 28 de novembro de 2010

A ESPIRITUALIDADE IMPLÍCITA NO ATEÍSMO ESCLARECIDO

14 de novembro de 2010

“A Vida e a Terra são uma só. Disso nunca devemos nos esquecer.”


“Querer aprender sempre mais reflete a nossa curiosidade. Acreditar poder saber tudo reflete apenas uma ilusão.”


“Parafraseando Einstein (que parafraseava Kant), teoria sem experimentos é cega, e experimentos sem teoria são aleijados.”


“A ciência que criamos é apenas isso, nossa criação. Mesmo que maravilhosa, será sempre limitada pelo que podemos conhecer do mundo. E como nunca poderemos conhecer tudo que existe, nossa ciência será sempre incompleta”



Estas frases acima, colhidas do livro de Marcelo Gleiser, “Criação Imperfeita” (Ed.Record, 1ª edição,2010) são de um tal primor filosófico que chama atenção deste místico.



Longe de mim atribuir-lhe um sentido que no original não trazia, mas as ilações que resultam desta apresentação franca e humilde do conhecimento intelectual e científico expressam bem a postura que eu gostaria presente nos frateres e sórores da Ordem Rosacruz.


Primeiro a humildade diante das limitações operacionais do intelecto. Os cientistas são vistos de modo estereotipado como arrogantes e intolerantes com tudo aquilo que não seja cientificamente fundamentado. O texto de Marcelo mostra que os cientistas podem ser de tipos os mais variados, já que arrogância, intolerância e vaidade são idiossincrasias ligadas a traços de caráter e não a profissão do indivíduo em si.


Muitas vezes conheci arrogância, intolerância e vaidade entre espiritualistas, homens que se diziam envolvidos com o sagrado.


Segundo, o senso de pertencimento a raça humana, independente de quaisquer sub-características que a diferenciem.


Terceiro, em função disto, o senso de respeito ao fenômeno humano no seu conjunto, a Vida, várias vezes no livro, referida como rara e surgida em condições muito peculiares, independente da aparente hostilidade das circunstâncias, mas produto de uma combinação feliz e delicada. Em moral isto se chama altruísmo, a importância do outro, não no sentido de manifestação de bondade especial, mas pelo reconhecimento da interconexão social entre todos os habitantes deste planeta.


Portanto, este elegante ensaio mostra que podemos chegar às mesmas conclusões ( a importância da Vida, o respeito ao meio ambiente e a todos os seus habitantes, a busca por um conhecimento sólido e livre de preconceitos, a busca por um pensamento sensato, ciente de suas limitações atuais e futuras, como instrumento par conhecer a Verdade)através de caminhos absolutamente diversos e, às vezes, considerados opostos e antagônicos.


Místicos são pessoas ligadas ao invisível, à trabalhar valores intangíveis e difíceis de demonstrar, mas que são possíveis de sentir, de perceber através do aparelho mais elaborado já construído: o corpo humano.


Cientistas precisam de demonstrações ou cálculos matemáticos que demonstrem a realidade das coisas que postulam e que após as demonstrações que os comprovam, tornam-se axiomas. A sensibilidade pode ser um problema dentro desta visão, já que a subjetividade pode impedir a clareza das conclusões.


O tempo e o trabalho científico mostrou que sim, realmente o observador influencia o observado, que o experimentador modifica apenas com a sua presença o rumo da experiência, pelo menos em física quântica, mas também em antropologia, na psiquiatria pré psicofármacos, ou em uma área de saber não considerada científica, mas que alcançou grande prestígio intelectual ao longo do século XX: a psicologia.


Ciência e Misticismo são áreas que caminharam separadas desde o advento do positivismo de Auguste Conte, mas é bom lembrarmos, sempre, que os pais do pensamento cético metodológico, do cálculo infinitesimal que fundamenta muitos dos trabalhos científicos modernos e da metodologia científica eram membros de Ordens Esotéricas Místicas, e , para meu orgulho , Roacruzes.


Eu me refiro a Francis Bacon, Renée Descartes, Leibnitz e sir Isac Newton. Eram homens extremamente racionais , avessos à superstições, mas absolutamente comprometidos com o trabalho de melhorar a humanidade e preservar a tradição esotérica que talvez não seja outra coisa senão a ciência de uma outra época, hoje esquecida em meio a cataclismos geológicos e rupturas da linha histórica da sociedade.


Provavelmente entre cientistas e entre místicos, existam pessoas conectadas com a mensagem desses quatro homens citados, que não viram barreiras entre o uso de suas sensibilidades (Descartes sempre citava a importância dos sonhos em suas elaborações filosóficas) e o trabalho racional e fundamentado.


Não há conflitos entre místicos e cientistas, mas entre seres humanos diferenciados, estejam aonde estiverem, representando na sociedade o papel que representarem, e outros seres, medíocres espiritualmente, em todos os sentidos que a palavra espírito possa representar.


Marcelo Gleiser é um desses espíritos diferenciados.


Sua mente clara e sua sensibilidade inspiram o que há de mais fantástico na espécie humana: seu amor ao conhecimento, sua curiosidade, e sua capacidade de querer entender seu papel neste Universo imenso que o cerca, aparentemente em estado de profunda solidão.


Neste sentido, místicos e cientistas são parecidos: ambos estão em busca de sentido para suas existências, e de consciência, já que nas palavras de um antigo pensador alemão Husserl, a “consciência é doadora de sentido”.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

CONFISSÃO

Entre o que sinto e o que traço,
o que penso ser e o que pareço,

sou o aflito que disfarço.
Minha vida foi perdida. Padeço
da covardia, atávica e mórbida,
dos que amoldam-se ao contexto.
Minha alma foi fraudada. Ardo
de anseios postergados. Tardo
em dar cabo aos meus medos.

Fred Matos, "Eu, Meu Outro", Ed.Poesia Diária, 1999
blog: http://eumeuoutro.blogspot.com/p/eu-meu-outro.html

Faço minhas as suas palavras, poeta.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Publico Hoje no Blog, em uma página separada, fotos do Lançamento ontem do livro "A Via Sacra", com textos do padre  Dalton  e desenhos de Fernando Luiz, meu irmão espiritual, de Campos dos Goytacazes. O livro será vendido em todas as igrejas católicas e é uma boa pedida para o natal. A beleza dos desenhos fala por si.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

COMO COMPATIBILIZAR SISTEMA E ORDEM COM A MAIS COMPLETA LIBERDADE NA MAIS PERFEITA TOLERÂNCIA , 2

por Mario Sales FRC.:,S.:I.:,M.:M.:



“Para que este grupo diferenciado de servidores se mantenha atento à disciplina da instituição a que servem desinteressadamente, necessitam, no mínimo, de carinho e atenção, de se sentirem parte de um projeto, valorizados pelo seu serviço desinteressado.Em uma palavra: simpatia.
Não se dirige uma empresa com simpatia; mas, para liderar dentro de uma empresa ou de uma ordem esotérica é preciso carisma, capacidade de envolver seus empregados ou seguidores com uma personalidade magnética, que valorize aqueles que estão ao seu redor, e faça, de maneira sincera, com que se sintam satisfeitos em fazer o que fazem. E teoricamente, ninguém está mais preparado para fazer isto do que um rosacruz.
Servir desinteressadamente já é uma recompensa em si para aqueles que servem com dedicação a uma instituição na qual crêem, mas não é de bom tom se esquecer de valorizar estes dedicados servidores vez por outra.É isto que os alimenta. Este é o seu salário, seu pagamento.”


In “Como compatibilizar sistema e ordem com a mais completa liberdade na mais perfeita tolerância”, 1.




A AMORC está em franca reestruturação administrativa.
Seu interesse é o de qualquer grande organização: otimizar custos e protocolar condutas e práticas de gerenciamento, bem como estabelecer uma paridade com os padrões internacionais da Rosacruz.
Somos, nós da língua portuguesa, ao que me parece, a maior comunidade mundial da AMORC.
Uma reformulação desta grandeza terá efeitos em toda a instituição.
E isto melhorará nosso desempenho? Nossos frateres e sorores se tornarão mais satisfeitos com sua afiliação?
Ordens esotéricas como a nossa ainda possuem algum apelo à maioria das pessoas de nossa época?
Sim, e não, ao mesmo tempo.
Sempre existirão pessoas interessadas na visão mística, em se juntarem a algum grupo tradicional para estudarem as tradições esotéricas, e isto pelas mais variadas razões.
Poucos provavelmente procurarão a afiliação por motivos sólidos, perenes.
Que eu saiba de 1000 pessoas que chegam aos portais da Ordem, 1 apenas chega ao grau de Artesão, acima do 9º grau de templo.
Daqueles que chegam a este grau, ainda existem alguns poucos que abandonam a Ordem por motivos pessoais.
Aonde este frater ou esta soror falhou na sua integração ao espírito da Egrégora? Que tipo de amálgama psicológico lhe faltou para que sua vida e a vida da AMORC se tornassem apenas uma vida?
Não tenho dúvidas que foi o contato humano.
Embora eu diga isso, é importante lembrar que o jeito como o trabalho na AMORC foi construído não pressupunha, necessariamente, o contato físico. Nossa estrutura didática, já de quase um século, caracterizava-se e caracteriza-se pelo estudo por correspondência.
Todo o trabalho rosacruz na AMORC foi planejado para se tornar um estudo no lar, na privacidade de nossas casas, no silêncio de nossos santuários particulares.
Quis a vontade natural de compartilhar da natureza humana que construíssemos corpos afiliados em diversas cidades do mundo, em vários países, para que pudéssemos confraternizar com mentes afins com as nossas. E então surgiram os problemas naturais do relacionamento.
Seres humanos são, por características próprias da espécie, difíceis de conquistar e instáveis emocionalmente. mesmo assim, os rosacruzes de todo o mundo conseguiram construir uma forte egrégora.
Os freqüentadores de lojas, capítulos e pronaoi da AMORC são pessoas comuns, dos mais diversos níveis sócio-econômicos e culturais, unidos apenas pelo ideal de Convivência Fraterna e Busca do Conhecimento.
E esta sede de conhecimento do rosacruz é insaciável. Sua sede de sabedoria é infinita. Na sua maioria, os rosacruzes elegem as suas Grandes Lojas de cada Jurisdição como focos alimentadores deste material fundamental a vida rosacruciana, que são o estudo e a informação, e em função disso, esperam, como em qualquer curso por correspondência, ter com quem se corresponder.
Desta maneira é importante que nenhum estudante rosacruz fique ou precise ficar sem uma resposta para uma questão qualquer que levante, por carta ou por email, mais do que uma semana. Isto enfraqueceria pouco a pouco a sua afiliação. Esta é uma grave falha para quem sabe da importância do membro de sanctum.
Toda vez que eu tenho uma dúvida, como estudante, gostaria de ter aonde buscar respostas, e se possível, orientação personalizada. Lembro-me que Frater Lewis também pensava assim e nas monografias que estudei ele freqüentemente usava a expressão: “Gostaria que enquanto lê esta monografia, você estudante se sentisse como se estivesse aqui em San Jose, na Califórnia, conversando pessoalmente comigo”.
Ele sabia da importância do toque pessoal para cativar seus estudantes, para criar um vínculo afetivo com aqueles que faziam parte do que ele chamava a família rosacruz.
Será possível em nossa época de velocidade e ânsia por resultados imediatistas, conseguir criar um vínculo semelhante?
Gostaria de expressar a minha opinião, como Artesão da AMORC, preocupado com sua expansão e consolidação institucional: é bom que seja.
Ou seja, em minha humilde opinião, se é que alguém possa se interessar, o que conseguirá aumentar a fidelização de nossos novos neófitos e reduzir esta relação de 1000/1 em relação a permanência na Ordem é o vínculo que possamos como administradores desta organização estabelecer com nossos estudantes. Todos aqueles que se tornam rosacruzes buscam alguma coisa de mais profundo em suas vidas.
E este algo mais profundo chama-se em Antropologia e Psicologia, Pertencimento. Tal expressão pode ser traduzida pela sensação de fazer parte de um grupo ou de um nicho definido na sociedade aonde se possa expressar em conjunto sentimentos semelhantes acerca de valores éticos, espirituais e intelectuais.
Todos queremos ter ou conseguir a sensação de Pertencimento, mas tal coisa não se consegue, se constrói.
Depende de esforço pessoal e de reforço positivo para que nossa determinação, quando não for muito sólida, tenha tempo de se estruturar.
Pode-se dizer que o esforço educacional da Ordem necessita atentar para a fortificação da sensação de pertencimento.
E como pode-se fazer tal coisa: como em qualquer curso por correspondência, correspondendo-se com quem busca se corresponder.
Corresponder é dividir respostas, etimologicamente, é dialogar. Eu mel lembro que a Grande Loja jamais permitiu que uma carta enviada, uma opinião expressada por algum de seus estudantes ficasse sem resposta. Naquela época, o interesse era educacional, mas sem saber, construía-se uma estrutura sólida de vinculação com o membro que o fidelizava à Instituição. Lembro-me do orgulho e encantamento com que os frateres me contavam ainda no Rio de Janeiro sobre as respostas que haviam recebido da Grande Loja sobre questões que haviam levantado acerca desta do daquela monografia, deste ou daquele ritual, desta ou daquela prática mística.
A minha impressão é que, pelo aumento gigantesco do volume de comunicação através da facilitação do acesso de meios eletrônicos, esta conversação que seguia um ritmo razoável acelerou e hoje, os emails, os livros e textos que chegam às mãos de todas as grandes lojas tornaram-se quase improcessáveis, tamanha a quantidade e o número reduzido de oficiais envolvidos na sua avaliação.
Isto no entanto, não justifica que, este procedimento de resposta, de reforço positivo ao senso de Pertencimento, possa de alguma forma ser menosprezado.
Precisamos urgentemente fazer com que o mais simples de nossos membros, daqui até Moçambique, possa sentir-se membro da AMORC através de respostas personalizadas às suas formulações, às suas dúvidas.
Mais do que a propaganda institucional, mais do que correspondências padronizadas e iguais, este contato com o membro através da discussão interessada de suas idéias garantiria sua fidelidade a Ordem e com certeza o aumento do número de membros da Organização em todo o Mundo.
Uma vez que , como já vimos, seria impossível que o grande Mestre e dois ou três oficiais de sua confiança realizassem este gigantesco trabalho, minha sugestão é a criação de um conselho virtual escolhido pelo Grande Mestre, em contato on line permanente entre si e com a Grande Loja, que, na tranqüilidade de seu lar pudesse fazer este trabalho precioso de dar atenção a cada membro que procura, através de carta ou email o aconselhamento da Grande Loja.
Vejo a preocupação em estabelecer uma administração racional, com protocolos comuns a todos, de forma organizacional moderna e eficiente.
Administrar uma ordem esotérica, no entanto, não é uma atividade racional, mas também racional.
Essencialmente, administrar uma Ordem Esotérica é uma combinação, como na Medicina, de Ciência e Arte.
Como em um jardim, que precisa de um trabalho tanto de Ciência no Geral quanto de Arte, no particular.
Não se tem um belo jardim sem se cultivar cada uma das rosas deste jardim com amor e cuidado. O conjunto harmonioso resulta apenas da combinação da formosura de cada rosa em particular, sendo cada uma tão importante quanto a outra e, embora heterogêneas, na sua heterogeneidade mostram a maravilha da complexidade da criação.
Portanto o Jardim da Rosacruz precisa ser cultivado rosa a rosa, individualmente, e como ele é imenso, muitos jardineiros devem ser convocados para este trabalho, entre os melhores jardineiros de nosso plantel.
Se apenas dois ou três jardineiros estiverem responsáveis por tamanha obra, o resultado será um trabalho desigual, cheio de lacunas, com áreas bem preservadas e outras abandonadas.
Os Membros deste Conselho de Nobres Jardineiros não serão necessariamente bons administradores.
Deverão ser Mestres sim, mas no conhecimento esotérico, cuja reputação seja confirmada por uma reputação mística ilibada.
Todas as áreas da Ordem possuem pessoas assim. Devemos convocá-las a servir.
Se não estou enganado, os nossos dignos dirigentes serão surpreendidos pela maneira entusiasmada como tal solicitação será recebida.
Com poucas rosas para cada um, todos poderão fazer um trabalho mais bem acabado. E o Jardim dos Rosacruzes voltará a florir, belo e pujante.
Esta é a Intuição que me vem a mente. Espero que encontre eco entre aqueles que tomam as decisões.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

QUASE NADA, QUASE TUDO

Por Mario Sales



Quase nada
Quase tudo


Sentimento
mudo
narrado
riso
lamento
Disfarçado
Calado
Na cama,
Na Casa,
No quarto


Quase nada
Quase tudo
ar
amor
voz
cor
grande
miúdo
Quase tudo
Quase nada
som
silêncio
o número
A tabuada
Quase tudo
Quase nada


Uma porta aberta
Outra fechada
Vassouras
Quintais
Pianos,
Corais.


Quase tudo
Quase nada
Luz do sol
Planta
Brisa leve
Criança
Olhar
Uma palavra
Quase tudo
Quase nada



31.3.2001 , Boracéia 2 , São Sebastião
Revisado em 8 de novembro de 2010



quinta-feira, 4 de novembro de 2010

DEDOS E CHAGAS

Por Mario Sales, FRC.:,S.:I.:,M.:M.:

Tenho defendido neste espaço uma visão antiobscurantista na atitude de todos os membros de nossa escola esotérica, a AMORC.
Na prática, na maioria das monografias da AMORC, encontramos o mesmo tipo de esforço, em busca de uma atitude mais avançada quanto a existência.
É preciso reconhecer que parte importante desta atitude avançada tem a ver com respeito à diferença, habilidade de conviver com o contraditório. Isto é maturidade psicológica, a base da compreensão, que como já demonstrei, torna desnecessária a tolerância, pois quem compreende não precisa tolerar.
Caminhamos, reconheço, sobre a lâmina de uma navalha.
Os assuntos que os esoteristas rosacruzes abordam via de regra, são assuntos que aos olhos de um Carl Sagan, pareceriam puro delírio.
Nós, místicos rosacruzes sabemos que não é assim, que nossos assuntos são profundamente fundamentados experimentalmente, que nosso trabalho é de uma natureza altamente positivista já que dentro de nosso ambiente passamos uma mensagem de verificação, de experimentação e constatação dos fatos, não de crença. Mas os temas que nós esoteristas trabalhamos são temas relegados ao limbo por grande parte dos membros da comunidade científica, já que mexem com convicções bíblicas acerca da realidade.
E eu poderia testemunhar que, em parte, muitos narizes torcidos de alguns cientistas para assuntos esotéricos o são apenas por conveniência e estratégia política profissional. Já que práticas esotéricas ou místicas são vistas oficialmente pela ciência como apenas superstições inaceitáveis a mentes esclarecidas, não ficaria bem que fosse levado a público a afiliação de um pensador ou cientista conhecido a uma escola esotérica, por mais digna que ela fosse.
Portanto, muitos cientistas que são membros da AMORC preferem manter suas afiliações absolutamente em sigilo exatamente para evitar o descrédito entre seus pares ou a perda de linhas de financiamento que dependem de uma reputação científica ilibada.
Seria romântico e ingênuo dizer-lhes que não fizessem isso. O risco para suas carreiras, às vezes, mesmo em tempos de liberdade de pensamento, é real.
Por isso, quando vejo os rosacruzes sérios falarem em “diálogo com o meio científico”, interdisciplinaridade, talvez com esta palavra tentando representar o encontro entre o caminho místico e o caminho da ciência ortodoxa, reconheço uma intenção louvável, mas desprovida de qualquer chance de sucesso, se não partir de bases adequadas.
Gostaria de descrever as razões de minha opinião e de meu ceticismo.
Primeiro, cientistas não crêem em postulados que sejam indemonstráveis ou elaborados sem lógica interna. Quaisquer premissas que sejam levantadas por um cientista tem que ter alguma plausibilidade, alguma coerência lógica interna com fatos conhecidos, ou ser baseada em fatos experimentais demonstráveis e, principalmente, reprodutíveis.
Segundo: se um místico quiser conversar com um cientista ortodoxo, tem que se preparar para um encontro como o que ocorreu entre o Mestre Jesus e o apóstolo Tomé, tão criticado ao longo dos séculos por suas dúvidas, mas tão didático no comportamento verificacional.
E, embora a Igreja tenha tentado desmoralizar a atitude de Tomé, que alegou precisar colocar o dedo nas chagas do Cristo para poder crer em sua ressurreição, é importante prestar atenção na atitude do Mestre que, embora dizendo abençoados aqueles que creram sem ver, nem por isso negou o desejo ao seu apóstolo e, de fato, chamou-o a verificar seus ferimentos, certo de que satisfazê-lo aplacaria sua dúvida, e fortaleceria suas convicções na causa cristã.
Relata-se que o apóstolo Tomé serviu dignamente a esta causa anos e anos após a Ascensão de Jesus, de forma que sua atitude em nada prejudicou sua lealdade ou sua sinceridade de Apóstolo.
Além disso, o Cristo não se negou a dar a Tomé uma ponte entre sua capacidade de compreensão, e uma outra, em que a verificação não seria necessária, permitindo que ele realizasse seu desejo: tocar suas chagas.

Já no caso dos rosacruzes, não vejo em alguns, senão em muitos, nenhuma disposição de permitir que os Tomés modernos toquem em suas “chagas”, partindo-se do princípio de que possuam “chagas” reais a serem tocadas.
Com um certo ar de arrogância, vejo em Lojas e Capítulos da Ordem certos frateres e sorores que se comportam de modo intolerante com a descrença que uma pessoa, que não compactue de suas crenças, possa ter em relação a elas.
Não há nestes frateres e nessas sorores disposição de iniciar esses profanos em algumas das habilidades que os rosacruzes dizem possuir.
E isto me preocupa.
Sem fatos objetivos para oferecer a comunidade científica, sem chagas para serem tocadas pelos dedos curiosos da ciência, este diálogo está condenado ao fracasso. E se, além disto, nos sentirmos ofendidos pelo pedido , pior ainda.
Pode-se falar o que for do método científico, mas decerto ele não é arrogante.
Por definição, fazer ciência é duvidar, sistematicamente, de tudo aquilo que vemos e experimentamos, e com isso, nos obrigamos a testar nossas crenças, e fazer avançar nosso conhecimento em bases sólidas.
Por outro lado, contemplo com tristeza a aparente certeza de certos frateres que demonstram uma convicção tão sólida de seus ensinamentos que se sentem incomodados por questões tipo: será que funciona mesmo?
A resposta de um rosacruz sério a esta colocação é: vamos ver, eu lhe mostro a técnica, você experimenta com um problema pessoal e depois me diz se funciona ou não.
E , ao contrário, a resposta errada seria:
“Como você é capaz de me fazer uma pergunta dessas? Vê-se logo que você não passa de um profano, um não iniciado.”
Quem ouvir a resposta acima, julgará que quem a dá, digamos com ironia, é um ás nos efeitos paranormais, como são chamados, capaz de projeções astrais ao seu bel prazer, e de fornecer informações precisas de acontecimentos que presenciou , quando em projeção, em outros países, através de seu “raro poder mental”, fatos estes perfeitamente verificáveis via internet ou telefone, de forma a provar sem dúvida, a sua habilidade aos descrentes, iniciados ou não.
Provavelmente, este indivíduo tem também, supõe-se, uma capacidade tão acurada de ver a aura humana que pode se for da área de saúde, fazer diagnósticos de doenças com meses de antecedência, sem necessidade de exames complementares ou de manifestação de quaisquer sintomas.
Seus mantras causam cura imediata de condições patológicas em quem sofre de alguma moléstia e seu toque retira de forma milagrosa a dor de quem a tenha.
Cá entre nós, nada disso deve ser verdade.
E provavelmente, pela arrogância deste indivíduo, deve ser exatamente o contrário disso que eu acabei de descrever.
Muitos estudantes rosacruzes sinceros, que estudaram suas monografias com zelo, são capazes de algumas pequenas habilidades místicas que, com certeza valorizam muito, mas nada de excepcional. Sua filiação a Ordem e sua fidelidade aos seus princípios baseia-se na identificação que sente com seus valores, e não necessariamente em resultados experimentais. Sim, claro, terá histórias para contar, coisas que, para ele, demonstraram de forma satisfatória a veracidade das afirmações da Ordem, acerca deste ou daquele talento místico.
Exaltará sua felicidade em ser membro da AMORC, mas com certeza em função de sua satisfação psicológica, e não apenas por causa da demonstração prática dos princípios rosacruzes.
E isto, a meu ver, do ponto de vista didático, é bom, mas não suficiente.
Se quisermos conversar com os Tomés da área científica, temos que ter alguma “Chaga” em nossas mãos e ventre para que eles possam tocar com seus dedos e devemos permitir isto de modo feliz e tranqüilo, como o Mestre Jesus permitiu, por que sabemos que nossas chagas são reais e não produto de crenças e superstições.
Devemos ser capazes de oferecer fatos e não discursos, por mais belos e bem intencionados eles sejam.
E eu pergunto: se pegarmos um membro de nossa Ordem, aleatoriamente, para dialogar com um membro da ciência, ficaríamos tranqüilos quanto ao fato de que ele, com certeza, teria algo palpável para mostrar a este cético?
E isto no quesito fato demonstrável. Imagino que muitos discordariam de mim e diriam que isto é positivismo demais para um místico, e que nosso maior tesouro é invisível para os olhos, como diria Antoine de Saint Exupery, e que, a coisa mais bela da afiliação rosacruz é a felicidade de nossos membros simplesmente porque segue as orientações das monografias.
Seja.
Pergunto, de Artesão para outro Artesão: se um cético, não iniciado, conversasse com um frater dos graus de templo intermediário, encontraria necessariamente um homem ou mulher muito mais feliz do que ele, sem doenças, sem medos, sem angústias maiores que as daquele, que é cético, em face da existência?
Pelo que vejo de queixas de doenças e problemas pessoais em minhas andanças por corpos afiliados e cursos na Ordem, não tenho muita certeza.
A meu ver precisamos de mais humildade e de mais estudo de nossas monografias.
Não tenho nenhuma dúvida quanto ao valor inestimável do ensinamento rosacruz, mas devemos ser tolerantes com as dúvidas daqueles que não fazem parte de nosso círculo e , além disto, se quisermos conversar com membros da elite científica do mundo, devemos ir com algo em nossas mãos, mesmo que sejam nossas chagas, para que se possa iniciar uma troca de idéias produtiva e possamos fazer desta conversação fundamentada em fatos, uma iniciação daqueles membros da comunidade científica aos nossos valores e técnicas. Não revelando todos os nossos segredos, mas até permitindo que eles possam ver um ou outro funcionando, para que sua curiosidade seja aguçada.
Talvez descubramos que a obstinação dos cientistas não iniciados pode ser muito útil em nossas fileiras, hoje, em certos casos, adormecidas por uma mentalidade dogmática e às vezes, para minha tristeza, dominada pela superstição.