Multi pertransibunt et augebitur scientia (Muitos passarão, e o conhecimento aumentará).

quarta-feira, 17 de junho de 2015

A TÉCNICA DE ULISSES

Por Mario Sales, FRC, SI



Cada pessoa serve com seu talento. Cada um de nós tem um talento diferente. O meu é descrever em palavras idéias, explicar coisas, didatizar informações e conceitos complexos e, às vezes, expostos, deliberadamente ou não, de modo obscuro.
Para mim nada mais faz sentido na existência, nada me dá mais prazer e alegria, do que traduzir idéias de modo satisfatório.
Mas como o cantor, para quem o canto é tudo, não canta o tempo inteiro, o explicador, como eu, não tem algo a explicar a todo o momento.
Existem longos períodos de inatividade, que poderiam ser usados para melhorar nosso conjunto de informações, nossa coleção de imagens, como em uma preparação para o próximo período de explicação, mas nem sempre damos a estes períodos a importância que merecem. E então, em vez de tomarmos estes instantes de refluxo das ondas como um instante de preparação, mergulhamos em um vazio inexpressivo onde a vida, que em si já aparenta não ter muito significado, perde o pouco do significado que possa ter.
A sensação de solidão é inevitável.
E como os livres semeadores não costumam colher aquilo que plantam, nestes instantes de solidão e inexpressividade surge uma sensação de inutilidade histórica de nossas intervenções no meio sociocultural a que pertençamos.
É um momento difícil do ponto de vista psicológico, que só pode ser atravessado com bom senso e objetividade, de forma a afastar da mente as fantasias malignas que envolvem nosso subconsciente, as quais são a expressão do Mal em nós.
Sim, o Mal, pois tudo que conduz ao desanimo, a falta de esperança e de fé na existência como caldo de cultura do crescimento, tudo que nos dá a sensação de falta de sentido é uma manifestação do que chamamos, genericamente, o Mal.
Não se trata aqui de uma forma definida, antropomórfica de mal, mas um conjunto se emoções negativas e negativantes que devem ser contempladas e monitoradas com extrema atenção, tendo-se o cuidado de restringir-lhes a liberdade em nosso ambiente mental, embora sem tentar destruí-las, já que energias só podem ser reprocessadas, nunca eliminadas. Lembremos de Lavoisier.
Portanto, embora perigosas e explicitamente hostis à qualidade de nossos pensamentos, essas imagens, essas fantasias nefastas devem ser entendidas apenas como deformações da energia fonte, passíveis, portanto, de serem refeitas em energias de qualidade, se soubermos como realizar a alquimia psíquica e psicológica necessária para isto.
A técnica para tal poderia sem prejuízo chamar-se “Técnica de Ulisses”, o mesmo Ulisses da lenda de Troia, que amaldiçoado pelos deuses é forçado a levar 10 anos para retornar a Ítaca, sua ilha e seu reino.
Em uma das passagens deste retorno, chamado a Odisséia, Ulisses atravessa uma região conhecida por abrigar sereias, as quais com seu canto levam os marinheiros à loucura e causam desastres terríveis.
Sabendo disso, Ulisses faz com que os marinheiros de seu navio, o Náutilus, usem nos ouvidos tampões de cera e manda que o amarrem ao mastro, de forma que não possa reagir ao canto, mas ainda assim possa escutá-lo.
Dessa forma o navio atravessa sem incidentes este perigoso trecho e a viagem segue sem incidentes.
Pensamentos nefastos ou de desanimo são como um canto de sereia maligno, ao qual, se dermos ouvidos, reagiremos com loucura e autodestruição.
Desta forma a melhor técnica é usar tampões intelectuais de cera em nossos ouvidos mentais e não acreditar nas informações que nos propõem sermos, apenas, seres inúteis e sem objetivo na existência.
Ensurdecidos ao Mal, seguiremos em nossa viagem como Ulisses, ilesos, seguros, em busca de águas menos perigosas, que virão, inevitavelmente.

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