Multi pertransibunt et augebitur scientia (Muitos passarão, e o conhecimento aumentará).

sexta-feira, 17 de junho de 2016

O ZEN DAS COISAS

por Mario Sales,FRC, SI, MM




Ontem, aconteceu mais uma reunião da confraria do Vinho “In Vino Veritas”, a reunião semanal que fazemos todas as quintas, lá em casa. Ao final, os meus queridos confrades, demonstrando a gentileza característica deste relacionamento fraterno, dispuseram-se a me ajudar a retirar as taças da mesa.
Argumentei.
Tentei explicar que este momento imediatamente após a saída de todos, em que fico arrumando a sala, lavando as taças de vinho, de água, e as pequeninas de vinho do Porto, me garantem alguns instantes de meditação e paz.
Não me entenderam nem me escutaram.
Certos de que estavam fazendo um bem, rapidamente tiraram da mesa todas as peças daquele ritual pagão abençoado e que tanta alegria nos traz.
Depois que já tinham ido, enquanto lavava e limpava o Decantador e os outros vidros, meditava como nossas intervenções na intenção de causar o bem seguem razões e compreensões absolutamente pessoais, que quase nunca estão em harmonia com os fatos ou com a realidade da pessoa pela qual fazemos a intervenção.
Uma vez, discutindo com pacientes do serviço de geriatria sobre dor e sofrimento, comentava com eles que a demência protege o demente, já que a angústia de quem testemunha a decrepitude progressivamente mais intensa e devastadora daquele que antes era uma professora de piano ou um empresário é sempre mais intensa do que a da vitima da doença, incapaz de perceber sua situação e estado mental.
Ou seja, dizemos: “-Meu Deus, como sofre este coitado.” quando na verdade o sofrimento é nosso ao vê-lo ou vê-la naquele estado.
Da mesma maneira, achamos que sempre que retiramos um fardo das costas de alguém, mesmo que seja o trabalho de retirar uma mesa de uma reunião da confraria, estamos necessariamente ajudando o anfitrião.
Esquecemos que este momento pode ser uma parte tão importante do ritual de confraternização quanto a reunião em si, exatamente o momento em que, só, vigiado pela minha Cocker, lavo metodicamente cada taça, cada prato, com a mente vazia durante o processo.



Nestes momentos, medito. Estou em estado de paz, feliz pela experiência de convivência social recém terminada e mergulhado no silencio da casa, o silencio após os risos, o silencio pós gargalhadas, o mais fabuloso silencio que um ser humano pode experimentar.
Este é um momento Zen. O trabalho segue mecânico, enquanto a mente repousa no deleite do estado de depois.
O “depois” sempre será o momento da reflexão ou do desfrute porque sublima a experiência, absorve-a como lembrança, como processo mental, devorando a matéria e metabolizando-a em puro espírito.
A mente ficará satisfeita e alimentada de mais imagens, de mais memórias, de mais conteúdo metafísico de felicidade.




Existe um quê de religioso em boas lembranças e no processo de evocá-las, valorizando-as.
É um ritual.
Não meus queridos confrades.
Deixem que seu irmão arrume a mesa, não me ajudem, não tirem as taças, não desfaçam este altar pagão.
Este ritual pertence a quem de direito, o anfitrião, o sacerdote desta missa, que desfrutará, tanto quanto desfrutou o encontro, o período de depois do encontro, aonde no silencio da madrugada que começa, pode mergulhar, exatamente por causa desse simples trabalho doméstico, em estado de meditação serena e feliz.

sexta-feira, 10 de junho de 2016

A IMPORTANCIA VITAL DA ORAÇÃO

Por Mario Sales, FRC,SI,MM







Philipe De Lyon, biografia, SCA

Em 8 de março de 2011, publiquei o primeiro de três ensaios, que sem dúvida foi o mais polemico texto do blog, pela fúria que desencadeou entre alguns leitores que fizeram comentários ácidos, agressivos mesmo, testemunhando de modo indiscutível que a vida esotérica e as concepções de mundo ligadas a esta prática, podem, como qualquer outra prática humana, fugir ao bom senso e transformar-se em uma crença de perfil em tudo e por tudo religioso, dogmático, sem possibilidade de receber os ventos refrescantes da análise intelectual. Dogmas, portanto.
Fascinado como estou, no momento, pela personalidade de Philipe de Lyon, grande místico francês, (vejam bem, místico, não esoterista), mestre espiritual, no entanto, de esoteristas famosos como Gerard Encausse (Papus), Lalande, (Marc Haven), e Paul Sédir, os quais, por sua vez dedicaram sua vida ao legado de Saint-Yves D´Alveidre e de Alphonse Louis Constant (Eliphas Levy), este sim, esoterista e ocultista de primeira hora.
A afirmação, no trecho em epígrafe, de que todos os citados abandonaram suas buscas esotéricas diante da magnificência e força espiritual testemunhadas na convivência com Mestre Philipe foi uma novidade para mim e um dado a mais de reforço de meu ponto de vista expresso naqueles ensaios de cinco anos atrás.
Ao que tudo indica, o esoterismo com seus encantamentos e fórmulas, com seus complexos rituais e símbolos, mas parece um jogo infantil diante da força da oração e da nítida conexão que este homem, Philipe, demonstrava em seu dia a dia.
Todos os esoteristas e ocultistas, e mesmo Cabalistas Práticos, buscam desenvolver com seus estudos capacidades, dons e habilidades que foram dadas a este homem, parte por sua evolução e merecimento espiritual, parte por sua percepção da força da oração como verdadeira e única técnica teúrgica realmente importante.



Aqui, sábios e pessoas simples se igualam, já que a todos é dado passar por constrangimentos e dificuldades, de acordo com seu carma, e em meio a esta natural angustia, ocorre de recorrerem por meio da oração, à intervenção divina.
Usando de um exemplo jocoso, o ateísmo só dura até que o avião começa a cair, e um íntimo senso de relacionamento com algum tipo de inteligência dentro de nós mesmos nos induz, espontaneamente, a orar para que esta entidade modifique nosso aparente destino ou nos dê a necessária serenidade para atravessá-lo.
A oração nos fortalece e sustenta aonde todas as outras práticas falharam.
É uma técnica simples e direta, sem intermediários, sem necessidade de templos, ou de montagens teatrais exuberantes.
Para quem ora, a Terra inteira é nosso templo, já que estamos, enquanto neste planeta, no berço de nossa espécie. E esta presença, esta Shekinah,  à qual dirigimos nosso pleito, seja ele ou ela quem for, desde que façamos nossa prece com sinceridade, imediatamente nos responde, na forma de uma solução que muitos dizem ter “caído do céu”, ou na mudança do nosso estado de ânimo, de inseguro para confiante, de temeroso para destemido, auxiliando-nos, física e psicologicamente, a superar nossos impasses.
Uma peça está em andamento e somos os atores, mas eventualmente, nossa memória pode falhar.
Para isso, existe um recurso na boca do palco, aonde um leal colaborador acompanha nossa fala em um texto escrito e nos recorda o que for que esqueçamos, de forma a superarmos nossa temporária dismnésia.
Esta talvez seja a imagem mais fiel ao papel da oração em nossas existências, um fornecimento imediato, desde que solicitado, de dados que facilitem nosso desempenho em nosso palco, em nossa performance.
Não trabalhamos sós, nunca estamos sós, mas fazemos parte de um conjunto que harmoniosamente interage conosco e com o qual devemos manter um vínculo permanente, mesmo que sejam vínculos invisíveis ou inaudíveis.
Como demonstra o ar que respiramos e que nos garante a vida neste mundo, entretanto, o que é invisível e inaudível, nem por isso é inexistente.
Que a força invisível e íntima da oração nos sustente diante dos desafios da existência, como o ar que respiramos neste mesmo instante, de forma inconsciente e mecânica.
Assim Seja.

domingo, 5 de junho de 2016

Phillipe

Por Mario Sales, FRC,SI,MM






Ressuscitar pessoas (muitas), curar doenças, ler os corações e mentes a sua frente, ver o passado reencarnacional dos indivíduos, além de poder projetá-lo em uma parede para poder compartilhar o que sabe com outros com menos poderes.
Coisas do Cristo? Não, coisas de um homem simples, comum, do final do século XIX, que sofria ao cortar suas unhas ou cabelos, mas que era capaz de parar tempestades, em terra ou mar, com um simples gesto.
Não fazia dietas especiais; fumava, não dormia muito, 4 ou 5 horas em dias, um homem politicamente incorreto.
Sua generosidade era imensa, sua prestatividade sem limites.
Estive contato com sua história pelo blog de um amigo, um Frater, e desde aquela época sua personalidade me envolveu. Recentemente, voltei a ler sua biografia, escrita em parte por Sédir, Alfred Hael e outros.




Jean Chapas

Um daqueles que, dado como morto, ele trouxe a vida, ele chamava de Caporal, ou seu Cabo, Jean Chapas, e se tornou seu herdeiro espiritual continuando as sessões, reuniões regulares que realizava na Rue Tête D´Or 35, em Lyon. Hoje no endereço, existe um cabelereiro, mas olhando -se pelo alto vê-se que atrás, ligado a entrada por um corredor, existe um salão não muito grande, no espaço entre os prédios.
Deve ter sido ali que ele realizou milagres e curas, deu palestras e falou para uma audiência pouco culta e desesperada, que o procurava na busca de uma última tentativa de superar seus problemas.
E ele os auxiliava, sem hesitação, sem recorrer a quaisquer meios esotéricos, que reputava inadequados e desnecessários. Sua estratégia era teúrgica e sua técnica, a oração. Apenas a oração, nada mais. E dizia: nada peçam a mim, mas aos céus e eu ouvirei melhor.
Alguns, pela semelhança, diziam que ele era o Cristo reencarnado. Ele negava: “ainda sou pequeno, e por isso o céu me ouve. Vocês não são ouvidos por que se sentem grandes. Não sou o Cristo, sou o cachorro do pastor. ”
O mesmo vazio que o Zen pede aos seus, a mesma humildade que Jesus pedia aos que o seguiam, a mesma nulidade e transparência que permite que a luz brilhe livre e desimpedida por nós e aqueça quem está próximo de nós, como alguém perto de uma janela em um dia de Sol.
Da mesma forma que a Luz e o Calor não vêm da janela, mas da Luz do Sol que a atravessa, da mesma maneira a Luz de Philippe, segundo ele, não vinha dele mas passava através dele em direção aqueles que dela necessitavam.
Philippe foi e sempre será lembrado como um fenômeno, um homem de ação, não um orador brilhante, mas um representante de Deus na Terra, transparente a Sua Divina Luz. E isto tem apenas pouco mais de 100 anos.
Nas próximas semanas, meditemos e pesquisemos esta encantadora biografia. E que ela inspire a todos a buscar para si a mesma santidade, não pela ação, mas pela construção obstinada de um vazio de nosso Ego em nós.
Quanto mais vazios da noção de sermos alguém ou alguma coisa, mais transparentes à Luz de Deus, essa mesma luz que atravessava Philippe, estaremos.