Multi pertransibunt et augebitur scientia (Muitos passarão, e o conhecimento aumentará).

terça-feira, 29 de novembro de 2011

A MUSICA

Não existe nada mais internacional, mais planetário, mais profundo e mais poderoso que a música. Ela une os sensíveis, aqueles que ouvem seu chamado, e mistura a todos em uma sopa primordial de almas, a mesma sopa de onde todos nós saímos, da qual só nos lembramos em meio aos tons e melodias dos instrumentos. Nosso pequenino planeta tem um vigor artístico imenso, e sinto que na música podemos entender como somos todos o acorde resultante de diferentes notas, diferentes vozes.
Abaixo alguns exemplos:
Philip Glass, compositor erudito e contemporâneo; uma parceria entre Glass e Ravi Shankar, Shankar que foi amigo e professor de cítara de George Harrison. Mais abaixo uma exímia violonista clássica chinesa Li Jie, tocando Bach; que foi exaltado pela sensibilidade de Glenn Gould; mais abaixo, Nelson Freire, em concerto, tocando um trecho da ópera Orfeu e Eurídice de Gluck. 
Espero que desfrutem esta variada amostra internacional da sensibilidade musical de nossa espécie.

Philip Glass - Prophecies

Ravi Shankar & Philip Glass - Ragas In Minor Scale!

Ravi Shankar on the Dick Cavett Show

Bach - Cello Suite N° 1; I Praeludium Li Jie on a classic guitar

GLENN GOULD TOCA SARABANDA BWV 828 DE BACH

NELSON FREIRE E GUIOMAR NOVAES TOCAM GLUCK

sábado, 26 de novembro de 2011

NUMEROLOGIA ORTODOXA


por Mario Sales, FRC.:, S.:I.:;M.:M.:

Acabei de assistir dois especiais sobre Matemática, produzidos pelo melhor canal público do mundo, a BBC de Londres. Um sobre a história do número 1 e outro, com a história da própria matemática em si. Ambos ricos em detalhes, extremamente didáticos e, pelo menos para mim, trazendo novidades, como por exemplo, a origem indiana da noção de Zero e dos algarismos chamados “arábicos”; e finalmente, dando uma dimensão original da maneira como a matemática se desenvolveu nos países do extremo oriente, leia-se China, enquanto aparentemente tinha entrado em colapso no Ocidente, após a morte do último grande matemático grego, Arquimedes. Há um espaço inclusive para a análise do papel de Pitágoras neste drama histórico científico.
Destaque para a frase: “o mundo é como um queijo suíço, compostos de densidades (1) e buracos vazios (0), e ambos são necessários à composição do todo." Chamo a atenção também para a explicação da matemática binária de Leibiniz, a mais simples e didática que eu já vi.
Para a “História do número 1” o link de início é http://www.youtube.com/watch?v=aGuA62lr5qk
E para a história da Matemática , parte 1, o primeiro link é
e a parte 2 começa em:
Os dois especiais tem de 4 a 6 partes, sugiro o download para assistir depois por inteiro.

O OVO DA SERPENTE


por Mario Sales, FRC.:, S.:I.:;M.:M.:

“Las niñas”, de Velasquez

Sempre tive aversão ao esotérico, ao desconhecido. Acho que, em parte por isso, tornei-me um esoterista.
Como um quadro de Velásquez visto por Picasso, muitas vezes Esoterismo não é algo necessariamente profundo, mais alguma coisa de rara beleza tornada confusa por uma imagem propositalmente pouco clara e que, na maioria das vezes, conduz ao equívoco e ao erro.
Havia alguma razão para isso no passado.
Perseguições religiosas no tempo da inquisição, e, depois da Revolução Francesa, arbitrariedades políticas e a ignorância nos aparelhos de Estado, transformavam a todos os esoteristas em suspeitos e perigosos.


“Las niñas” de Picasso


Hoje isso não faz mais sentido.
O que os esoteristas fazem ou deixam de fazer, felizmente ou infelizmente, não interessa ao vulgo ou a população de modo geral, muito menos ao Estado.
Talvez por uma questão de auto estima infantil insistamos, fantasiosamente, em nos achar perseguidos e necessitados do mistério e do segredo, como se todos nós com o mínimo de discernimento já não soubéssemos que o segredo está dentro daquilo que é profundo e não no fato de escondermos um texto dos olhos dos não iniciados.
Picasso

De qualquer forma, se o segredo esotérico não faz mais sentido, o esoterismo de alguns símbolos do passado também não faz. Se eles nos fascinam, o fazem pela sua beleza e riqueza plástica, mas não por que tragam em si novidades aos iniciados mais experientes, os únicos que poderão lê-los. São símbolos que não ajudam, do ponto de vista educacional e iniciático, a percepção de verdades transcendentais ou de valores mais profundos da espiritualidade.
Muitas vêzes pode ser que, decodificados, se revelem apenas como a expressão de preconceitos religiosos de época, que precisam ser considerados em perspectiva histórica para que tenham significado em nossos dias.
Nem tudo que é antigo e esotérico é profundo e tem significado eterno.

Estamos em uma civilização cada vez mais globalizada onde as imagens esotéricas também estão muito mais diversificadas.
A Bíblia, grande fornecedora de imagens e símbolos para os artistas e esoteristas dos séculos XVII e XVIII, embora muitos fundamentalistas ocidentais não tenham se dado conta disso, já não é o único livro sagrado disponível fornecendo inspiração aos que a buscam, considerando que as imagens e os valores do Bhagavad Gita, do Corão Islâmico, ou mesmo as Sutras do Budismo e dos Vedas estão hoje disponíveis a um toque de mouse.
Outras imagens, outros imaginários esotéricos, outras compreensões do Sagrado.



Por isso é cansativo ver a intensidade com que muitos se lançam no esforço de tentar encaixar a Realidade sempre múltipla e dinâmica, nos arquétipos produzidos por um único livro. Por maior que tenha sido a contribuição do conjunto de livros que forma a tradição do povo judeu e embasa a prática cristã, seus esquemas já não satisfazem, nem são suficientes para abarcar todas as possibilidades. Aliás, não é um problema de um livro. Acontece com todos os livros.
Discussões estéreis como as descritas em O Nome da Rosa, de Umberto Eco, entre Beneditinos e Franciscanos, como “se pertenciam ou não ao Cristo as roupas que ele usava” não fazem mais nenhum sentido num mundo onde o drama da aniquilação da natureza e do risco de extinção de nossa própria espécie é a angústia maior.
Infelizmente muitos não se apercebem disso nas escolas esotéricas que continuam discutindo temas como A Queda de Adão, o Bem e o Mal, e a Astrologia, ou mesmo uma visão da Numerologia francamente supersticiosa como se tais temas pudessem melhorar a nossa compreensão dos problemas reais que nos afligem no nosso cotidiano.
A superstição sempre será filha da ignorância, e mesmo que vista roupas novas e vistosas seu odor pútrido continuará a denunciá-la por baixo de suas belas vestes.
Precisamos desesperadamente de um esoterismo e de um misticismo consonante com uma visão de mundo mais contemporânea, que contemple a espiritualidade e a dignidade humana mas também a inteligência e o bom senso, aspectos que podem ser colhidos no jardim da Filosofia e da Ciência ortodoxa e não em práticas ditas “alternativas”.
Pensar bem, construir uma cultura sólida, baseada em conhecimento fundamentado faz bem a qualquer espírito.
É a única maneira de nos vacinarmos contra os charlatães e as charlatanices disfarçadas de esoterismos que temos de engolir todos os dias.
Fora o fato de que a cultura diversifica nossa perspectiva do mundo, dando-nos uma visão pluricultural de nosso planeta e da humanidade que o habita, livres da interpretação unicista de um único livro, de um único tipo de pensamento.
A Ordem Rosacruz já foi uma escola de pensadores alternativa. Fez com que muitos em épocas difíceis de acesso à cultura tivessem o primeiro contato com o pensamento de Plotino, Platão ou Paracelso, graças a pequenos trechos de seus ensinamentos, as “concordâncias”, aparentemente menos importantes, mas que desencadeavam a curiosidade que levaria a uma leitura mais profunda de um tema antes desconhecido.

Comenius

Hoje isso ainda acontece, mas é insuficiente. Como Comenius, desejo que todo Rosacruz seja um rato de biblioteca e um Iluminista em uma época de seres superficiais, mas que leiam textos realmente fundamentais pois da mesma maneira que as publicações se multiplicam, aquelas de qualidade indiscutível continuam sendo em pequeno número. E este deve ser o objetivo de todo rosacruz, buscar a luz do conhecimento e fugir de toda mediocridade cultural, o verdadeiro demônio, as Trevas mais sombrias, que nos tornam velhos, acomodados e estúpidos.
Ouvimos sempre que a Luz Espiritual nada tem a ver com a Luz Intelectual, e acreditamos nisso, mas devemos reconhecer também que este pode ser o discurso da mediocridade, um canto de sereia, o discurso que nos enfraquece e nos faz crer que, da mesma forma, as Trevas Culturais podem nos levar mais depressa ao Mundo Espiritual.
Isto é falso, e precisa ser denunciado, várias e várias vêzes, a todo pulmão.
Escolas esotéricas não podem, repito, não podem ser o abrigo dos supersticiosos e dos tolos.


Tem que ser Escolas formadoras de líderes, guias para a sociedade, e isto por si só, fortalecerá sua própria Luz Coletiva de tal modo que, neste momento, seu farol será visto de muito longe no Oceano da Humanidade.
Nossa Luz coletiva depende da qualidade e da intensidade da Luz de cada um de nós membros destas escolas e por isso, por amor a nossas Ordens, não podemos compactuar com a superstição, a mediocridade ou com a cultura de um único livro, coisa que pode ser aceita dentro de um grupo religioso, mas nunca em uma Escola de Mistério.


Sem discutir estes aspectos falar sobre aumento de membros, melhoria do nível de nossas Lojas e Capítulos é perda de tempo.
O que muda o membro é a qualidade da educação que lhe fornecemos e quando permitimos que esta qualidade não seja de alto nível, tolerando o discurso da superstição disfarçado de estudo esotérico em nosso ambiente, estamos apenas chocando o Ovo da Serpente.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

OS NÚMEROS


por Mario Sales, FRC.:, S.:I.:;M.:M.:

Mais triste do que não ser um iniciado é ser um iniciado supersticioso.

Maçons, rosacruzes e martinistas por obrigação de seu refinamento espiritual, deveriam estar, todos, livres desta nódoa chamada superstição, que mancha nossos aventais e obscurece nossa razão, rebaixando indivíduos ditos esoteristas e ocultistas à condição de meros praticantes de algum tipo de Vudu.
No caso da Numerologia vemos este problema. Todas as tradições fazem referência a algum tipo de simbolismo baseado nos números, prática que começou, salvo engano, com os membros da escola Pitagórica e se difundiu em várias direções culturais.



Infelizmente, no início deste estudo, não é dado um indispensável aviso, que evitaria muitos e desnecessários equívocos.
E o aviso é este: assim como o homem não foi feito para o sábado, mas o sábado para o homem, assim também os números foram feitos para os homens, e não os homens para os números.
Dito isso, a partir de agora, a nenhum de nós é permitido achar que um 2 ou um 5 são mais importantes que a nossa capacidade de trabalho ou nosso cabedal intelectual, muito menos que nossa vida não dá certo por causa de um 7 ou de um 13 e não por causa de nossa própria incompetência.
Agora, livres das amarras da ignorância, continuemos.
Falemos do 1, do 2, do 3 e do 4.

O NÚMERO 1



Quando se fala em numerologia, todos supõem que quem discorre sobre o tema mostrará como usar os números para conseguir felicidade nos três objetivos mundanos dos publicitários: saúde, sexo e fortuna.
Como fomos prevenidos, de antemão, sobre a necessidade de uma abordagem equilibrada do assunto, fujamos desta perspectiva.
Pitágoras, muito provavelmente, quando recorreu aos números para representarem idéias, não via neles nenhum poder mágico. Apenas sabia, como todos nós sabemos, que eles são extraordinariamente fecundos como base simples para a prática da simbologia.
Antes dos números e depois deles, muitas tentativas de representar idéias por símbolos foram tentadas: quadros imensos com um enorme número de figuras e desenhos, sinais como setas, cruzes, círculos e, não satisfeitos com isto, pequenos textos enfiados entre estes outros, como a direcionar o interpretador no caminho correto.



Com os números, nada disso era necessário. Primeiro através de formas geométricas (pontos, traços, cones para o 1, barras em dupla para o 2, triângulos para o 3 e assim por diante) ; depois através de algarismos, um enorme avanço na representação das quantidades, com o império romano; e finalmente com os algarismos arábicos, que chegaram ao ocidente no século XIII, cada número em si será suficientemente capaz de encerrar uma enorme gama de possibilidades representativas.
Vejamos o caso do 1.
Desde os sumérios e os egípcios, a unidade foi usada para fins administrativos. O interesse no uso do número era a contagem de animais e a justiça no comércio e na distribuição de grãos. Não existiam algarismos, mas a idéia de unidade já havia surgido.
O simbolismo vem como consequência do trabalho de Pitágoras, que estabelece a relação entre números e valores filosóficos.

Pitágoras

Esqueçamos tudo isso e deixemos que nossa imaginação e intuição nos leve em suas asas.
O 1 é, essencialmente o símbolo da Unidade.
É dele, na sociedade humana, que se extrai o simbolismo necessário a coesão de religiosos, de exércitos, de reinos, de movimentos filosóficos. Buscamos a Unidade em nós, seres divididos por nossas próprias contradições internas.
Buscamos a Unidade no caos dos acontecimentos, na multiplicidade fenomênica, que segundo Kant só era reduzida a algo compreensível pela Mente, na transformação progressiva desta multiplicidade de sensações na unidade do conceito.
Vemos, portanto, a Unidade no Caos, e buscamos a Unidade em todas as coisas.
A Unidade é o ponto focal. Achamos todos que viemos dela e que retornaremos a ela, mas enquanto estamos em deslocamento ela não nos serve por que não tem manifestação, não gera conseqüências.
O Um por ser Um é imanifesto. Ele precisa de mais alguma coisa para manifestar-se.
Pressionado por este clamor do tornar-se, o Um, a Unidade, divide-se, internamente, e gera o surgimento do número 2.

O NÚMERO 2

Dois é oposição e ao mesmo tempo, complementariedade. Nele está encerrado o princípio da Dualidade, a essência do Homem e da criação, pois “o homem é dual em essência e trino em manifestação”.



Nesta mesma dualidade espelha-se a maneira como vemos o mundo e como o mundo nos vê. Bem e Mal, esquerda e direita, alto e baixo, guerra e paz, homem e mulher, certo e errado, sagrado e profano, tudo segue a lei da dualidade, base da manifestação na matéria, essência desta mesma manifestação.
Não é possível haver manifestação que não seja dual. Sempre que tivermos em mão um aspecto, devemos procurar seu complemento. Toda mão tem outra mão, todo ser tem outro ser que o continua e complementa.
Entender isto é aceitar a realidade como ela é, sem idealismos ou fantasias que nos trazem mais sofrimento do que qualquer coisa. Precisamos da compreensão binária. Ela nos traz a maturidade necessária para atravessar sem desgaste as oscilações naturais e inevitáveis das ondas da existência.
Toda a nossa vida não passa de uma oscilação binária.
Compreender aceitar esta verdade reduz imensamente o sofrimento.
Ainda não estamos plenamente satisfeitos, na Criação, se tivermos apenas dois pólos se relacionando.
A tensão gerada pelo gradiente de energia entre eles aumenta progressivamente até explodir na consecução mais gloriosa do Binário, o Três.

O NÚMERO TRÊS

Dual em essência, trino em manifestação.
Se a base da realidade são as duas colunas paralelas que geram tensão entre elas, o seu conflito criativo desencadeia a revolução do terceiro ponto, o ponto de criação, o terceiro lado do triângulo.
Deus, pai, espírito santo; sabedoria, força e beleza; Bhrama, Vishnu e Shiva; de muitas maneiras a trindade está representada na vida esotérica.


Também na vida mundana, entretanto, podemos encontrá-la: Pai, mãe e filho; nascimento, vida, morte; infância, maturidade, velhice; passado, presente, futuro.
O três marca nossa existência do início ao fim e demonstra a necessidade do 2 ao mesmo tempo que demonstra sua insuficiência. É a instabilidade do 2 que gera o 3, aonde ele é absorvido e desaparece, em silêncio.

No três não existem oposições em conflito, só a manifestação. Só que a realização sempre culmina em solidão. E o Três, o número do mestre, o número do manifesto, busca novamente o apoio da Unidade, que passeia ao longo da década auxiliando seus descendentes e os transformando.
E assim como o 1 arrancou de si mesmo o 2, transformou-o acrescentando-lhe seu próprio corpo, dando-lhe o caráter e a forma de três, da mesma maneira, percebendo a solidão do três , manifesto e solitário, com pouco equilíbrio, vai a este e acrescentando-lhe mais uma vez seu próprio corpo no madeiro entrecruzado, a Unidade transforma seu filho 3 na glória da estabilidade do 4.



O NÚMERO 4

O 4 tem várias possibilidades representativas. Esqueçam que ele é o número da Força, do Homem para Martinez de Pasqualy, ou da Realização.
Pensem geometricamente. Bases sólidas são quadrados. Antes do algarismo 4 representar a idéia do quatro, sua representação era uma forma geométrica, o quadrado.
E o quadrado é a base da pirâmide, símbolo da ascensão, da busca pelo alto. Vejam, não se pode construir uma pirâmide realmente sólida a não ser com uma base quadrada. Uma vida de sucesso apóia-se em bases sólidas. A pirâmide vai para o alto, representa nossa própria ascensão.

Muitas vêzes pensamos que nossa vida está estagnada, porém lembrando-nos do 4 , sentimo-nos mais pacientes e compreensivos. Nada é tão importante como construir em bases sólidas e a base quadrada está no solo, no princípio da obra, é plana, não tem oscilações. Plana, como às vêzes nossa existência parece estar, sem crescer, só se alargando para os lados.


Podemos estar apenas consolidando nossas bases.
O 4 então, poderá ser chamado de vários nomes, como por exemplo, aperfeiçoamento profissional, acumulação de informações intelectuais e técnicas, acúmulo de experiência. Lembremos de Karl Marx: só após o acúmulo quantitativo podemos ter um salto qualitativo.

Por isso, paciência. Estamos às vezes atravessando um quadrado de fundamentação, não estamos estagnados, nem estamos regredindo, nem deixamos de progredir.
Desenhar a nossa existência no plano, na horizontal, em um quadrado amplo e sólido, pode ser apenas a preparação da ascensão vertical vertiginosa, a contração para o salto, a base que solidifica e garante uma ascensão segura.

 Fiquemos por enquanto com estes 4 números, mas fiquemos atentos para não incorrer no erro do fatalismo infundado. Números são apenas símbolos de idéias, não amuletos religiosos.
Aqui, portanto, estão outras possibilidades para o uso da Numerologia, sem fazermos dela uma ridícula e descabida construção de mitos e fantasias, onde a razão é enterrada e só a superstição prospera.

sábado, 19 de novembro de 2011

A SOLIDÃO DE LEIBNIZ



por Mario Sales, FRC.:; S.:I.:; M.:M.:

Barão Gottfried Leibinz





Eu ando meio sensível.
Motivado pela citação de um conceito de Gottfried Leibniz, em um livro de Ralph Lewis, intitulado “O Olho da Mente”, editado na já clássica coleção da Editora Renes, resolvi estudar alguma coisa sobre a vida e a obra deste eminente filósofo. Curioso é que, embora sendo um dos mais ilustres membros de nossa fraternidade, de ter em seu currículo a elaboração simultânea a Newton, do Cálculo Infinitesimal, e de ter uma obra escrita tão vasta quanto desconhecida, de tal forma que a sua publicação completa consumirá esforços até 2020, segundo um editor europeu, não conheço, admito, quase nada sobre este importante pensador e matemático.
Sir Isaac Newton

Sei que elaborou uma teoria metafísica bastante complexa, que intitulou de Monadologia, onde postula a existência de partículas verdadeiramente indivisíveis na criação e em todas as coisas, as mônadas, elemento constituinte de plantas, pedras e quaisquer seres pluricelulares.
E além disso, sei de suas querelas com Descartes, irmão da rosacruz, mas adversário filosófico, e de sua crítica ao pensamento de John Locke, com um texto onde revê as teses de “Ensaios sobre o entendimento humano” deste último em um texto chamado “Novos ensaios sobre o entendimento humano", e que não chegou a publicar, de forma nobre, em decorrência da morte de Locke.

John Locke

Fora estas coisas superficiais e enciclopédicas, não sei mais nada. Procurando aqui na biblioteca, descobri que meu saudoso professor José Américo Mota Pessanha reservou um volume em sua homenagem na 1ª edição de Os Pensadores, a de cor azul e capa dura, onde constam trechos de vários livros seus, entre eles “A Monadologia”, traduzido pela professora Marilena Chauí.

Schopenhauer

Só que o que me tocou o espírito não foram os conceitos ou a sapiência deste ilustre frater.
Por algum motivo, provavelmente relacionado à minha situação psicológica atual, comoveu-me ler que, no seu funeral, apenas seu secretário esteve presente.
A solidão deste homem na morte me chamou a atenção para o destino de muitos dos pensadores que deixaram como legado um extenso trabalho intelectual, muitas vezes de importante aplicação prática na vida da sociedade, mas que em função exatamente de sua capacidade intelectual avançadíssima para a época, tiveram vidas pessoais bastante inexpressivas e pessoalmente muito pouco gratificantes.

Spinoza

Lembrei-me de Schopenhauer e de sua notória misoginia e mau humor, cuja obra teve reconhecimento tardio; de Spinoza, morrendo de tuberculose, aos 36 anos, pobre, excomungado pela comunidade judia de Amsterdan, o qual não obteve em vida reconhecimento algum; de Pascal e de sua saúde sempre frágil, falecendo precocemente aos 39 anos; e finalmente Nietszche, e seus propalados problemas de saúde, que o faziam passar longos períodos no norte da Itália,e que acabaram por consumir sua razão.
Fora Newton, também frater da Rosacruz, que não era pensador, mas físico e matemático, que conheceu a glória e o reconhecimento em vida, a história dos antigos e de alguns modernos pensadores não foi um primor de equilíbrio ou de felicidade. Não há entre eles uma tradição de terem na existência o mesmo equilíbrio que demonstram em suas obras pessoais, que representaram avanços na qualidade de vida de toda a humanidade, via de regra, no entanto, de modo invisível ao público e ao leigo, que embora admire as viagens espaciais, não pode distinguir a presença do trabalho matemático de Gottfried Leibniz na antiga Alemanha do século XVII, orientando a órbita das naves interplanetárias, em meio a tantos computadores.

Blaise Pascal

O que movia seu trabalho, não era, portanto, o reconhecimento ou a fama, já que não era compreendido a ponto de obtê-lo. E muito menos ser conhecido, já que o nível de sua obra era do ponto de vista científico extremamente esotérico, aliando-se a isso o fato de que publicou apenas um tratado em vida, “Teodicéia”, cujo texto principal pode ser encontrado na edição supracitada dos Pensadores da Ed. Abril Cultural, mantendo quase todo o seu pensamento registrado na forma de artigos curtos e de vasta correspondência.
Em uma época como a nossa, na qual as pessoas matam por um pouco de sucesso e fama, a solidão digna e inevitável destes homens não causa inveja, (dado que a solidão em si não é um desejo, mas consequência de um estilo de vida), mas nos faz repensar a importância da vida social e da convivência.
Poucos, mas bons e verdadeiros amigos; poucas, mas sólidas relações sociais; muitos, mas muitos livros, são mais do que suficientes para garantir a nossa qualidade de vida.
Com certeza, se vivos estivessem, pessoas como Leibinitz ou Pascal não teriam um perfil no Facebook.
E não se sentiriam mal por isso.
Nem um pouco.

sábado, 12 de novembro de 2011

OBJETIVO X SUBJETIVO, CONSCIENTE X SUB CONSCIENTE


Por Mario Sales, FRC.:;S.:I.:;M.:M.:




Há palavras que desafiam nossa compreensão ou mesmo nos confundem. Expressões como Plano Objetivo e Subjetivo são aparentemente simples de entender já que percebemos, intuitivamente, referem-se, uma àquilo que tem caráter concreto, ligado à realidade palpável, e a outra, às concepções pessoais deste chamado mundo concreto no qual habitamos e com o qual nos relacionamos, cotidianamente, concepções estas que modificam para nós a percepção e o significado simbólico destas concretudes. Para alguns, uma estátua é apenas pedra; para outros, simboliza romance, inspiração. Este é o caráter subjetivo de uma contemplação. 


Já o Plano Objetivo, por sua vez, diz respeito ao sensorial, desde que este não esteja corrompido em sua função por distúrbios neurológicos causados por situações adversas fisiológicas ou aquelas artificialmente provocadas por drogas. Os exemplos clássicos são a miragem por desidratação no deserto e o álcool que quando consumido em excesso "nos faz ver coisas". 
Por outro lado, o subjetivo tem a ver com impressões, aquilo que julgamos ver em algo que contemplado por outra pessoa se revelará de outra forma. Neste caso estamos lúcidos e acordados, mas é como se sonhássemos. 



O mais curioso é que o chamado Plano Objetivo é tido como algo próprio do estado Consciente, mas freqüentemente não é assim. Alguém que em nada se parece com nossa mãe nos traz a sua recordação. Só que esta pessoa que nos lembra nossa mãe, embora não tenha a mesma fisionomia, usa o mesmo perfume e, muitas vezes automaticamente, inconscientemente, percebemos seu odor e fazemos a associação. A percepção objetiva foi, portanto alterada por um dado inconsciente, que por ser inconsciente, é classificado de subjetivo. O que concluímos aqui é que o subjetivo, portanto, não tem caráter necessariamente espiritual, e certas vezes nem psicológico, mas neurológico, só que de forma tão inconsciente que não nos damos conta. (esquema 1)
Esta distinção entre o que antes se chamava de subjetivo e apenas psicológico e o que hoje se sabe orgânico e neuropsicológico, tem uma grande importância. Evidencia coisas que Schopenhauer já descrevia. As necessidades do corpo são informadas ao nosso cérebro de modo inconsciente e lá são sublimadas e transformadas em pensamentos e idéias na mente, dando a impressão de que nasceram na mente no momento em que se tornam conscientes, quando na verdade têm uma existência mais antiga, originada no inconsciente ou subconsciente, para só depois se tornarem claras para nós. 
Por exemplo, meu corpo detecta necessidade de água. O que acontece? A informação é repassada ao cérebro e a boca imediatamente seca. Levanto e vou em busca da água. Suponho que minha sede se iniciou a partir da língua seca. Tudo começou muito antes, no entanto. Só que não nos apercebemos disso.[1]

sublimação dos impulsos orgânicos

Recentemente, um interessante trabalho mostrou que nem mesmo as escolhas são conscientes. A avaliação é feita em segundos pelo inconsciente e só depois da decisão tomada é que esta se torna consciente para nós, digamos assim, com pinta de decisão independente. A pergunta é: quais os critérios que o corpo considera para tomar suas decisões, por exemplo, entre dois tipos de líquido, o vinho e a água, para desfazer nossa sede? 
Provavelmente ele, corpo, considera aspectos que jamais seríamos capazes de identificar, já que o corpo tem informações sobre ele mesmo em tempo real que nossos modernos recursos de exame na mesma velocidade não poderiam ter. O teor de cálcio, fósforo e potássio, o nível da glicose e das gorduras, as enzimas, a quantidades de hemácias do sangue e das plaquetas, tudo isso o corpo acompanha, através do sistema nervoso autônomo, sem que nenhum de nós tenha que fazer qualquer movimento. Provavelmente também a qualidade destas escolhas inconscientes é mais perfeita do que se tentássemos fazê-la de modo consciente, no qual a infinita quantidade de variáveis envolvida na decisão nos enlouqueceria.

Sigmund Freud

Nós, seres humanos, habitamos um corpo automatizado, que pelo menos aparentemente nos deixa livres para empreender outras coisas como, por exemplo, pensar, considerar os aspectos elevados da existência, comungar com o Todo Poderoso na busca de mais informações sobre a natureza da vida, e outras coisas mais. Estas outras coisas, com certeza, são o principal objetivo da existência e o corpo, de forma autônoma, deveria se manter equilibrado todo o tempo e nada deveria ser capaz de impedir isto. 
Carl Gustav Jung

E o que impede que isso ocorra, então? A ação da mente, segundo Masaharu Taniguchi, fundador da Seicho-no-Iê; a ação da mente, segundo os Yogues; a ação da mente, segundo os acupunturistas, já que os estados de humor levam a bloqueios do fluxo de Ki e desencadeiam assim todas as patologias no corpo físico. E onde está esta mente de que falamos? No espaço do subconsciente, ou inconsciente, como queiram, o mesmo espaço responsável pela manutenção da saúde e da homeostase.
Daí a necessidade premente de compreender a natureza desta entidade invisível e altamente instável, nem que seja para conseguir saúde física e psicológica. 
Teçamos pois algumas considerações sobre a Mente.
Vimos que, em grande parte do tempo, ela funciona sem influencia do consciente. Concluímos que a função mental praticamente prescinde desta mesma Consciência que antes julgávamos tão poderoso e presente. Será no entanto, tão pequena assim a participação do Consciente no processo mental? 

Schopenhauer

Porque o sentido seria unidirecional, do inconsciente para o consciente? Será o consciente , digamos, tão subserviente assim ao inconsciente? Não, a psicanálise mostrou que através de diálogos em estado de vigília, sem recorrer a hipnose, o indivíduo é capaz de mexer com suas profundezas, de retornar sobre seus passos, desde os degraus do andar de cima, digamos assim, do consciente, até o primeiro degrau da escada lá embaixo, no subconsciente e contemplar, uma vez lá, a origem de seus comportamentos. Da mesma maneira que o inconsciente influencia o consciente e subjetiviza o que parece extremamente objetivo, do mesmo modo nossos pensamentos e a educação psicoterapêutica ou o processo iniciático verdadeiro, como já discutimos antes, podem nos ajudar a objetivizar o subjetivo no inconsciente e modular e melhorar o desempenho de nosso subconsciente. 

Inconsciente


Só que isso não é novidade. Se pensarmos bem, Freud havia postulado três níveis de atuação da personalidade, os quais interagem entre si: um que tem expressão social e que nos representa nas relações humanas, o Ego, que vem a ser a resultante do encontro de dois outros níveis, forças poderosas, uma representando o mundo das pulsões, o Id, e outra representando o mundo dos valores sociais educacionais, o Super Ego, que Nietzsche tão bem trabalhara anos antes, discorrendo sobre o papel dos valores morais na determinação dos comportamentos. Freud, em sua época, postulou que a liberação do jugo do Superego pelo Ego permitiria a manifestação natural e livre do Id o que traria o indivíduo de volta a um estado de saúde psicofísica (esquema 2). Os sintomas neuróticos seriam manifestações deslocadas de forças reprimidas e que escapavam por lugares inesperados, como a fumaça de um incêndio em uma casa fechada escapa pela primeira janela aberta que achar.
Eu postulo algo diferente: que a Homeostase entre as forças e não a anulação de uma delas é que leva à saúde mental. A simples anulação de estruturas originadas na educação, pressupostas todas como elementos de repressão e recalque dos desejos, não leva necessariamente ao estado de equilíbrio e saúde. Gosto da idéia da fumaça do incêndio, mas como Jung, penso que as forças do Inconsciente, do Id, não são apenas fumaça sem sentido. A mente a meu ver é mais parecida com a caldeira de uma antiga locomotiva ferroviária do que com uma casa em chamas. O vapor, bem contido, bem liberado, movimenta as engrenagens e o trem progride, rápido, nos trilhos. Pressão demais, e a caldeira explode, e o trem pára. Pressão de menos e a máquina não funciona, e o trem outra vez pára. Não se trata de liberar o vapor ou não, mas de manter a máquina em movimento. 
Colchão D´água


Trata-se do que eu chamo de Teoria do Colchão D´água. Se Freud estiver certo, e três forem as instâncias que dialogam dentro de nós, provavelmente elas estão relacionadas entre si como a água dentro de um Colchão D´água. Se mexermos em uma, mexeremos nas três ao mesmo tempo, como quando sentamos no colchão em um dos lados e todos as partes do colchão se movimentam. 
Masaharu Taniguchi

Trata-se de modular a intensidade de cada um dos três componentes para que o equilíbrio se restabeleça. O que Freud brilhantemente percebeu e usou em seu método psicanalítico foi a idéia de que drenar alguma pressão deste subconsciente sobrecarregado diminuiria a pressão interna e faria desparecerem os sintomas neuróticos. Só que o processo psicanalítico é lento e complexo e não é capaz de liberar todas as forças recalcadas no subconsciente, mas apenas uma parte delas, o que em si já seria suficiente para diminuir a intensidade e o número de sintomas neuróticos. Liberar tudo de uma vez, anular o Superego totalmente, não é o objetivo correto nem desejado, acredito, nem para a Psicanálise, se entendi bem o pensamento de Freud. É preciso equilibrar os componentes da tríade. Se como Freud queria, existe repressão, isto não se deve a simples presença de um Superego em si, mas ao peso que ele recebeu na equação das forças; e o Id , da mesma maneira, como dizia Millor com sabedoria, não é inconsciente à toa, mas porque sua liberação sem critério mergulharia o indivíduo em uma experiência anti-social, o que para alguns psicanalistas necessariamente não seria um problema, mas para a sociedade em seu conjunto, na minha humilde e talvez conservadora opinião, seria. 
O que chamamos de Plano Objetivo, Consciente, portanto, é apenas o resultado de um entrecruzamento de forças inconscientes, abaixo, no Id, e inconscientizadas no Super Ego, acima, (porque automatizadas pela educação, como um condicionamento absorvido)  o que torna este chamado Plano Objetivo muito, mas muito Subjetivo (esquema 2). Não é a toa que existem salvaguardas no processo científico para evitar a subjetividade na aplicação de um experimento bem como na interpretação de seus resultados. Isto decorre da constatação de que o Subjetivo, este sim, é Onipresente, e é impossível ter um conhecimento verdadeiramente científico se não formos cuidadosos em nossas análises. A mais conhecida destas estratégias é o uso do modelo duplo cego nos trabalhos científicos onde nem o cientista , nem o indivíduo que está recebendo uma droga de teste sabe se está tomando a droga em questão ou um simples comprimido de açúcar, já que é conhecido o poder da mente para achar que melhorou se for induzida a crer que tomou um remédio muito poderoso (efeito placebo). 
Em síntese, quando falarmos em Plano Objetivo, estaremos falando apenas em estado de Vigília, o estado em que estamos acordados, já que, depois deste arrazoado, se eu falar que este é o plano onde estamos Conscientes, estarei sendo contraditório. 
Consciente e Inconsciente (ou Subconsciente) interrelacionam-se e interferem no que chamamos de atividade mental objetiva ou subjetiva, sem distinção de fronteira entre eles. Dizendo de outra forma, o que chamamos de subjetivo é muitas das vezes um processo meramente orgânico, mas não consciente, enquanto objetivo é tudo que chamamos consciente, mesmo que não o seja totalmente, como vimos, mas secundário a desejos orgânicos inconscientes. 




Portanto, se seguimos o discurso Rosacruz e encontramos o aforismo de que o homem é um ser dual, composto de um aspecto objetivo e outro subjetivo, o primeiro voltado para as coisas da matéria, e o outro, o subjetivo, voltado para as coisas do espírito, cometemos um pecado conceitual. Ambos, de fato, planos objetivo e subjetivo, estão misturados, como as linhas da ilusão de ótica acima. Não podemos dizer que o lado subjetivo é espiritual, já que muito desta subjetividade responde a estímulos inconscientes orgânicos, físicos e não espirituais, enquanto que o lado objetivo não é necessariamente voltado para a matéria porque atende as questões cotidianas e de sustentação da vida material, uma vez que a reflexão espiritual, as elaborações metafísicas são, na maioria das vezes, práticas feitas no Plano Objetivo. E já que o sistema nervoso autônomo cuida da manutenção, como o nome diz, automática da existência física de forma inconsciente, vemos que o lado chamado subjetivo também cuida da parte material, talvez de forma muito mais significativa do que o lado objetivo; e, insisto, quando oramos, oramos com nossa consciência desperta e acordada, pensando e sentindo nossas palavras e para isso usando nosso lado objetivo, consciente, e não aquele lado sobre o qual não temos nenhum controle, o inconsciente, e que muitas vezes, isso sim, nos controla organicamente e determina nossas opções psicológicas. 
Não é verdade, portanto, que Deus esteja no lado subjetivo e que, digamos assim, o Diabo esteja no Objetivo, ou vice versa. Deus está presente em ambos as partes que nos compõem, cada uma ao seu modo, partes de um mecanismo de autopreservação. O espaço que resta para nós de autonomia e ação voluntária é muito, muito pequeno, e é nele que desenvolvemos nossos exercícios mentais e jogamos o jogo da existência, chamado de batalha por alguns e representada, simbolicamente na Mitologia Hindu, na interpretação de Paramahansa Yogananda, pela expressão “nosso Kuruksetra”.


ESQUEMA 1



ESQUEMA 2



LINK PARA O DOCUMENTÁRIO COMPLETO SOBRE A VIDA DE ALBERT EINSTEIN DUBLADO EM PORTUGUÊS

O BHAGAVAD GITA, DE PETER BROOK

domingo, 6 de novembro de 2011

ELI,ELI,LAMAH SABACTANI OU A FALTA QUE AS PULGAS FAZEM


Por Mario Sales, FRC.:,S.:I.:,M.:M.:



O Sagrado sempre foi o Separado.
As Religiões responsabilizaram-se por consagrar esta situação. E sejamos justos, não me refiro apenas aquelas de denominação cristã. Judeus, Islâmicos, e mesmos os Budistas do Norte, ao contrário do Zen, constituíram estruturas de separação entre aquilo estava embaixo e o que estava em cima, no Alto, no Altar.
Ao que parece esta estratégia não era só um movimento de poder; tinha a ver também com as características educacionais e psicológicas da própria humanidade.
No entanto o gênero humano, graças aos céus, não é homogêneo. Se fosse assim, todos os seres humanos deveriam ter a mesma distância do Sagrado. Não é assim entretanto.
Existe uma classe de seres, os místicos, que não pensam nem sentem desta forma as coisas sagradas. E guardadas as devidas diferenças regionais, sua posição sobre isso é bem homogênea. Rosacruzes, Yogues, sufis, não importa, sua perspectiva como místicos, em relação a este tema, é inteiramente diversa daquela dos religiosos.
Para o místico o Sagrado é difuso, não localizado; não pode ser posse de um ou mesmo de alguns, mas pertence e está em todas as pessoas, mesmo naqueles que não tenham noção de sua presença.
O ministério cristão traz demonstrações disto.

Jesus não era Cristão, não pertencia a nenhuma religião, se bem que fosse judeu de nascimento. Embora respeitasse e conhecesse os textos de seu povo, não seguia regulamentos morais de outros a não ser de sua própria consciência, como quando curava aos sábados, dito um dia de recolhimento.

Poucos iluminados foram tão felizes em demonstrar a fusão do divino e do humano como o Mestre Jesus.





Seu primeiro milagre não ocorreu em uma cerimônia religiosa mas em uma festa de casamento; pregava em toda parte, em praças, embaixo das árvores e em festas na casa de um coletor de impostos judeu, visto com desdém até pelos seus. Fez questão de mostrar piedade por uma mulher adúltera, a qual sem a sua intervenção seria apedrejada até a morte; fez também a sua mais devota seguidora uma simples prostituta, Madalena, dizendo que ela demonstrou por ele mais carinho do que outros, ditos sem pecado.

Mais: tomado de fúria, ele, um homem de paz, chutou o pau, não de uma, mas de muitas barracas, às portas do templo em Jerusalém, enquanto açoitava quem se arriscasse a ficar perto, num episódio que embaraça até hoje os exegetas, os quais tentam justificar seu desatino com as mais estapafúrdias explicações, como se o Cristo precisasse delas.

Homens e mulheres que vivem por sua própria consciência são assim. Têm um senso todo próprio de justiça, despertaram em si o contato direto com o Altíssimo e assumem atos e palavras que soam com extrema autoridade àqueles que os escutam.
Não precisam mais das tolas explicações humanas para seus atos e para suas palavras.
E mesmo aqueles que se tornam seus discípulos, que recebem seu toque pessoal como os apóstolos receberam em Pentecostes, não conseguem acompanhar seu ritmo. Pedro, por exemplo, anos depois da Ascensão do Mestre aos Céus, em Atos dos Apóstolos, quando levado por anjos a casa de um centurião honrado que queria ouvir a palavra de Deus, diz, como que surpreso com sua descoberta: “Vejo que Deus verdadeiramente não faz acepção de pessoas.”



O Sagrado, portanto, está em toda parte, no Cristo e no Centurião, na Prostituta convertida e no pescador simples que se torna o primeiro papa. Nos templos, sim, mas também nas praças, nas festas de casamento e nas reuniões as mais mundanas.

O Sagrado não pede permissão para entrar em nossas vidas e, se não se revela, na maioria das vêzes é porque aguarda o momento certo para poder se revelar, aquele momento no qual sua manifestação plena não nos fará mal, pois até a luz em excesso pode nos cegar.
Só que uma vez manifesto o Sagrado não nos torna menos humanos.
O Divino em nós apenas modula nossa Humanidade, bem como o Humano em nós modula nossa Divindade, regula a expressão desta divindade em busca de um equilíbrio psicológico e de uma homeostase espiritual a mais adequada possível.
Por isso homens e mulheres mesmo iluminados podem sofrer como humanos, desejar, comover-se, temer, suar sangue de ansiedade, enfurecer-se, porque não perderam sua condição humana ao se divinizarem.

Sempre foram ambas as coisas, mesmo quando não sabiam disso.
Deus não está nem nunca esteve ausente de nenhuma parte de nós, nem em nosso corpo, nem em nosso espírito. E o comportamento desses iniciados, divinos e humanos, em essência e em manifestação, deve ser aceito tal como é, sem tentativas de explicações para os seus atos ou para suas palavras. Porque como eles só os compreenderemos quando os testemunharmos com nossos corações, quando os ouvirmos com nossos corações e não com nossos cérebros. Só o intelecto pode elaborar explicações, tentando adaptar sua história aos nossos valores e idéias de mundo, nossos preconceitos enfim, mesmo que achemos nossas idéias as mais nobres possíveis e as nossas intenções as mais justas. Principalmente se formos membros da comunidade mística mundial.
Sim, se existe um grupo de pessoas que teoricamente compreende bem o papel do invisível no visível, que sabe como perceber a luz que vem dos Mestres, este grupo não é o dos religiosos, mas dos místicos. Ou deveria ser. Por que como vemos às vêzes, mesmo aqueles que tem um convívio próximo com as Luzes do Mundo não conseguem ultrapassar suas próprias limitações de compreensão.

Foi assim com Pedro e o Cristo; e recentemente com Blavatsky. É no mínimo curioso que ela , secretária não de um mas de três Grandes Mestres Cósmicos, pudesse ecoar uma tentativa de explicar, justificar, em suma, de salvar a imagem do Cristo que, na crucificação, no auge da dor e do sofrimento, se desespera e clama : "Eli, Eli, lama sabactani", o início do salmo 22, traduzido por “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”.

Toda iniciativa intelectual parte de um pressuposto moral, de uma convicção. E o que deu o ponto de partida para o raciocínio justificativo de Blavatsky (negando o direito ao Cristo de desesperar-se e que está exposto em seus escritos escolhidos), fica implícito, é a crença de que o Cristo, o Filho de Deus, não poderia ter dito uma coisa dessas. Como seria possível, na concepção de Blavatsky e de outros, que o Iluminado Jesus pudesse se desesperar ou pronunciar quaisquer palavras de desespero, ou mesmo por um breve momento, de falta de fé?
Nada nesta análise blavatskyniana considera o lado humano do Cristo, sua alegria nas festas, sua fúria contra os comerciantes do templo, seu suor de medo e ansiedade no Monte das Oliveiras, antes da prisão iminente e já sabida, reações e comportamentos absolutamente humanos.

Não, o Divino e ao mesmo tempo humano Jesus não poderia ter se desesperado, não poderia após toda dor, toda a humilhação e após os açoites aos quais foi submetido ter um mísero momento de desespero antes da morte a ponto de dizer, como qualquer um de nós teria dito, Deus meu, Deus meu por que me desamparastes.
Não, não ele, que para ela, ao que parece, não era um homem, mas uma espécie de super homem. Ele, que ao longo de toda a sua vida tinha dado uma série de sinais de que era tão humano quanto divino; mas não: seria inaceitável. Ele não poderia ter dito tal coisa.
Alguns religiosos apressaram-se a explicar que não era isso, que a palavra não era essa, esquecendo que o salmo não oferecia outro contexto. Blavatsky concorda com estes preconceituosos comentários.

Por isso, lemos nos escritos de HPB:
“Por dez anos ou mais, sentaram-se os revisores (?) da Bíblia, um conjunto  imponente e solene dos maiores sábios da terra, grandes conhecedores do hebraico e do grego, estudiosos da Inglaterra, pretendendo corrigir os erros e erros, os pecados de omissão e de comissão de seus antecessores menos preparados, os tradutores anteriores da Bíblia.
Será que nenhum deles viu a diferença gritante entre as palavras hebraicas azabvtba-ni, em Salmos, 22 e sabachtbani em Mateus? Será que não estavam cientes desta falsificação deliberada?” (http://www.theosophy-nw.org/theosnw/world/christ/xt-aed.htm)
Digamos que houvesse um erro e que no salmo a palavra não fosse sabactani, abandonastes, mas azabvtba-ni, glorificastes: se a frase for a mesma do salmo de Davi, não faz sentido. Pois o salmo não fala de um homem glorificado, mas de um homem que se queixa da falta de resposta as suas preces, ou seja, alguém desesperado. Isto está descrito com clareza na análise do Dicionário Bíblico Universal de A.R.Buckland e Lukyn Willians, tradução de Joaquim Figueiredo, 4ª edição, ou no Livro dos Salmos Comentado, Ed. Mayanot, traduzido por Adolpho Wasserman , pág. 27 , em português e hebraico; mas não: ela preferiu dar atenção a uma interpretação esdrúxula, complexa, que, convenhamos, partia do princípio psicologicamente ingênuo de que um iluminado não pode ter um comportamento humano comum. Mesmo depois de ter tido vários, os quais, ressalte-se, ninguém contestou.
Uma mística importante, fundamental ao trabalho dos Mestres, como Pedro foi fundamental ao trabalho do Cristo. E no entanto do mesmo modo, ingênua.

Porque o Cristo não poderia ter dito tal frase? Qual de nós já não desesperou? Qual de nós, atingido pelos flagelos de Jó ou algo que nos cause alguma dor física ou moral desproporcional , diante da inevitabilidade dos fatos e do natural silêncio do Universo, que a tudo contempla sem interferir, já não bradou aos céus: “Eli, Eli, lama sabactani?” E por que, meu Deus, deveríamos ter alguma vergonha disso?
Se um ser tomado pela Divindade como o Cristo, nos mostra o que todos sabem, que a dor do viver às vêzes parece insuportável, isto deveria ser uma lição de vida para nós e não algo a justificar.
No Homem-Deus humanizado pelo sofrimento, encontramos mais uma vez o consolo e o perdão para o nosso próprio desespero, e para olharmos para nós mesmos sem censura por sermos ou nos comportarmos de acordo com nossa natureza humana.
Blavatsky como Pedro demorou para perceber coisas óbvias da existência.
Suas considerações sobre o episódio dizem que o Cristo apenas reproduzia trechos de iniciações secretas, que não foram compreendidas por quem as ouvia. A pergunta é: qual a importância disso? Por que esta angústia em mudar este trecho da história da paixão?
Digamos que ela estivesse certa de fato. Continuaria errada de direito, pois partia do princípio, repito, que o Deus Homem, capaz da Ira, capaz da Alegria das Festas, capaz da convivência e amizade com seres de todas as espécies e classes sociais, sem distinção, capaz do medo e da ansiedade, não pudesse ser capaz do desespero característico de qualquer ser humano, de qualquer um de nós.
Como Pedro, não havia percebido, até uma idade avançada, que Deus não faz acepção de pessoas, o que dito de outra forma quer dizer, Deus não tem pré-conceitos.
Blavatsky ao tentar mudar a interpretação da frase do Cristo não atinou que estava sendo vítima dos seus preconceitos sobre como um Homem Deus, um Mestre, deve se comportar.
Preconceitos são como as pulgas dos quadrinhos em epígrafe. Embora não façam parte do cachorro, passam tanto tempo nele que quando se vão deixam grande vazio, na verdade solidão. E esta solidão dos preconceitos perdidos, embora represente avanço psicológico para quem a experimenta, não é confortável, nem agradável. Viveríamos melhor sem idéias pré concebidas mesmo que nos sentíssemos estranhos no início.
Como cães sem pulgas.

Como seres humanos comuns, mesmo que com poderes incomuns, Mestres Espirituais não são Super Homens ou Super Mulheres.
São o que são, Irmãos mais Velhos.
Não devemos lançar sobre eles nossas pulgas.
Ele já têm suas próprias pulgas para coçar.


PS: As fotos são do Filme Jesus de Nazaré, de 1976, de Franco Zefirelli. O Ator que faz o papel do Cristo chama-se Robert Powel.