Multi pertransibunt et augebitur scientia (Muitos passarão, e o conhecimento aumentará).

quarta-feira, 29 de julho de 2015

CONEXÃO

por Mario Sales,FRC,SI


Por definição, eu sou um intelectual, um teórico, alguém afeito aos textos e às interpretações destes textos. O pensamento do intelectual se alimenta de informações e dados e conceitos que ele articula com o intuito de descrever panoramas e paisagens do mundo que o cerca de acordo com seus pressupostos de base.
Sim, como lembrava Kant, todos nós partimos de idéias a priori, convicções, que nos levam a traçar um caminho próprio em meio às informações, as quais estão à disposição de todos, de uma forma peculiar e única.
Mesmo terreno, mesmo relevo, estratégias de caminhada diferentes.
Contemplando a realidade, os pensadores acabam, não por descrevê-la com fidelidade, mas sim por interpretá-la.
Embora a ciência positivista nos fale de conhecimento fundamentado em fatos, nem toda fundamentação existente pode livrar o homem de ciência da intromissão, indesejada, mas inexorável, inevitável, de sua própria subjetividade.
Assim, belos discursos muitas vezes ocultam apaixonadas convicções. A lógica se oferece como auxiliar tanto para os bons quanto para os maus.
Posso argumentar com precisão a favor ou contra a tirania, dependendo de minhas convicções, as quais estão lá, a priori, dentro de mim, antes do discurso, antes da argumentação.
Os campos de concentração nazistas de Auschwitz-Birkenau são um exemplo da lógica e da organização a serviço do mal, da destruição e da morte.
Por isso o intelecto é chamado de “A Falsa Luz”, aquela que brilha sem calor e sem vida, a luz artificial.
Os valores espirituais, entretanto, são mais profundos e confiáveis, e muitas vezes geram discursos óbvios, aparentemente sem nenhuma originalidade, mas refletem uma realidade muito mais confiável e estável que as miríades caleidoscópicas do intelecto.
Portanto, é preciso ter cuidado com o intelecto, principalmente quando se é um intelectual.
É preciso não se deixar arrastar pelo Ego e não se fascinar pela própria eloquência, confundindo a lógica interna de um discurso com a realidade a qual ela se refere.
Há muito tempo conheço esta ilusão.
E por isso mantenho meu discurso na coleira da espiritualidade, e embora ele ladre e rosne às vezes, está sob o controle desta.
Não tenho mais o prazer que tinha quando jovem da polêmica pela polêmica, de discutir exaustivamente sobre qualquer coisa apenas por exercício. Se me empenho em um debate isto tem a ver com motivos mais elevados, a defesa de valores espirituais ou morais, mas não opiniões pessoais.
Não me importo mais com a vitória ou a derrota em contendas orais, ao gosto da Ágora de Atenas e dos Sofistas. Nada disso me atrai ou me dá prazer.
Aliás, não busco outra coisa na existência que a serenidade, este bem tão precioso quando difícil de ser preservado.
Às vezes, a serenidade lembra a água que enche nossas mãos, na pia, enquanto fazemos nossa higiene matinal, e que nos ajuda a lavar o rosto, mas, ao mesmo tempo escorre pelos dedos. Para que consigamos nos refrescar e terminar as abluções, enchemos as mãos mais de uma vez no fluxo de água da torneira, e a água torna a escorrer e a escapar de nós, por mais que façamos para retê-la.
A verdade é que o frescor da água é diretamente proporcional ao seu fluxo e se a água que colocamos nas mãos não escorresse e não fosse substituída por outra porção mais fresca, seu efeito benéfico se esmaeceria em pouco tempo. A água , quando estagnada, tende a perder seu frescor, e apodrece.
Talvez este seja o segredo da serenidade, não algo a conseguir e reter, mas uma determinada qualidade de fluxo de eventos a manter. O espírito é fluido e ágil e o intelecto, mecânico e lento. O espírito plana e voa no espaço e o intelecto precisa do solo para se deslocar. O intelecto se apoia em alguma coisa que ele chama sólida enquanto o espírito e as coisas do espírito flutuam, e fluem, ininterruptamente.
É, portanto, característica da vida serena, o fluxo constante, com leves oscilações de velocidade ou de intensidade, mas constante. Não como uma torneira, que em si já é uma imagem ligada a razão, mas como um riacho, ao qual, mesmo as gotas que caem de nossas mãos retornam e pelo qual são reaproveitadas.
O ciclo da economia Universal é fechado, e é dentro dele que sempre estaremos. Nada possuímos, porém de tudo desfrutamos, por um tempo, nada mais.
Tudo que existe flui por nossas mãos, não é nosso, não vem de nós, mas passa por nós.
Assim, também as idéias que atravessam nossa mente não são nossas, e isto é que o Ego não consegue suportar.
Ele, pela sua própria função individualizadora, precisa supor-se criador daquilo que recebe por captação, e não por elaboração solitária.
Refletir sobre algum conceito, mais do que acessar nossa memória e nosso próprio raciocínio, é entrar em sintonia com a mente universal e dela extrair imagens e noções que sozinhos, não conseguiríamos.
E tudo isto dentro do alcance de nossa consciência, que equivale ao alcance de nosso rádio. Só podemos ouvir estações que nosso rádio interior possa captar.
É este senso de pertencimento à Consciência Cósmica que o rosacruz deve desenvolver. Ele nos fortalece, diminui nossa solidão e insegurança. Uma vez que tal compreensão se estabeleça, perceberemos que nunca estamos sós, e por isso, no Salmo, Davi diz que antes que ele ore, Deus já sabe o que vai em seu coração (salmo 139,versículo 4).
Quando oramos, não falamos para Deus, mas para nós mesmos.
Ouvimos nossa prece no intuito de organizar nossos sentimentos, nossas angustias, mas antes que o fizéssemos, o Altíssimo que tudo sabe, já conhecia nossas necessidades e já elaborava soluções para nossos problemas.
Conexão é o objetivo fundamental de todos os místicos, independente de sua linha, de sua cultura.
Ao fim e ao cabo, é só o que importa.

domingo, 26 de julho de 2015

MAYA, ESTA INJUSTIÇADA.

Por Mario Sales, FRC, SI



Domingo frio e eu aqui me distraindo com o resumo da Doutrina Secreta de Michael Gomes, (ed. Pensamento), relendo conceitos teosóficos, de modo mais claro do que nas páginas infernais da edição brasileira da Doutrina Secreta, de 1977, da mesma editora.
Lá pelas tantas, releio os comentários de Blavatsky sobre a 4ª sloka do Livro de Dzyan, discutindo a noção de Maya.
Diz ela: “Maya ou Ilusão é um elemento que participa de todas as coisas, pois tudo que existe tem apenas uma realidade relativa e não absoluta. (...) À medida que nos vamos elevando na escala do desenvolvimento percebemos que, nos estágios já percorridos, havíamos tomado sombras por realidade e que o progresso ascendente do Ego é um contínuo e sucessivo despertar, cada passo à frente levando consigo a ideia de que, então, alcançamos a “realidade”. Mas só quando tivermos atingido a consciência absoluta e com ela operarmos a fusão da nossa, é que iremos libertar-nos das ilusões produzidas por Mâyâ.[1]
Minha filha mais nova definiria este trecho como “prestar tanta atenção ao gol que esquecemos de admirar o drible, a jogada”.
Existe um grave equívoco nesta avaliação de Mâyâ, que, sejamos justos, Blavatsky não criou, mas apenas repetiu.
O problema não está em Mâyâ ser real ou ilusória, mas sim, e este deveria ser o questionamento central, a confusão que o Ego faz, por ignorância, entre o que é real e ilusório.
E considerando a afirmação de que “ tudo que existe tem uma realidade relativa”, usada pela própria Blavatsky, é preciso estabelecer por que existe esta realidade ilusória e relativa.
Pensem no seguinte exemplo comparativo: imaginem um laboratório de biologia. Nele, cientistas simulam condições artificiais para estudar fenômenos da natureza. O laboratório ajuda o trabalho de investigação e compreensão dos fenômenos, em condições controladas. O laboratório não é o “mundo real”, mas serve de maneira satisfatória ao propósito para o qual foi construído. Ele, laboratório, tem, pois, um papel importante a desempenhar, o qual transcende a mera questão de ser ele a Natureza mesma ou um simulacro artificial desta Natureza, já que “toda realidade é relativa”.
Toda crítica a Mâyâ parte de um falso pressuposto, de um falso problema, de uma falsa questão, qual seja se ela é real ou ilusória.
Que ela não é real todos sabemos, mas sua artificialidade em nada diminui sua importância funcional como ambiente de experimentação e estudo, da mesma forma que o cinema e o teatro são constituídos de ilusões, ou são uma ilusão em si, mas mesmo assim, nos divertem e provocam em nosso espírito real, reflexões emocionais reais, muitas vezes profundas, sobre a natureza da vida e da existência.
Ninguém diz, em sã consciência, depois de pagar para entrar em uma sessão de cinema, para ver um filme, a seguinte frase:
“Quero me libertar deste filme, desta ilusão cinematográfica, quero sair desta sala aonde entrei voluntariamente pagando a minha entrada”
Ou então:
“Quero parar de me divertir com este espetáculo de luzes e cores, e voltar para a “realidade” sem graça lá fora. ”
Tal coisa não faria o mínimo sentido.
Mesmo assim, ouvimos a frase: “Quero me libertar de Mâyâ ”, como se Mâyâ fosse o problema, e não o equívoco de confundir real com ilusão.
Não é a ilusão em si que nos prejudica, desde que saibamos que é uma ilusão, e a usemos para nosso prazer e educação. O que nos afeta negativamente é a falta de consciência de que este é um importante ambiente experimental, extremamente rico e complexo, do qual devemos usufruir, e com o qual podemos até nos confundir desde que, como experiência estética, na qual imergimos para melhor desfrutá-la, a ponto de pularmos da cadeira no cinema, com o susto de cenas fantasiosas de terror ou vibrarmos com o heroísmo de personagens inexistentes no mundo dito real.
No período de duração daquele filme ou da peça que estamos assistindo, é normal que concedamos aos mesmos status de realidade, de forma a experimentarmos as emoções que eles nos provocam.
Estas emoções, estas experiências emocionais, são o que verdadeiramente importa.
Maya tem, pois, enquanto ilusão, um papel a desempenhar em nossa, assim chamada, vida real.
Julgá-la boa ou má apenas por sua conhecida artificialidade é ser no mínimo, simplista intelectualmente na compreensão de sua verdadeira função.




[1] “A Doutrina Secreta” resumida e comentada por Michael Gomes, Ed. Pensamento, pág.39

domingo, 12 de julho de 2015

JACOB BOHEME E OS SABORES DA CRIAÇÃO

por Mario Sales, FRC
revisto e corrigido, generosamente, por Americo Sommermann, a quem agradeço


TRABALHO APRESENTADO NA CONVENÇÃO REGIONAL ROSACRUZ DA SP3, DIA 11 DE JULHO DE 2015






Este ensaio é baseado nas duas publicações nacionais de Aurora Nascente, uma pela Editora Paulus, e outra pela Editora Polar.





O COMPARTILHAR DE IDÉIAS


São duas as formas de compartilharmos um conhecimento: mostrar e descrever.



Quando mostro, estou diante de um objeto ou imagem, e outros comigo, e teoricamente basta que os outros olhem para o objeto para ver o que eu vejo.



O curioso é que, quando duas pessoas diferentes olham para o mesmo objeto, por exemplo um quadro que tenhamos pintado, teremos dois olhares diferentes do mesmo objeto. O que implica que às vezes, precisamos ao mesmo tempo que mostramos, descrevermos o que mostramos, já que a compreensão modifica a visão e melhora o olhar.












Ora, se diante de uma coisa que eu mostro, podem haver divergências de compreensão do que se contempla, imagine quando descrevemos algo; ou, pior ainda, se o descrevemos, escrevendo.


Descrevemos o que não podemos mostrar.


Tudo a partir daí fica mais complexo.

Como mostramos a outros, algo invisível? Como explicamos a outras pessoas um conceito ou uma idéia que elas, em princípio, não conhecem?

De modo geral, lançamos mão de comparações e associações para que, pouco a pouco, façamos com que o interlocutor visualize, mentalmente, a forma e o conteúdo da idéia que queremos transmitir.

Desafortunadamente, descrições são feitas no ambiente de um idioma, de uma língua. 


E as limitações da fala estão, da mesma forma, na escrita.


O texto só revela o que pode revelar, e por isso recorre a comparações.

Se minha intenção é realmente facilitar a compreensão à outro, manda a boa didática que eu use comparações com coisas que lhe sejam familiares, cotidianas, o que dá conforto à mente e diminui nossa ansiedade em compreender. 





Explico algo desconhecido comparando-o com coisas conhecidas o que facilita a exposição e a transmissão da idéia, independente das imprecisões que possam decorrer deste método. Esta é a maneira mais antiga e mais usual, em todas os povos da humanidade, de explicar coisas. E todos nós a usamos com frequência.
Acredito que com Jacob Boheme foi semelhante.

Em 1589 seus pais o levaram a um sapateiro para que ele aprendesse o ofício. Uma vez, estando a cuidar sozinho da loja, um estranho entrou e perguntou pelo preço de alguns sapatos. Boehme, notando um olhar extraordinário no estranho, disse não saber dos preços dos sapatos, mas o estranho, antes do que procurar o sapateiro, disse a Boehme que, embora ele fosse de baixa estatura, se tornaria grande entre os homens e "causaria muita admiração no mundo". Advertindo Boehme para que permanecesse fiel ao seu voto original, o estranho desapareceu tão misteriosamente como havia surgido. (http://www.levir.com.br/inst-037.php)


Ele passou por quatro episódios de Iluminação Divina.

Casa de Jacob Boheme

A primeira iluminação, manteve-o em êxtase por sete dias. Ele mesmo descreveu a experiência da seguinte maneira:


"Eu vi o Ser de todos os Seres, a Superfície e o Abismo; vi também o nascimento da Santa Trindade; a origem e o primeiro estado do mundo e de todas as criaturas. Vi em mim mesmo os três mundos - o mundo angélico ou Divino; o mundo das trevas, 


a origem da Natureza; 


e o mundo externo, como uma substância manifestada dos dois mundos espirituais.... 


No meu interior vi isto muito bem, como em uma grande profundidade; pois vi diretamente no caos onde tudo permanece envolto, mas não pude fazer revelação alguma. De tempo em tempo tudo isto floresce em mim como o crescer de uma planta. Por doze anos guardei tudo comigo, antes de poder manifestar de alguma forma externa. Até então isto abateu-se sobre mim, como uma carga que mata o que atinge. 


Escrevi tudo o que pude exteriorizar. (o grifo é meu) A obra não é minha. Não sou mais do que um instrumento do Senhor, com o qual Ele faz o que deseja".

Sua segunda iluminação, (segundo Américo Sommerman relata no texto de apresentação de Aurora Nascente) Boheme a experienciou "em 1600, aos 25 anos, quando recebeu um dom de visão através do qual podia ver a natureza mais íntima de todas as coisas que estavam à sua volta. 




Não falou a ninguém da Luz que recebera, nem do profundo conhecimento de Deus e da Natureza que agora tinha."
E continua o relato:



"Sua terceira iluminação" foi "em 1610 (...), mediante a qual, aquilo que, nas duas vezes anteriores, vira fragmentariamente, revelou-se como uma unidade, possibilitando-o ver a Ordem divina da Natureza."



"Em 1612", continua mestre Sommerman, "para não esquecer o que vira, pôs-se a escrever seu primeiro livro: A Aurora Nascente!


"Em 1619 teve sua quarta iluminação, com a qual a unidade do conhecimento dos mistérios de Deus, do Homem e da Natureza, que despontara em 1610, atingiu o dia pleno (...).








Ora, imaginem alguém que vive no século XVII, tentando primeiro compreender e depois descrever em texto quatro experiências místicas desta magnitude, para si mesmo e para outros.

Que outra maneira de o fazer senão recorrendo aos elementos de comparação do cotidiano mais imediato?
E quais seriam estes elementos? Coisas peculiares da Alemanha do século XVII: o alimento e a bebida daquela época e da região; aspectos da luz natural do Sol e das estrelas; sons e tons da Natureza; o fluxo das águas nos córregos; as árvores, suas raízes, galhos, seus frutos e a dinâmica com que esses frutos e árvores interagiam com as intempéries e os processos biológicos, a maturação e a putrefação dos frutos, dos vegetais, seus gostos, sua cor.








Não se esqueçam, era uma sociedade rude e primitiva, uma Alemanha ainda sem as tradicionais batatas, já que "no final do século XVI já existiam batatas na Alemanha, (mas) só como belas plantas ornamentais nos jardins dos mais abastados. O verdadeiro valor deste tubérculo só foi descoberto nas regiões sul e oeste da Alemanha durante a guerra dos 30 anos (1618-1648)"[1]


No século XVII, na Alemanha de Alt Seidenberg, ou Velho Seidenberg, não existe telefone, telégrafo, rádio, televisão ou cinema. Não existe celular ou internet, muito menos energia elétrica.

As casas são iluminadas por toscas lamparinas. As ruas estão sempre cheias de lama e os excrementos dos pinicos dos moradores das casas são atirados sem pudor pelas janelas durante a faxina diária. Os porcos, animais fundamentais à dieta local, são criados livremente, nas ruas.
Banheiros só para os abastados; não existe, de modo difuso, saneamento básico; as latrinas são apenas buracos fundos no chão.


Ouçamos Amélia Polónia, que em "Reflexões sobre alguns aspectos da Vida Quotidiana do séc.XVI e XVII"[2], diz, em certo trecho:

"É sabido que, no século XVI, como de resto(...), a religião é omnipresente na vida das comunidades europeias. Ela delimita o espaço com sua divisão entre o sagrado e o profano, e marca o tempo: a comunidade rege-se pelo toque dos sinos que divide o dia em funções litúrgicas.
À falta generalizada de relógios, públicos ou privados (o relógio é, ainda, um bem de luxo a que só os mais abastados podem aceder), o sino orienta a vida de toda a comunidade. E não marca só o ritmo do dia. Marca também os momentos festivos (os nascimentos e casamentos, as entradas nas vilas ou cidades dos reis ou grandes personalidades), como os momentos de pesar (mortes, incêndios ou perigos de invasão)".
Estamos, portanto, em uma época de pouca tecnologia e muita arte.



É neste ambiente que Boheme se consolida como um artesão dos calçados, habilidade que naquela época em nada poder-se-ia chamar de "humilde".
Prova disso é que ele tem amigos importantes: o pastor mor e o médico da Cidade frequentam sua casa.
Ainda assim, é um mundo de atraso e carências de toda espécie, e é nesta realidade limitada que ele descreverá suas profundas experiências, e lançará mão das imagens mais familiares possíveis, a si mesmo e a todos, para descrever as complexas visões a que teve acesso.
Destas visões e conceitos que ele descreve em Aurora, talvez o conjunto mais importante seja as chamadas Qualidades ou Forças de Deus.
Trata-se de uma idéia extremamente refinada e sutil.

Ele propõe que existem certas Particularidades ou Qualidades, segundo sua visão, que interagem para determinar as muitas manifestações da criação, assim como alguns pedaços de vidro criam centenas de milhares de combinações de imagens em um caleidoscópio.
Esta é uma compreensão comum a todos os pensadores, místicos ou filósofos, e mesmo aos físicos. O Universo, com tudo que existe, manifesta sua complexidade através da combinação de uns poucos elementos.
Cabalistas falam de 10 sefirot somadas a 22 letras que constituem os 32 caminhos ou elementos básicos componentes da Criação.


Os químicos falam que tudo que existe resulta da combinação de 118 tipos de átomos em sua periódica tabela.




Físicos falam que nestes 118 átomos, podemos identificar partículas ainda menores, no núcleo, com seus nêutrons e prótons, e dentro dos prótons quarks, e ligando os quarks, múons. 




Falam também de quatro forças, a gravidade, a eletromagnética, a nuclear forte e fraca, as quais, juntas, mantém a integridade do Cosmos.
No século XVI e XVII dos sinos e dos dias lentos e arrastados, as forças que Jacob Boheme descreve são também sutis e invisíveis e, igualmente, fundamentais.



Em Aurora são em número de sete estas forças, (ou qualidades, ou particularidades, ou formas, ou espíritos, ou fontes, ou espíritos-fonte ou espécies):
1.a adstringente,
2.doce (ou água suave),
3.amarga, (ou aguilhão, ou aguilhão amargo)
4. calor (ou fogo ou quente),
5.amor (ou luz),
6.som (ou tom ou mercúrio), e por último,
7.corpo (ou natureza ou corporalidade ou naturalidade ou tangibilidade ou substancialidade).




Nos livros seguintes ele descreverá a 2a força que em Aurora é Doce, como Amarga, e a 3a, que em Aurora é Amarga, como Angústia.



O conjunto dessas forças é chamado Salitre, (o nome de um nitrato fertilizante da agricultura) o meio ambiente resultante da interação entre elas. 



Em outro arranjo, Boehme, pródigo em modificar suas afirmações sem piedade, chamará Salitre não ao conjunto das forças, mas à sétima força, já que a corporalidade, a substancialidade está manifesta no Salitre. Ele, Salitre, é o corpo da Criação.
Em uma palestra na Loja Rosacruz Guarulhos, Américo Sommerman citou que de todos os livros de Jacob Boehme, Aurora Nascente é aquele que tem foco mais intenso na criação material e na Natureza, sendo que aos outros livros foi deixado o papel de descrição do mundo espiritual. Aurora descreve a Natureza, desde aquela Celeste até a terrestre, como a vemos e desfrutamos, além de sua dinâmica íntima em detalhes, como só o dom permitia a Boheme enxergar.
Em Aurora, Boheme descreve detalhadamente essas sete qualidades ou forças, no oitavo capítulo, a partir do item 15.







Diz ele: "Olha: Aqui devem ser notadas separadamente sete espécies de qualidades ou particularidades. Em primeiro lugar, ...há a qualidade ADSTRINGENTE (ou SALGADA) que é uma qualidade radical (da raiz da criação) e da essência íntima, uma aguda, penetrante e acerba (ou seja ácida, áspera) e compactante compressão no salitre, que engendra a Dureza e o Frio. E quando a qualidade ADSTRINGENTE é inflamada, produz uma acerbidade (uma acidez) semelhante ao Sal."


FORÇA ADSTRINGENTE: CETRÍPETA

Ora, se transportamos a descrição de Boheme para nosso século, a expressão que me vem a mente é "Força de Coesão". 



Se existe, como ele diz, "dureza" no Salitre, ou de outra forma, Densidade no Universo, é por conta desta Força de Coesão que ele chama ADSTRINGENTE. E ele detalha: dura e fria, ou seja, a rigidez é garantida pela baixa temperatura numa notável antecipação mística da compreensão moderna físico-quimica de que o Calor provoca a instabilidade das ligações moleculares, tornando todas as coisas a ele submetidas, menos rígidas e no limite, líquidas. Por isso, a força ADSTRINGENTE é "DURA e FRIA" em si.
A expressão "inflamada" presente na descrição de Boheme, a meu ver não deve ser confundida com "incendiada". Boheme usa o termo no sentido de aumento de energia da força, já que ele as caracteriza em benévola ou malévola segundo sua manifestação, que pode ser serena ou agitada.
É nesse sentido que ele continua a descrição:
"Essa qualidade (ADSTRINGENTE) é uma forma ou uma fonte de cólera no salitre (salitter) divino. Quando ela é inflamada (o que pode ocorrer por um grande movimento, uma violenta exaltação ou uma excessiva reação) então um grande frio qualifica-se ali dentro, e ele é mordente e completamente acerbo, semelhante ao sal, ou duro e muito compactante semelhante às pedras."
Não há, aqui, nenhuma dúvida. O termo "inflamar" antes de nos remeter a um sinônimo de "incendiar", quer aqui significar "estímulo intenso", semelhante ao estímulo da energia elétrica que faz o liquidificador, antes quieto e morto sobre a pia, funcionar.
Faz sentido que estimulada, a força ADSTRINGENTE gere, não só dureza por aumento da coesão, "semelhante às pedras", mas também "grande frio", pois quanto mais duro é o elemento, menos calor existe nele.
Para Boheme, esta dureza tem a ver com o mundo terreno, o mundo da densidade, ou de Lúcifer, já que só aqui na Terra a força ADSTRINGENTE foi "acesa" ou "inflamada"(no sentido de intensificada) por Lúcifer, de forma que, por causa deste estímulo, "ela ainda arde e arderá até o Juízo Final".[3]
A força ADSTRINGENTE é, pois, uma Força de Coesão, incorporando em seu conceito quaisquer forças na natureza que possibilitem a integridade estrutural dos corpos do universo.



É fácil, eu suponho, agora entender que é graças a qualidade ou força ADSTRINGENTE que no céu ou na "pompa celeste"[4], ocorra o surgimento da forma do corpo celeste, onde antes existia apenas energia pura. E ele continua sua descrição: " Pois (esta força) é a compactação, conglomeração ou formação de uma coisa, por isso é a primeira qualidade e um início das criaturas angélicas, de todas as configurações que estão no céu ou neste mundo, e de tudo o que possa ser expressado ou nomeado."[5]




O cuidado de Boheme de estender sua descrição da força ADSTRINGENTE a coisas do céu e da terra, mostra uma vez mais que em AURORA NASCENTE, sua preocupação é expor o funcionamento da criação, e se cita coisas do céu, cita-as no intuito de mostrar que a Ordem Divina funciona em todos os planos, não só no chamado plano material, e que existe uma densidade a considerar em todos os corpos, sejam sutis ou grosseiros.




A segunda qualidade ou particularidade é a qualidade DOCE que "opera na qualidade ADSTRINGENTE", tempera-a e torna-a completamente agradável e suave."




"(...)  Tens uma similitude disso numa maçã" diz Boheme, comprovando minha tese de que baseia o didatismo de sua explicação nos recursos naturais e nos alimentos da Alemanha do século XVII." No início", continua ele, "ela (a maçã) é adstringente ou azeda, mas quando a qualidade DOCE se eleva e apodera-se dela, então torna-se completamente agradável e boa para comer".
E então ele conclui:" É assim que ocorre na força divina; pois quando se fala na misericórdia de Deus Pai, fala-se de Suas forças, de Seus espíritos fonte, das qualidades que existem no Salitre, das quais Seu mais amável Coração ou Filho é engendrado", numa aparente alusão ao Cristo, homem Deus, surgido no mundo, no Salitre, mas pleno de qualidade DOCE, intensa, que venceu a rigidez (ADSTRINGÊNCIA) deste mundo, temperando-o com sua presença, e derrotando assim, com sua doçura, a acidez, ou acerbidade.



É com uma singela maçã que Boheme resume, portanto, a complexa luta de duas forças fundamentais da Criação.
Mas ele não é um escritor fácil. No item seguinte, (23) na mesma página em que se lê o trecho acima, a mesma palavra, coração, aparece com outro sentido inteiramente diferente, diferença da qual se suspeita pelo contexto e pelo fato de que, no item anterior, quando se refere ao Cristo, coração está escrito com C maiúsculo e aqui, neste item seguinte com c minúsculo. Lá ele se refere ao "Seu mais amável Coração ou Filho", num indicativo de que Jesus é uma extensão da Divindade.
Aqui, no item 23, ele escreve; "Presta atenção aqui. A qualidade adstringente é o coração (com c minúsculo) ou núcleo da força divina" numa referência a natureza essencial da qualidade ADSTRINGENTE na possibilitação da existência das formas de todas as coisas. Já a "qualidade DOCE (é) o calmante e a calidez que faz com que a qualidade acerba e fria ou ADSTRINGENTE se relaxe e se torne delgada e branda, de onde a água tem sua origem."[6]
O Cristo é Homem e Deus: Homem no corpo e Deus em espírito. Diz Boheme: "(Adstringente e Doce) Essas são as duas qualidades das quais o Coração (com C maiúsculo) de Deus ou Filho de Deus (confirma ele) é engendrado.



Aqui é bom ressaltar: como o Cristo é a resultante de duas forças antagônicas, tudo na Criação, no Reino Divino ou no Reino de Lúcifer também é resultante da interação das sete Forças ou Qualidades. Forças são elementos básicos. Isoladamente não existem, não se manifestam ou provocam manifestação. É preciso que interajam entre si para que o Mundo, como o conhecemos, o Lebenswelt ou Mundo da Vida, surja.
Por isso, em nós, seres humanos, existe a "tenebrosa obscuridade"[7] ao lado de uma "luz transbordante, móvel e cálida"[8]. Temos dentro de nós, apenas para que possamos existir, o Céu e o Inferno.




É a qualidade DOCE ou ÁGUA SUAVE, que vai temperar e modular o encontro entre as qualidades ADSTRINGENTE E AMARGA, a próxima que examinaremos. Esta ÁGUA, que é a ÁGUA CELESTE, e nada tem a ver com a água comum dos rios, que BOHEME chamará de ÁGUA ELEMENTAL, esta ÁGUA CELESTE terá o poder de desfazer a dureza da força ADSTRINGENTE, tornando-a delgada e maleável.
Muito mais poderíamos especular e trabalhar em cada uma destas Qualidades, mas não temos tempo.








Passemos a Terceira Qualidade, talvez aquela que tenha se tornado para mim a mais divertida. Diz Boheme: "A Terceira qualidade ou o terceiro espírito de Deus na força do pai é a qualidade AMARGA. Ela é penetrante, é o ímpeto das qualidades DOCE e ADSTRINGENTE, é vibrante, pungente e ascendente."[9]
Aqui, farei um pequeno parêntese para uma reflexão. Existem exegetas que supõem que a erudição sempre traz a iluminação. Na exegese de textos místicos, precisamos menos da erudição do que da simplicidade de espírito, que aqui não deve ser confundida com mediocridade.
Simplicidade aqui refere-se a passagem de Mateus 19:14 que diz: "Jesus, porém, disse: Deixai as criancinhas, e não os impeçais de vir a mim; porque delas é o reino dos céus." Ou seja, interpretar textos esotéricos requer o olhar da inocência. Fim do parêntese.



Seguindo este protocolo, quando li o nome AMARGA, imediatamente tentei pensar em algo amargo, como por exemplo o Jiló, para tentar entender a imagem.
E imediatamente instalou-se um conflito: a descrição de Boheme da qualidade AMARGA em nada e por nada lembrava a experiência de comer um jiló. Diz ele: "...a qualidade AMARGA é penetrante e conquistadora, pois se eleva e triunfa nas qualidades ADSTRINGENTE e DOCE."
E continua:" Ela é a fonte da alegria ou a causa do riso". Pensei: como um jiló pode ser fonte de alegria ou causa de riso? A experiência de comer um jiló ou algo amargo em si beira o desagradável, insulta o paladar, a não ser que combinemos seu sabor e o diluamos em outros temperos.
O Amargo em si não pode gerar alegria pois, não por outra razão, a tristeza, um sentimento ruim, é descrita como algo de gosto amargo.
Por dois dias pensei e meditei sobre isso, e súbito, a caminho do trabalho, fui tomado por uma epifania: Boheme era alemão.
Na Alemanha do séc XVII como na do século XXI, existe sim um gosto amargo que é "penetrante, ...fonte de alegria ou causa do riso" além de poder-se dizer que "pelo triunfo (desta) qualidade amarga, uma coisa rejubila-se e estremece de alegria e é disso que resulta a alegria celeste".
Ora, ficou cristalino para mim que o modelo profano e prosaico do conceito da qualidade AMARGA, e de sua capacidade em elevar o espírito e o coração do homem à uma condição vibrante, crepitante, ..., um triunfo e alegria" é a CERVEJA, talvez a bebida mais alemã do mundo.


Usando esse modelo tudo fez sentido. Foi, na minha humilde opinião, a partir deste mote que ele descreveu esta qualidade, dizendo :"A qualidade AMARGA é temperada ou abrandada na qualidade DOCE, que a torna amável e jovial; mas se ela se eleva em demasia e se agita até inflamar-se ( o que ocorre no excesso e na embriaguez) então põe fogo nas qualidades DOCE e ADSTRINGENTE, e torna-se semelhante a um veneno ardente (palavra de Boheme), picante e dilacerante, como quando um homem tem um tumor pestilencial que faz com que grite de dor."[10]
É óbvio que não estou afirmando que a qualidade AMARGA é a CERVEJA alemã. Só ressalto que provavelmente, o modelo didático de Boheme para descrição de sua refinada visão recorreu a esta cotidiana bebida de Alt Seidenberg, pois não se explica o Complexo pelo mais Complexo, mas sim o Complexo pelo Simples. Até para ele, Boheme, suas visões eram altamente esotéricas e não fosse ter recebido seu conhecimento através da experiência direta, jamais teria compreendido o que levou toda a vida para explicar e descrever, já que não havia como mostrar.
Se eu não acompanhasse seu trajeto, dentro de sua época e de seus valores e hábitos, com certeza, essa é a minha tese, aquele que alguns dias atrás era para mim o mais obscuro dos autores místicos, não teria se transformado no mais humano deles. Se essa técnica me foi útil acredito que possa sê-lo para todos.


FORÇA AMARGA: CENTRÍFUGA


A qualidade AMARGA, assim, é a mais divertida. Em doses terapêuticas, digamos desta forma, ela exalta o espírito e expande a consciência e a existência. Em doses excessivas, ou para falar como Boheme, inflamadas, torna-se "o violento Fogo infernal; então extingue a Luz...um sofrimento, uma casa de tristeza, uma morada das trevas, da morte e do Inferno, um fim da alegria..."[11]
Boheme ainda descreve que a qualidade AMARGA "é o primeiro espírito de onde a mobilidade tem sua origem, de onde a vida torna-se móvel"[12]
O senso comum pensaria no CALOR, próxima qualidade, como fonte do movimento, mas não estamos falando de leis da física ortodoxa, embora não devamos nos esquecer delas. Por isso, ao contrário de nossa intuição, é na particularidade AMARGA que Boheme identifica esta característica de "tornar a vida móvel" fazendo mais esotérica sua apreciação e assimilação conceitual. Algo a meditar.



Essas três forças inicialmente vistas, a ADSTRINGENTE, a DOCE e a AMARGA, são "...as três espécies ou qualidades (onde) reside o ser criatural ou o corpo de todas as criaturas do Céu e neste mundo, seja anjo, homem, animal, pássaro, seja qualquer espécie, qualidade e forma de vegetal, tanto celeste quanto terrestre, como também todas as cores e configurações."
O Salitre, ou a Criação, é descrita por Boheme em um de seus textos como a soma dessas três qualidades ou forças, as quais garantem a corporalidade de tudo que existe.

Daí em diante ele descreverá as qualidades mais sutis e íntimas da Criação. Se as três anteriores ADSTRINGENTE, DOCE, AMARGA, representam o corpo, as próximas 3 representarão o espírito das coisas, seu conteúdo.





Começaremos pela quarta qualidade, ou particularidade, ou espírito fonte, que Boheme nomeou de CALOR.
Diz ele:"(O CALOR) é o verdadeiro início da vida e o verdadeiro espírito da vida. As qualidades ADSTRINGENTE, AMARGA e  DOCE são o Salitre, que corresponde ao corpo. ... e o calor é o espírito ou a inflamação (leia-se ENEGIZAÇÃO) da vida, pelo qual o espírito se faz no corpo, move-se em todo o corpo, brilha fora do corpo e produz um movimento vivificante em todas as qualidades do corpo".




Minha tentação aqui era traduzir a propriedade ou qualidade CALOR, pelo termo ENERGIA, pois naquela época, o conceito energia não existia e para representar as forças do universo, usava-se costumeiramente a palavra relâmpago, para uma descarga de energia súbita, ou Fogo, para representar uma energia mais estável e persistente, como demonstrei alguns anos atrás em um trabalho, disponível no Blog na área de Textos Martinistas, sobre o EIXO FOGO CENTRAL INCRIADO, que traduzido para uma linguagem contemporânea seria ENERGIA (FOGO) DIVINA (INCRIADO) ESSENCIAL (EIXO CENTRAL) ou NOUS, mas foi chamada Fogo porque era assim que se falava na época, séculos XVI, XVII e XVIII.



Isso porque ninguém sabe o que Boheme viu, mas, sempre pensando com a mente simples de uma criança, em um lance de audácia, extrapolei se ele não teria visualizado ao perceber as coisas "em sua natureza íntima" os chamados eixos de energia sutil que percorrem o corpo humano segundo os videntes relatam. 


A luz desses canais pareceria com um fluxo de luz e fogo aquele que o contemplasse. E como na descrição, esse CALOR " pelo qual o espírito se faz no corpo, move-se em todo o corpo, brilha fora do corpo e produz um movimento vivificante em todas as qualidades do corpo".
De qualquer forma, aí Boheme refere-se já as partes mais sutis do corpo, seja do corpo humano, seja do corpo da criação. Ele adverte que "no corpo, (as três primeiras qualidades) estão mescladas como se fossem uma única qualidade e contudo cada qualidade move-se e brota em sua própria força. Cada qualidade sai de si mesma, passa para as outras, e penetrando-as, estimula-as, com o que as outras qualidades recebem sua vontade, isto é, experimentam a vivacidade e o espírito desta qualidade..."




E continua:" A qualidade quente ou o CALOR, inflama (energiza) todas as qualidades, com isso a Luz se eleva em todas as qualidades, de modo que cada uma delas vê as outras. Pois quando o calor opera na doce umidade, então engendra a luz em todas as qualidades, o que faz com que cada uma delas veja todas as outras".[13]




A expressão "Veja" também é muito esotérica. Minha compreensão é que aqui Boheme quisesse dizer "Ver", no sentido de "perceber", "Conscientizar-se de", porque em seguida ele continua: "Dali resultam os sentidos e os pensamentos", que são instrumentos de percepção e compreensão do mundo material.
É a qualidade CALOR, portanto, que dá o início da vida e da percepção no ser, e a isto podemos chamar de CONSCIÊNCIA.
A qualidade CALOR, QUENTE ou FOGO é, portanto, o sopro da vida.
É muito poética a maneira como ele descreve as interações entre a propriedade ou qualidade CALOR e as outras:
"Então a qualidade AMARGA na ADSTRINGÊNCIA (ou seja, a expansão no corpo) penetra no CALOR, e a qualidade DOCE deixa-a passar amigavelmente na água; então, através da ÁGUA SUAVE a qualidade AMARGA estende-se pelo corpo no CALOR e faz duas portas abertas, que são os olhos, ou o primeiro sentido."




Ver de modo intuitivo, usando aqui o sentido psicológico desta palavra, que é olhar sem analisar, contemplar sem pensar sobre o que se olha, é a primeira e talvez mais impactante manifestação da consciência que desperta. A medida que vemos o mundo a partir de nós mesmos, tornamos-nos, a partir daí a referência de nossa perspectiva. Nunca mais poderemos ver através de outros olhos. Veremos sempre tudo que virmos através de nossos próprios olhos, e embora isto garanta a consolidação de nossa experiência pessoal no mundo será também a base de nossa solidão existencial. Pois que agradável seria poder compartilhar plenamente nossa perspectiva com outros ou vice-versa. Mas a vida na carne não o permitirá e assim, tudo que poderemos fazer será descrever, descrever e descrever, uns para os outros, aquilo que nossos olhos e apenas eles, percebem do mundo a nossa volta.
Para Boheme, existem dois momentos no movimento das coisas: primeiro, um movimento inconsciente, garantido pela qualidade AMARGA, algo inerente a matéria consolidada pela força ADSTRINGENTE. O outro movimento, um movimento vivo, digamos consciente, mesmo que de modo incipiente, desencadeado pela ação da propriedade CALOR, o "espírito da natureza", que traz consigo a vida, em um dos exemplos de suas manifestações, através do CALOR do Sol, que quando ilumina o Globo Terrestre "faz com que se movam e cresçam na terra toda espécie de configurações de minerais, plantas, raízes, vermes e tudo que está nela."[14]



Continua ele:" O calor do Sol acende (ou inflama) na terra a DOCE qualidade da água em todas as configurações; então através do CALOR, a luz se faz na ÁGUA SUAVE." É forte em mim a sensação que a palavra "acende" ou "inflama", como Américo Sommerman acrescenta a título de esclarecimento de sentido, são duas armadilhas semânticas. Acender ou Inflamar lembra o procedimento de por fogo em uma pilha de lenha ou em conjunto de folhas secas. 




Não é essa a minha interpretação. Insisto que aqui, acender ou inflamar refere-se muito mais ao sentido de "dar energia", energizar o que antes não possuía esta energia, que é, no caso, o que faz a propriedade CALOR, como qualidade ou espírito-fonte, para usar apenas três dos sinônimos que BOHEME usa para designar as forças do SALITRE.




Sigamos em frente: a próxima qualidade é a quinta, ou "o quinto espírito de DEUS, entre os sete espíritos de DEUS, nas divinas forças do Pai, é o santo, amável e beatífico AMOR."
O AMOR, enquanto QUALIDADE, é sem sombra de dúvida, uma Energia. Nada tem a ver com um sentimento ou com o amor mundano, que BOHEME compara a um "vale tenebroso". Ele o descreve como algo que flui através das outras QUALIDADES, como sempre, contaminando-as e modificando-as, como de ordinário, todas as QUALIDADES afetam umas às outras.



Sua descrição deste balé de forças é belíssima e inspiradora:
"Quando o CALOR se eleva na qualidade DOCE e inflama a fonte (ou qualidade) DOCE então esse FOGO arde na qualidade DOCE. Ora, uma vez que a qualidade DOCE é uma fonte de ÁGUA LÍMPIDA, agradável e suave, ela tempera ou abranda o CALOR e extingue o FOGO. A partir de então só o que resta na DOCE fonte de ÁGUA SUAVE (ou qualidade DOCE) é a alegre LUZ, e o CALOR é apenas suave calidez. (...) Esse amável e luminoso FOGO de AMOR eleva-se na qualidade DOCE, na qualidade AMARGA e na qualidade ADSTRINGENTE, inflama as qualidades AMARGA e ADSTRINGENTE, refresca e ilumina-as, torna-as vivas e alegres. E quando a DOCE força do luminoso AMOR vem a elas, quando podem experimentá-la e nela encontrar sua vida, AH! Então é um alegre encontro e um triunfo, um delicioso bem-estar, um grande amor, beatíficos beijos e um celeste sabor. Então o noivo abraça sua noiva. OH! Deleite. OH! Imenso amor. Quão suave és! Quão doce é provar-te! Como são penetrantes teus perfumes! OH, esplendor; OH, nobre claridade, quem pode mensurar tua beleza! Quão gracioso é teu amor! Quão belas são tuas cores! Ai! E isto eternamente! Quem pode pronunciá-lo!? E o que eu escreveria, eu que não faço mais que balbuciar como uma criança que aprende a falar."




Estas bodas alquímicas descritas neste trecho falam da iluminação, meta e objetivo último de todo o misticismo. O entendimento espiritual deste trecho mostra que a parte mais importante deste jogo de energias é modulação da Força da Vida, representada pela Energia CALOR pela energia DOCE ou ÁGUA SUAVE. Se a energia CALOR fosse muito intensa, destruiria aquele que deveria animar e tornar vivo; modulada torna-se fonte constante da vida e ligação indissolúvel com a Fonte de Toda Vida, DEUS. Assim estão dadas as condições para a manifestação da energia AMOR, como energia de conexão com o altíssimo, a qual permite a troca e o intercambio entre o Eterno e seus filhos ou criaturas. É pelo CALOR que a Forma ganha Espírito, Vida Consciente; e pelo AMOR que o Espírito em cada ser entra em conexão permanente com DEUS PAI, fonte primeira de todos os espíritos, de todas as energias. Para isso contribui, como disse, o importante papel modulador da Energia DOCE, ou ÁGUA SUAVE. Esta conexão na energia AMOR é o Casamento Alquímico, a ILUMINAÇÃO.
Lendo este lindo trecho, fiquei envolto em considerações. Aqui, quero deixar claro, são interpretações pessoais, que em certo sentido, divergem do pensamento de Jacob Boheme. Na minha particular visão, se acreditarmos como fato que BOHEME realmente contemplou a natureza íntima das forças do Universo, pelo que ele diz, independente do grau de consciência que tenhamos disto, a Energia AMOR está presente em todos nós, fornecendo-nos, ininterruptamente, a inspiração DIVINA, se bem que nem todos a percebamos ou reconheçamos, e mesmo, em certos casos, o grau de inconsciência desta conexão seja de tal intensidade que cheguemos a pensar que somos algo separado de DEUS PAI, independentes dele, capazes de viver sem sua presença ou intervenção. Se a Natureza da criação é, como BOHEME diz, tido que nos cerca, penso eu, (pedras, plantas, animais e homens, assim como os anjos), não são mais do que extensões de DEUS PAI e não criaturas, dobras em um tecido contínuo do qual o SALITRE, a CRIAÇÃO é apenas um pequeno pedaço.




Digo que eu, e não Boheme, penso assim, por que "para Boehme, embora os seres criados de fato sejam extensões de Deus Pai, são sim criaturas. E para Boehme há sim criador e criaturas. E existem sim seres criados."
Para Boheme " Deus enquanto Não-Ser primeiro revelou-se para si mesmo como Ser e, depois, manifestou-se para si mesmo como essências, formas ou ideias, e, por fim revelou as essências, formas ou ideias como criaturas."
Já na minha e apenas minha interpretação pessoal, por estarmos todos mergulhados na DIVINDADE, confundidos com Ela, manifestados por Ela, nEla e para Seu próprio deleite, não há como separarmos criador e criatura. Pela conexão da Energia AMOR, e pela vida da Energia CALOR, somos todos apenas Um com DEUS-PAI.
O Mal então, não poderá ser outra coisa que o Esquecer.
Quando esquecemos nossa origem divina, não deixamos de tê-la, porém mergulhamos no equívoco demoníaco de supor-nos apenas seres humanos comuns.
BOHEME nos adverte do engodo. "Ai de ti homem iludido e miserável" diz ele, " porque deixas que o Demônio te cegue e cubra teu corpo e tua alma de trevas?"
É a sensação de independência ou de falsa liberdade em relação a Vontade de Deus que cria o Orgulho.
BOHEME novamente nos alerta " OH segurança, o Demônio te espreita! Oh orgulho, és o fogo infernal".[15]
Temos a chance de recuperar nossa Principesca Origem na mudança de visão em relação a DEUS PAI. Criaturas, como quer Boheme, ou extensões de Deus, como eu interpretei, seja como for, somos Sagrados, neste mundo. Se supomos sermos algo diferente disso, aí está a verdadeira natureza do Mal.
Os Rosacruzes Martinistas entenderão: se a energia do AMOR a todos conecta, e conecta todos com DEUS, fundindo-nos em uma só energia, minha interpretação pessoal, ao contrário de Boheme, é que não existem seres criados, a não ser a título didático, nem nos céus, nem na Terra: na verdade, todos somos emanados.




O sexto espírito ou qualidade é o SOM ou TOM. Diz BOHEME que "O TOM ou MERCÚRIO toma sua origem na primeira qualidade, isto é, na qualidade ADSTRINGENTE e DURA. (...) A DUREZA é a Fonte do Tom. Ela (a DUREZA) não pode engendrá-lo sozinha, mas aqui ela tem o lugar de Pai e o inteiro SALITRE é a mãe." Ao que parece o choque das forças gera uma onda que ecoa no Salitre e torna-se SOM.
Na sua visão, BOHEME vê o SOM como produto da explosão do Espírito AMARGO dentro do espírito ADSTRINGENTE, através de um relâmpago que destrói sua solidez e o divide em pedaços, papel da energia AMARGA, o dividir em muitas partes.



ADSTRINGENTE e AMARGA estimulam-se e atritam-se, segundo ele, fazendo assim com que o CALOR se eleve no meio da qualidade DOCE ou ÁGUA SUAVE. O aumento da energia do CALOR (o inflamar) gera o relâmpago (LUZ) dentro da ÁGUA SUAVE, LUZ esta que se introduz assim de novo na qualidade AMARGA e por ela é dividido em várias partes, distinguindo-se em cada uma das forças. Esta LUZ agora difusa, em movimento, obriga o ADSTRINGENTE a abrir-se e quebra-a com seu relâmpago, gerando o SOM, impregnado de todos os sete espíritos.



Juntos, os sete espíritos mobilizados pelo SOM formam bocas nas criaturas, para que "quando elas quisessem falar ou emitir sons não fossem antes obrigadas a fazer um rasgo em si mesmas". 


E conclui BOHEME, esotericamente: "por isso todas as veias, fontes e espíritos fonte convergem para a língua, para que o SOM ou TOM possa sair doce e agradavelmente."
O SOM ou TOM, não é, pois, senão também uma resultante de todas as energias. Independente da maneira misteriosa com que sua gênese é descrita, nele encontramos todas as energias anteriores citadas, tanto as da forma (ADSTRINGENTE, DOCE E AMARGA) quanto as do espírito, (CALOR E AMOR), as quais estarão, segundo BOHEME, no SOM que sai da boca de todos, entre estes os santos anjos, com suas melodias e canções, tornando, portanto, a palavra um ato mágico, um ato de poder.




Para concluir a análise dessa qualidade, desafia-me o sentido da palavra Mercúrio como sinônimo de SOM ou TOM, e cheguei a supor que BOHEME se referia ao Mercúrio alquímico. Só que seus escritos contemplam outro aspecto do saber esotérico, o estudo dos planetas segundo a ASTROLOGIA. 


E lá, encontramos que "Mercúrio é o símbolo da discriminação, o separador de todo pensamento e consciência. Quando desperto, é santo e divino, mas pode matar tão facilmente como pode criar." [16]


Linguagem, a separadora de um pensamento em muitas partes, em muitas palavras

Esta definição (discriminador, separador de pensamentos) me pareceu muito mais afim com a natureza  do SOM, "poder Santo e Divino quando desperto na forma da palavra,  criador do real e ao mesmo tempo, perigoso e mortal".




Passemos então a 7a e última qualidade ou espírito fonte: o CORPUS, engendrado pelos outros seis espíritos fonte, qualidade na qual a criação manifesta. Diz BOHEME que "ele é o verdadeiro espírito da natureza, ou melhor, é a própria Natureza"[17]na qual reside a apreensibilidade ou tangibilidade e na qual, são formadas todas as criaturas no Céu e na Terra".
E continua ele " Sim, o próprio céu é formado ali dentro".
Isto demonstra que o CORPUS, ou Corpo, antes de um espírito fonte, é a manifestação do conjunto das seis forças, e se as cinco forças anteriores estão no SOM, a sexta, da mesma maneira as seis forças anteriores ao CORPUS, manifestam-se nele, estão nele, o que o faz, como eu já disse, um sinônimo do SALITRE. Porque então separá-lo em uma força à parte ao invés de manter em seis o número das forças? Falávamos disto no início deste ensaio. Boheme está descrevendo o que não pode ser visto, está tentando mostrar a outros o invisível e explicar a si mesmo o que viu. AURORA é seu primeiro texto e ele começa a ser escrito para que ele não esqueça o que viu nas primeiras três iluminações. Digamos então que esta é uma primeira elaboração, que não busca ser precisa, mas sim a mais elucidativa possível, e essas redundâncias em nada prejudicam ou empobrecem este objetivo.
Talvez ele quisesse como tantos de sua época que as qualidades fossem em número de sete para que respeitassem este vicio numerologico esotérico de confundir o fato com o símbolo, de tal forma que mesmo que o conjunto descrito seja de doze ou quarenta unidades, será descrito como composto de sete apenas, número importante na simbologia, mas na maioria das vezes apenas uma metáfora do real.
Dizer que a qualidade Corpo é diferente do conceito de SALITRE é impossível quando o próprio BOHEME diz com sua boca que o Corpo "é o verdadeiro espírito da Natureza, ou melhor, a própria Natureza." Como o Salitre também é exatamente o mesmo, o conjunto das qualidades, ou o que chamamos de Criação, temos sim uma redundância com a qual deveremos conviver e aceitar. Lembremos que Natureza, aqui, para Boheme não é apenas o conjunto de árvores, frutos, animais, Sol, Lua e estrelas, mas também o mundo celeste, com seus Santos Anjos, já que essas qualidades descritas estão em DEUS e dele emanam para criar TODAS, prestem atenção, TODAS AS COISAS, e não apenas as coisas chamadas materiais e mundanas. Portanto o CORPUS lembra aquilo que foi referido quando da analise da qualidade ADSTRINGENTE, de que ela, com suas características centrípetas, de coesão, permitia o surgimento da forma onde antes havia apenas energia pura. O que não quer dizer que esta forma tivesse a mesma densidade em todas as partes do SALITRE, provavelmente sendo menos densa nos céus e mais densa, pela ação de Lúcifer, na Terra. 



Podemos sem equívoco conceber que tanto a densidade quanto a dureza da qualidade ADSTRINGENTE obedecem a uma intensificação energética ou "inflamação", proporcionalmente mais alta a medida que a manifestação da existência ou da vida está mais mergulhada no mundo terreno, e proporcionalmente menor a medida que ascendemos ao mundo celeste. Assim a qualidade Corpo manifesta-se como estrutura resultante do conjunto de todas as coisas da Criação, com áreas de densidade diferentes, de acordo com o plano, celeste ou terrestre, que analisemos.
Por último, não poderia deixar de comentar algumas sincronicidades Junguianas que percebi enquanto preparava este trabalho.
Referem-se ao fato de que, primeiro, BOHEME teve um companheiro ilustre de século, embora não tenham sido contemporâneos.




Refiro-me a Isaac Luria, nascido em 1534 e morto em 1572, apenas tres anos antes do nascimento de BOHEME.
Fiquei fascinado com o fato de que ambos consideraram dois conceitos que, se não são iguais, pelo menos navegam nas mesmas águas.
O primeiro conceito refere-se aos movimentos envolvidos no surgimento de Lúcifer, os quais estão descritos em BOHEME, em AURORA, no 13° capítulo[18], nos itens 116 e 117, aonde se lê:



"116: Quando Lúcifer adquiriu assim seu caráter real, de modo que seu espírito elevou-se nele no ato de sua formação e configuração, foi acolhido perfeita e amorosamente por Deus e colocado na glorificação; no mesmo instante ele deveria ter começado sua obediência de maneira angélica, e deveria ter se movido em Deus conforme Deus Se movera, como um filho querido na casa de seu Pai. E foi o que ele não fez. 117: Mas quando sua luz foi engendrada em seu coração e os espíritos fonte foram instantaneamente impregnados e qualificados pela grande luz, eles foram tão viva e alegremente afetados que se elevaram em seu corpo contra o direito da Natureza e começaram uma qualificação mais alta, soberba e pomposa do que a de Deus".

E continua no item 119 e 120: "E o relâmpago poderoso, grande e brilhante (...) atritou-se com a qualidade ADSTRINGENTE com tão terrível força que era como se fosse despedaçar-se de tamanha alegria.Pois o relâmpago foi tão brilhante, que era como que insuportável para os espíritos fonte ( ou qualidades): por isso a qualidade AMARGA tremeu e se atritou tão rudemente com a qualidade ADSTRINGENTE que o CALOR inflamou-se contra o direito da Natureza e a qualidade ADSTRINGENTE  também secou a ÁGUA SUAVE com sua rude contração."
O que lembram essas palavras? Energia demais, resultado desastroso. Luria também descreve um evento em que energia demais desceu de Deus sobre os vasos das sefirot de tal forma que os vasos não suportaram a Luz e também obtivemos desastre e estilhaçamento das luzes aprisionadas nos cacos dos vasos rompidos, por toda a criação.



É o Chevira Há Kelin.




São conceitos diferentes? Sim, mas estes dois habitantes do século XVI e XVII, por alguma razão, tentaram explicar o surgimento do Mal (BOHEME) e a proliferação em muitas almas a partir da Alma única (Luria) por um mesmo, vamos usar esta imagem,"erro divino": excesso de voltagem na Energia utilizada, como se no princípio da Criação Deus estivesse testando a melhor voltagem, e tenha usado, digamos assim, 220 volts aonde seriam necessários apenas 110, colhendo com isso alguns acidentes de laboratório.



De toda forma ressaltemos que esta impressão é pessoal já que "para Jacob Boehme e para a Cabala não se tratou de um erro divino, de um excesso de voltagem, foi um resultado da vontade livre de algumas das hierarquias criadas, que quiseram receber a luz de maneira desmedida e não quiseram doá-la, fazendo com que os "vasos" ou corpos espirituais "estourassem".
O outro conceito é da contratilidade.
Para ambos, Luria e BOHEME, o Altíssimo lançou mão de energias contrácteis: BOHEME, com a descrição da qualidade ADSTRINGENTE, centrípeta, para conseguir densidade e forma para as coisas; LURIA, com a Contração Divina, que permite a formação do espaço da Criação, no movimento conhecido como Tzim Tzum.





Pareceu-me curioso essas semelhanças, discretas, mas que propõe que as imagens estavam no espaço e ambos valeram-se delas para descrever suas visões de mundo.
Conceitos gerais sim, e talvez semelhança que esteja apenas na minha mente, mas sem dúvida, algo curioso que não tive como deixar passar em branco.
Enfim, esperemos que estas considerações possam suscitar curiosidade suficiente em voces para que procurem meditar sobre os textos do Príncipe dos Filósofos Divinos, de modo a perceber que, para BOHEME, o mistério da Vida não é nem nunca foi, apenas, DOCE.





[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/Culin%C3%A1ria_da_Alemanha#Batatas
[2] http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/6357.pdf; 2.1
[3] AURORA NASCENTE, ed. Polar, 3a edição revista, oitavo capítulo, item 17, pág. 118
[4] idem
[5] AURORA NASCENTE, item 19, pág 118.
[6] Aurora Nascente, pág 119, oitavo capítulo, item 23
[7] AURORA NASCENTE, 8° capítulo, item 24
[8] idem
[9] idem, item 27, pág. 120
[10] AURORA NASCENTE 8° cap, item 28, págs 120-121.
[11] AURORA CELESTE, 8° cap. item 29, pág121
[12] idem, item 28, pág.120
[13] AURORA NASCENTE, 8° cap. item 38, pág 123
[14] AURORA, 8° cap. item 43, pág. 124
[15] pág 135 itens 102 , 103
[16] http://www.levir.com.br/inst-037.php
[17] AURORA,11° cap. item 1, pág.165
[18] pág. 224