Multi pertransibunt et augebitur scientia (Muitos passarão, e o conhecimento aumentará).

sábado, 24 de janeiro de 2015

A TÉCNICA DE LER MENTES

por Mario Sales, FRC,SI,CRC 18°




Todo iniciado rosacruz sabe, ou aprende ao longo de alguns anos, que as mentes humanas podem ser lidas; e que quando um iniciado busca levantar as verdadeiras intenções de outra pessoa, ele não o faz lendo pensamentos, mas sentimentos.
O Intelecto sempre foi superestimado nos últimos 2400 anos, principalmente porque o processo intelectual, por tradição que se estende a Grécia, fascina e encanta os homens de ciência, e mesmo alguns iniciados.
Por isso, em muitas tradições religiosas e místicas, bem como na tradição intelectual e científica, a razão é considerada, quando dominada, como o mais elevado patamar do refinamento humano.
O que percebemos recentemente, desde os trabalhos pioneiros de Nietzsche e Freud, é que o poder e o equilíbrio só são alcançados quando atingimos o domínio emocional.
São nossas emoções que nos fortalecem como místicos e como seres humanos. A Razão jamais conseguiu sozinha construir homens misericordiosos ou sábios, apenas homens cultos.


Martin Heidegger, autor de "O Ser e o Tempo"

Já fazem algumas décadas, no meio filosófico, a razão vem sendo posta sob suspeita. Os motivos foram muitos, desde a crítica da racionalidade nazista na construção do maior plano de destruição de vidas em massa já elaborado (chamado de "a solução final") com a perda de 6000000 de vidas judaicas; ou a descoberta de que um dos mais sublimes metafísicos do século XX, Heidegger, era membro do partido Nazista; mais: discípulo do criador da técnica fenomenológica, fundamental hoje ao trabalho intelectual e das ciências humanas, Heidegger foi capaz de, sem remorso, trair seu mestre e mentor, Edmund Husserl, demitindo-o das funções docentes da universidade em que ambos lecionavam, mágoa da qual Husserl jamais superou.


Edmund Husserl, criador da Fenomenologia

A razão, portanto, demonstrou de vários modos que, ao contrário do que imaginou ingenuamente Platão e outros, não garante que aqueles que a dominem sejam por isso necessariamente homens nobres e generosos, éticos e sublimes.
O que faz o Iniciado ser uma personalidade alma verdadeiramente refinada é o perfeito conhecimento, ou melhor, a harmonia de suas emoções.
Considerada a característica menor da personalidade, fonte de descontrole e fraqueza, na verdade é pela arte da emoção que alcançamos níveis mais altos de percepção e compreensão.
Não sem motivo Louis Claude de Saint Martin elege o coração como a Via para a Iluminação que ele chama Reintegração, não o cérebro ou a cabeça, mas o coração, sede do sentimento na simbologia ocidental(1)
Hoje percebo que é muito difícil para a maioria das pessoas entender que os pensamentos são profundamente afetados em sua qualidade e natureza pelo estado emocional e que, portanto, não são os pensamentos que controlam as emoções, mas as emoções que determinam o tipo dos pensamentos que nos acometem.
Processos de raciocínio extremamente elaborados podem sim ser apenas vestimentas e disfarces para emoções muito profundas e violentas.
É como a água dos rios e as represas: supõe-se que pela complexidade da engenharia envolvida na sua construção, as represas sejam mais importantes que as águas que elas represam e imaginam dominar. Só que seu papel e utilidade dependem totalmente da água que por elas fluem. Se por um capricho natural ou por problemas ecológicos, a água venha a faltar, a represa é apenas um esqueleto morto a céu aberto.
Da mesma forma, não há estrutura racional ou construção intelectual que exista sem uma emoção que a alimente, nem que seja a paixão de um cientista por determinado campo de ciência. É esta paixão, no sentido cartesiano do termo, que move e motiva o trabalho investigativo, empírico e interpretativo incansável daqueles que buscam novos mundos e estrelas, novas drogas e remédios, novos ligas metálicas, novos programas de computador.
Compreendido isso, é possível ler mentes, desde que não nos preocupemos em "ler pensamentos", como vemos em filmes no cinema, mas sim mantenhamos o foco nos sentimentos que mobilizam este ou aquele indivíduo à nossa frente, mesmo que ele não diga nenhuma palavra.
Cada sentimento na verdade carrega consigo um sem número de pensamentos, como pacotes de energia intelectual, atada por embrulhos emocionais, que se tornam transparentes quando descobrimos seu nome.
Embrulhos misericordiosos tem seu tipo específico de conteúdo, bem como os embrulhos de ódio, medo, inveja e cobiça. Estes embrulhos determinam discursos mais ou menos protocolares, que podem ser facilmente decodificados depois que sabemos o que está por trás deles.
É por isso que rosacruzes treinam a percepção das intenções emocionais por trás das palavras desde cedo nas práticas mentais dentro da Ordem, já que a Mente não é um conjunto de idéias como se supõe , mas muito mais um conjunto de emoções, que obedecem a um padrão especifico dependendo da personalidade envolvida.
É a isso que devemos estar atentos ao "Ler Mentes", ao perfil psicológico da pessoa à nossa frente.
Isto nos dará uma imensurável vantagem no relacionamento social, profissional e mesmo doméstico, pois anteciparemos com facilidade os fundamentos das palavras daqueles com quem dialogarmos, sejam indivíduos conhecidos ou desconhecidos.
Pensamentos são consequências, emoções são causas.
Para desvendar as intenções reais de alguém, por trás da máscara facial, é preciso focar nas causas, não nas consequências.
Será fácil,assim, antecipar receios, suspeitas, armadilhas ocultas em um linguajar às vezes cordial e elogioso.
À isto chamo perspicácia, um atributo disponível a todos os rosacruzes que se dedicarem com afinco aos seus estudos psicológicos internos.

(1)Por exemplo na clássica organização dos níveis de alma no Cabala (nefesh-instinto, ruach-emoção e neshama-entendimento) a emoção é considerada preconceituosamente como uma fase em direção a plenitude da razão, esta sim sinal de equilíbrio e maturidade.
Qualquer psicanalista sabe, entretanto, que a razão não reflete, mesmo que elaborada, maturidade emocional.
E é a maturidade emocional, a capacidade de sentir o mundo de forma equilibrada e não apenas pensar o mundo, que determina quem realmente se tornou um ser humano refinado.

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