Por Mario Sales
“Recapitulando: a Doutrina Secreta
foi a religião universalmente difundida no mundo antigo e pré-histórico. As
provas de sua difusão, os anais autênticos de sua história, uma série completa de
documentos que demonstram o seu caráter e a sua presença em todos os países,
juntamente com o ensinamento de seus grandes Adeptos, existem até hoje nas
criptas secretas das bibliotecas pertencentes a Fraternidade Oculta.”
Doutrina Secreta, volume 1,
Cosmogênese, pág 57, Ed Pensamento.
É preciso crer para o estudo esotérico. Não necessariamente saber,
mas navegar em meio as informações que nos chegam de vários textos acerca de
feitos extraordinários e pessoas incomuns que viveram e andaram neste planeta
como nós andamos.
É comum lermos em textos considerados iniciáticos as
expressões “isto prova…” ou “com isso demonstramos…” e outras, que visam dar um
ar de credibilidade a estes mesmos textos, como se por um passe de mágica,
afirmar passasse a ser provar.
Já comentei em relação a Isis sem Véu, um texto importante
de Helena Petrovna, a ingenuidade presente em suas afirmações ao descrever como
verdadeiros relatos de pessoas que, segundo ela, “gozam de reputação ilibada”,
digamos assim.
Ou seja, naquele século, o XIX, ainda se considerava prova
irrefutável não o que fosse demonstrado, mas o que fosse testemunhado por
alguém que no consenso da sociedade tivesse uma reputação respeitável.
Eram outros tempos e o ceticismo cartesiano não tinha ainda
ganhado a importância que recebeu no final do XIX e em todo o século XX. Ou por
outra, o esoterismo ainda achava que a expressão provar podia ser usada de modo
retórico, sem a necessidade de ser acompanhada da descrição do experimento ou
expressão matemática que a sustentasse como tal.
Assim, nós, esoteristas, vivemos ingenuamente de crenças.
Nos últimos séculos o exercício esotérico aproximou-se perigosamente da
religião, tecendo lentamente um conjunto de afirmações que não são acompanhadas
das necessárias e tão desejadas demonstrações que a maioria dos neófitos em
escolas iniciáticas gostariam de ver.
Fala-se inclusive de um tipo de atitude que é considerada a
mais adequada quem quer se aventurar neste campo, qual seja, “na ciência, ver
para crer e no misticismo, crer para ver”.
Isso realmente me preocupa.
Este é o nosso maior pecado, enquanto místicos rosacruzes e
esoteristas sinceros. Nossa erudição não vem acompanhada de um esforço
determinado em criar as condições que permitam uma experiencia comum de fatos e
conhecimentos palpáveis que sustentem nossas afirmações.
Lewis lembrava que a verdadeira prática rosacruz era baseada
na confiança e não na fé, da mesma forma que “confiamos que o sol vai se
levantar amanhã porque vimos este fenômeno acontecer em todos os outros dias de
nossa existência.”
Lewis é e deve continuar a ser nossa referência contemporânea
para sabermos o que é verdadeiramente rosacrucianismo. Quanto a este fato,
suponho, deve existir um indiscutível consenso.
E se assim for, não são a fé ou as crenças que temos que
devem guiar nosso comportamento e pensamento, mas a CONFIANÇA em experimentos
que mostram que as técnicas rosacruzes funcionam.
Experimentos e fatos demonstráveis.
Sim, podemos sentir em nossos ossos que certos axiomas
esotéricos são verdadeiros sem que tenhamos provas externas disto. Ato
contínuo, no entanto, devemos ir em busca da demonstrabilidade desses axiomas,
de experimentos que os comprovem e consolidem sua realidade.
Ciência é buscar tornar real aquilo que sentimos na
alma que deve ser real. Antes que isto ocorra, no entanto, nossas
crenças são, como o nome diz, apenas crenças, sem a sustentação dos fatos, o
que não quer dizer que tenham menos valor para nós, mas que devemos cuidar com
carinho e prudência e não querer arrogantemente que o mundo não iniciático
aceite nossas afirmações sem ceticismo.
Em nome do bom rosacrucianismo, e considerando que Renée
Descartes era membro de nossa ordem, o ceticismo cartesiano deveria estar
primeiro em nós, e não naqueles que não são iniciados em nossa sublime fraternidade.
E o que vemos em nosso meio? Discutimos crenças, narrativas,
somos estudantes não de fatos demonstráveis, mas de ideias.
Nada contra. Só que uma coisa é uma coisa e outra coisa é
outra coisa.
Por isso é desperdício de tempo e pura retórica falar em diálogo
com a ciência sem que tenhamos sério empenho em produzir condições
experimentais que sejam passíveis de serem usadas nesse diálogo.
Da mesma forma que os rosacruzes não são obscurantistas ou
contra a ciência, da mesma maneira a ciência não é contra nós.
O que ela espera, e nós deveríamos abraçar esta posição, é
que apresentemos alguma coisa palpável, compartilhável, testemunhável por
muitos, independente de nossa mera e simples fé.
A fé como conexão com o divino, no eixo vertical, pode e deve
ser estimulada como uma virtude. Já no relacionamento estre pessoas, no eixo
horizontal, deve ser substituída pelas ideias fundamentadas em fatos e
demonstrações.
E se existem poderes verdadeiramente incomuns que sejam
demonstrados e que abandonemos esta época das narrativas sem provas e passemos,
finalmente, a um período de “contar e mostrar”, como se faz nas escolas
primárias dos estados unidos.
Como a afirmação de que existem livros em cavernas secretas,
em algum lugar inacessível do Himalaia. Ou que certas coisas não devem ser
reveladas porque são extremamente perigosas “no atual estágio de evolução da
humanidade”.
Sinceramente o homem sempre foi, e infelizmente por algum
tempo ainda será um indivíduo perigoso, para outras espécies e para si mesmo,
tendo ou não acesso a esses ditos “delicados conhecimentos ocultos”.
O conhecimento revelado, já disponível, é suficiente para realizar
grandes estragos no tecido social e na civilização.
Pra terminar, tenho Fé que este texto seja profético, e que
até aqueles que tem escondido coisas entendam que precisamos começar a revelá-las,
precisamos compartilhar informações e fatos, pelo menos entre os chamados “iniciados”,
já que nem entre estes últimos os fatos são uma mercadoria abundante.
Ciência não é opinião ou crença.
Ciência é conhecimento baseado em evidências.
Livros secretos e ocultos, que não podem ser lidos por
ninguém, são absolutamente inúteis.
Da mesma forma que é inútil uma crença que não se sustenta
em fatos.
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