Multi pertransibunt et augebitur scientia (Muitos passarão, e o conhecimento aumentará).

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

GUERRA E PAZ

por Mario Sales, FRC,SI,CRC 18°



É comum entre nós desejarmos o Bem, o Bom e o Belo, à exemplo de Platão, e execrarmos o Mal, o Mau e o Feio como coisas detestáveis.
Fugimos destas e procuramos aquelas como se a vida fosse só uma de suas metades, e não a esfera inteira.
É a própria vida que nos lembra de nossa complexa e dinâmica dualidade, que nos balança de um lado para o outro, todos os dias de nossa existência.
É ela que nos lembra que temos duas pernas, a esquerda e a direita, de forma que se nos falte uma delas, mancamos ou caímos.
Nosso próprio caminhar, o ato mais simples de nossas vidas, compõe-se de um desequilíbrio constante em que nosso corpo é lançado de um lado para o outro e para a frente ao mesmo tempo, como no pendular de um prumo.
Na nossa psicologia não poderia ser diferente.
Ora estamos alegres, ora tristes; ora seguros, ora inseguros; ora nos sentimos eternos, ora nossa mortalidade explode aos nossos olhos, e sentimos medo de desaparecer sem vestígios.
Oscilamos de um a outro humor, desde a hora que acordamos até a hora de dormirmos, mas vamos em frente com este balanço como quando caminhamos.
É exatamente este movimento de equilibrado desequilíbrio que nos faz avançar, passo a passo, na senda do amadurecimento.
Ao que tudo indica, não há possibilidade de ser diferente.
Diz um antigo axioma rosacruz: "A vida é dual em essência e trina em manifestação."
"Dual em essência." A essência da vida é ter duas faces, dois aspectos, sempre juntas, como os lados de uma moeda.
Nosso objetivo de vida para ser correto, portanto, ao contrário do que nos diz Platão, não é buscar o Belo, o Bom e o Bem, mas aceitar que períodos onde estes se manifestem são passageiros e fugidios. Que tudo que é polar, que se refira a um dos lados apenas da nossa existência tende a desaparecer e reaparecer de tempos em tempos, ciclicamente,  e que períodos de vacas magras e vacas gordas, como no sonho do Faraó, sempre suceder-se-ão de modo ininterrupto.
Cônscias desta dicotomia, pessoas sábias devem ter como sua companheira constante a prudência. Preparar-se para os chamados dias maus durante os dias bons e celebrar, nos dias maus, que os próximos, necessariamente serão melhores.
Com isso não evitamos o que é feio, mau, mas nos adaptamos e nos acostumamos a sua existência e companhia, sem lutar contra a natureza da vida, compreendendo-a e aceitando-a.
Perdemos desta maneira a condição de lamentadores e assumimos a posição de senhores do Carma, olhando com olhos de águia o processo ao longe e vendo suas oscilações e sua continuidade.
Sol e Lua, Noite e Dia serão apenas fases normais da vida na Terra e não fonte de sofrimentos desnecessários ou de ansiedades descabidas.
Como o Sol e o Dia tem suas belezas, também as têm a Lua e a Noite. O que nos resta como sábios é compreender esta beleza a qual vai além do simplesmente Belo de Platão, e evolui para o Natural e Verdadeiro.
Tudo que implicar opostos (Vida e Morte, Esterilidade e Fecundidade, Amor e Ódio, Guerra e Paz) manifestará, tão somente, aspectos parciais de um mesmo fenômeno, faces diferentes de um único objeto, que não podem ser separadas sem destruir a existência deste mesmo objeto.
Nós, que buscamos sabedoria, precisamos saber amar nossos dias de Escuridão tanto quanto nossos dias de Luz, nossos dias de Guerra quanto nossos dias de Paz, já que quanto mais os amarmos, menor será a variação entre eles, menor a curva da oscilação inevitável.
Somos duais. Aceitemos isto.
Como nosso corpo aceitou antes de nós, nos dando um cérebro direito e outro esquerdo, diferentes em comportamento; duas mãos que se auxiliam, mutuamente; dois pulmões, duas narinas, dois ouvidos e dois olhos, para respirarmos, cheirarmos, ouvirmos e vermos melhor.
Duais serão também nossos dias, nossos humores e amores, e todos serão manifestações legítimas de nosso Eu, que sem esta oscilação se tornaria banal e incompleto, capenga em percepção e capacidade de ação.
Que nossas Trevas e nossa Luz dêem as mãos e assinem um tratado de cooperação dentro de nós.
Esta é minha prece mais sincera por todos nós e por mim mesmo.

2 comentários:

  1. Ser feliz com o melhor de nós é um delicioso exercício, mas admitir o que nos parece feio em nós mesmos é um exercício que talvez dure uma vida inteira.
    "Chopra em O efeito sombra" define bem essa coisa viver bem com o outro lado da moeda, nos fazendo entender que esses aspectos obscuros sempre estiveram ali pra nos proteger.
    Mais paz somente apaziguando os extremos ao ponto do extremo tornar-se harmônico e por fim equilíbrio.
    Flor lás

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