Por Mario Sales, FRC, SI, MM
KH
“Seria o homem tão culpado? Vós e os que vos rodeiam nunca o ensinaram que existe algo na "Yoga Vidya". As únicas pessoas que se deram decididamente ao trabalho de educá-lo, ao fazê-lo, ensinaram-lhe o materialismo; estais desgostosos com ele, mas quem tem culpa?.... Talvez eu julgue como um estrangeiro, mas parece-me que o véu impenetrável de segredo com o qual vos rodeais, as enormes dificuldades que opondes à comunicação de vosso conhecimento espiritual, são a maior causa do desenfreado materialismo que tanto deplorais. Somente vós possuis os meios de demonstrar aos homens em geral convicções desta natureza, mas parece que, presos a antigas regras, em vez de disseminar com entusiasmo esse conhecimento, vós o envolveis numa nuvem tão densa de mistério, que, naturalmente a massa humana descrê de sua existência...não pode haver justificação para não dar claramente ao mundo os aspectos mais importantes de vossa filosofia, acompanhando o ensinamento com uma sequência de demonstrações que atraíssem a atenção de todas as mentes sinceras. Compreendo muito bem que vacileis em conferir apressadamente grandes poderes, passiveis provavelmente, de abuso; mas isso não impede, de modo algum, a proclamação dogmática dos resultados de vossas investigações psíquicas, acompanhadas por fenômenos bastante claros e suficientemente repetidos para provar que conheceis, na realidade, mais dos assuntos com que lidais do que a Ciência Ocidental.”
Trecho de carta de Allan Octavian Hume, em reposta a uma carta de Ku-Thu-Mi, 1880
Tenho lido nos últimos dias estes interessantíssimos documentos teosóficos.
Primeiro, porque por estar há tanto tempo na floresta confusa e obscura da Doutrina Secreta, é extremamente reconfortante ler alguma coisa clara e com início, meio e fim.
Os textos teosóficos não são famosos por seu didatismo, mesmo que, como todas as linhas de pensamento em Esoterismo componham-se de um grande numero de conceitos, específicos e determinados.
Só que como eu já disse antes, em Esoterismo nem sempre se considera a clareza uma virtude e supõe-se que discursos obscuros granjeiem mais atenção e admiração do que textos claros e didáticos.
Ou dito de outra maneira, tem quem goste.
Não é o meu caso. Até por hábito profissional.
Minha profissão me obriga a explicar coisas todos os dias a pessoas que não compartilham comigo a mesma linguagem, ou mesmo a minha quantidade de informação especifica sobre minha área de interesse.
Por causa disso mesmo, além de explicar, antes é preciso traduzir.
E neste viés, as Cartas dos Mahatmas são um primor de clareza, de didatismo, de linha de raciocínio, não necessitando a tal da “tradução”.
Ku-Thu-Mi discorre para Sinnett[1], seu interlocutor, as razões pelas quais não se revela ao mundo, naquela época; elabora sobre os fundamentos estratégicos e sociológicos do Hermetismo, o porque do seu segredo, e, concordando ou não com seus argumentos, o que salta aos olhos é a lógica de seu pensamento e a clareza com que o expressa. Ele escreve de modo extremamente polido, é cuidadoso com as palavras e os conceitos e nota-se que é sincero em suas afirmações.
Concordando ou não com seus argumentos, eu disse.
Porque este é o meu caso.
Não concordo (como não concordava Allan Octavian Hume, autor do comentário em epígrafe) com suas explicações de que transmitir, mesmo em parte, os conhecimentos que ele chama de esotéricos ao mundo profano seja um risco absoluto e permanente, mas sim o modo como estes ensinamentos serão transmitidos é que são para mim o critério mais importante para avaliar se esta informação será bem ou mal recebida.
Não é o meu caso. Até por hábito profissional.
Minha profissão me obriga a explicar coisas todos os dias a pessoas que não compartilham comigo a mesma linguagem, ou mesmo a minha quantidade de informação especifica sobre minha área de interesse.
Por causa disso mesmo, além de explicar, antes é preciso traduzir.
E neste viés, as Cartas dos Mahatmas são um primor de clareza, de didatismo, de linha de raciocínio, não necessitando a tal da “tradução”.
Ku-Thu-Mi discorre para Sinnett[1], seu interlocutor, as razões pelas quais não se revela ao mundo, naquela época; elabora sobre os fundamentos estratégicos e sociológicos do Hermetismo, o porque do seu segredo, e, concordando ou não com seus argumentos, o que salta aos olhos é a lógica de seu pensamento e a clareza com que o expressa. Ele escreve de modo extremamente polido, é cuidadoso com as palavras e os conceitos e nota-se que é sincero em suas afirmações.
Concordando ou não com seus argumentos, eu disse.
Porque este é o meu caso.
Não concordo (como não concordava Allan Octavian Hume, autor do comentário em epígrafe) com suas explicações de que transmitir, mesmo em parte, os conhecimentos que ele chama de esotéricos ao mundo profano seja um risco absoluto e permanente, mas sim o modo como estes ensinamentos serão transmitidos é que são para mim o critério mais importante para avaliar se esta informação será bem ou mal recebida.
Allan Octavian Hume
Como disse, explicar e ensinar é traduzir, mas é também transferir gradualmente, e não de uma vez, a informação no interesse daquele que a recebe, exatamente para que ele seja capaz de a compreender dentro de sua limitação e desfrute algum beneficio deste esclarecimento.
É trabalhoso, mas necessário, porque toda taça tem limites e o vinho de Deus jamais cessa de derramar-se em suas taças que transbordam; e para que o “Vinho Sagrado da Sabedoria” não seja desperdiçado e perdido deve ser compartilhado e recolhido por outras taças, que estejam vazias ou mais vazias que as nossas.
Nossa primeira função como seres humanos, iniciados ou não, é compartilhar nosso conhecimento.
Por isso o segredo total e absoluto, mesmo que necessário, é injusto e prejudicial.
Conhecimento, que é útil e que melhora a vida das pessoas, não pode ser sonegado. Principalmente aquele que melhora a saúde, diminui a fome, melhora o desempenho físico dos seres humanos.
Porque impedir as pessoas, principalmente as mais necessitadas, de ter acesso a condições de vida mais dignas? Muitos argumentarão que aqui se aplique o raciocínio da casca do ovo, que se for quebrada para facilitar a saída da nova ave que nasce, prejudicará seu desenvolvimento e colocará em risco a sua própria vida.
Mas penso comigo: não somos aves, somos homens e mulheres com consciência e seres dotados de uma alma imortal. Não me parece plausível que, de posse de uma informação que tenha o potencial de diminuir o sofrimento de muitos eu a oculte, alegando intenção de fazer o bem.
Os argumentos de K-H na época eram palatáveis: o problema da falta de evolução psicológica, o risco real da não aceitação de novos paradigmas na realidade, etc, etc, etc.
De lá para cá, entretanto, tudo mudou.
A física quântica perturbou nossas noções de estabilidade na matéria e nos expôs um mundo subatômico estranho e inquietante, porém real, demonstrado tanto pela matemática quanto por observações complexas.
Se levarmos em consideração que, mesmo hoje, a maioria dos seres humanos não é capaz de lidar com seja lá o que for que esses mestres tenham a revelar, poder-se-ia usar uma estratégia de incursões pontuais, para pessoas escolhidas, não necessariamente iniciados, mas homens de ciência, em todo o mundo, e ao contrário do que propunha infantilmente, a meu ver, o Sr Sinett, de modo discreto.
As revelações também poderiam ser proporcionais e escalonadas já que o material segundo se diz é tão imenso e impactante. Poder-se-ia, por exemplo, revelar apenas três coisas:
1°. Uma forma de energia que fosse barata como o petróleo, mas renovável e limpa, que livraria o planeta dos malefícios do uso indiscriminado dos combustíveis fósseis. A queda no valor do petróleo traria graves prejuízos às empresas multinacionais e aos países da OPEP, mas da mesma forma, cessaria com o fluxo de dinheiro para ditaduras e terroristas que se alimentam destes mesmos recursos para promover a morte em todo o planeta. A maioria dos países que se beneficiam dos recursos do petróleo são monumentos de tirania e atraso e não existe repercussão para o povo dos lucros astronômicos que as dinastias e monarquias destes países extraem desta fonte de energia.
Daí, salvo erro de prognóstico da minha parte, não só protegeríamos o planeta, mas também feriríamos de morte o financiamento das ações do terror, pelo menos por algumas décadas.
2°: Uma outra possível intervenção pontual seria no fornecimento de um método capaz de tornar inútil o efeito de drogas ilícitas e viciantes nos jovens e nas crianças. Com isso derrubaríamos outro império do mal, o do Narcotráfico, uma área muito lucrativa e por isso, até o momento, impossível de ser combatida.
3°: Revelar uma tecnologia que permita a dessalinização da água salgada em grande quantidade, de forma a beneficiar aqueles que estão privados deste elemento fundamental à existência.
Veja, não estamos falando em revelar tudo que há para ser revelado, mas é possível, a meu ver, revelar alguma coisa para algumas pessoas escolhidas, e repito, não necessariamente aos chamados Iniciados, pois não vejo as Ordens Esotéricas hoje em dia como o local correto para essas revoluções.
Na verdade, a meu ver sempre, o ambiente propício para tais revelações seria o meio acadêmico, para cientistas; não para todos os cientistas, mas para aqueles que demonstrarem sensibilidade somada a inteligência. Um mestre que segundo se diz é dotado de rara sensibilidade saberá escolher pessoas adequadas para tal esforço.
E porque isto que me parece banal e óbvio, não foi feito até hoje? Porque homens tão sensíveis e poderosos, como se diz, não foram capazes de estabelecer um método didático gradual para transmitir este maravilhoso conhecimento as gerações seguintes, ou aqueles que dela necessitam?
Existe a possibilidade, por mais triste que isto me pareça, de que não haja nada a revelar, e que não exista conhecimento esotérico algum guardado, e exatamente por isso esse conhecimento não foi transmitido, nem houve esforço algum didático, ao estilo dos Rosacruzes, de compartilhar esta informação, como queria Comenius, exatamente porque não há informação especial alguma a ser compartilhada.
Existe a possibilidade, por mais triste que isto me pareça, de que não haja nada a revelar, e que não exista conhecimento esotérico algum guardado, e exatamente por isso esse conhecimento não foi transmitido, nem houve esforço algum didático, ao estilo dos Rosacruzes, de compartilhar esta informação, como queria Comenius, exatamente porque não há informação especial alguma a ser compartilhada.
Será triste se for a verdade, mas é possível que seja. Lembro-me de ler em uma das cartas de K-H que, àquela época, eles, os mestres, estavam particularmente preocupados com a mobilização de tropas russas na fronteira do Tibet e que se não havia ainda acontecido uma invasão daquele país tinha sido pela intervenção direta destes mesmos mestres.
A questão é: se foram capazes de impedir a invasão russa porque, anos mais tarde, permitiram, digamos assim, o banho de sangue causado pelos chineses com a destruição de templos, a tomada em Lhasa da Potala, o palácio tibetano, isto somado a perseguição ao Dalai Lama, que de líder espiritual tornou-se um refugiado sem pátria?
Não faz sentido. A história não se encaixa.
E isto é triste porque existe muito sofrimento no mundo que poderia ser amenizado ou mesmo desapareceria se existissem alternativas operacionais ou tecnologias que pudessem amenizar a dor de milhares de pessoas. Todas as transformações tecnológicas fizeram isso, como a passagem do óleo de baleia para o petróleo como fonte de energia salvou as baleias de extinção, como a eletricidade nas casas aumentou a qualidade de vida das famílias, como as vacinas garantiram a vida de milhões de crianças, os antibióticos de outros milhões de seres humanos, e a informática tornou o planeta mais conectado, dando um senso de pertencimento de cada terrestre à humanidade e não mais apenas ao seu país.
Eu penso como médico, que sempre tratou e ainda trata de pessoas muito pobres e sem recursos.
Tudo o que eu gostaria era realizar o sonho do sexto grau da Rosacruz, oferecendo às pessoas mais saúde para que pudessem se dedicar ao que realmente importa, à evolução espiritual.
Do jeito que esta criação imperfeita e caótica funciona, muito tempo é perdido, muitas vidas são ceifadas pela dor, pelo sofrimento, pela miséria.
Todas as vidas, mesmo em corpos ilusórios, são preciosas, e como todos sabem, não concordo com o axioma de que “o sofrimento nos fortalece”. Dor só gera mais dor e revolta.
Isso deveria acabar, e se existe uma maneira de fazê-lo, deveríamos disponibilizar este conhecimento.
No entanto nada acontece. Pedem-nos que compreendamos, que a natureza humana é ruim, que não existe um jeito seguro de fazer tal transferência,
A verdade é que se eles, que são os zeladores deste jardim, não sabem como melhorar as plantas, eu que sou planta, o que poderei fazer?
Se Mestres não sabem como ensinar seus alunos como poderemos evoluir?
Dizem que quando o discípulo está pronto o Mestre aparece. Eu acho que triste do discípulo que espera pelo seu Mestre. Cada um de nós que se esforce para sozinho conseguir sua evolução. Quanto aos mais humildes, estarão condenados a permanecer na ignorância, almas imortais que são, presas em corpos limitados e dominados pela superstição. E pouca coisa será feita para modificar isso.
Pena.
O Universo precisa de todos que possa arregimentar. Se não acelerarmos o treino da mão de obra disponível, meu receio é que logo não teremos mais quem faça o serviço de consertar a Criação.
E as coisas escondidas continuarão escondidas e inúteis.
Pena mesmo.
[1] Alfred Percy Sinnett (18 de janeiro de 1840 - 26 de junho de 1921) foi escritor e teósofo. As cartas dos Mahatmas, que geraram a controvérsia que mais tarde contribuíram na divisão da Sociedade Teosófica, foram escritas majoritariamente para Sinnett. Em 1880, Helena Blavatsky e Henry Olcott visitaram Sinnett em Shimla. Em 1881 Sinnett escreveu O Mundo Oculto, e em 1883, Budismo Esotérico. Posteriormente, Sinnett foi presidente da Loja de Londres da Sociedade Teosófica. Ele foi Vice-Presidente da Sociedade Teosófica entre 1880-88, 1895-1907, 1911-1921, e atuou como Presidente por quatro meses em 1907, logo após a passagem de Henry Steel Olcott. Posteriormente, Sinnett foi presidente da Sociedade Teosófica.
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