Por Mario Sales
Sertillanges
Passado este furacão estético que é ler Bachelard, dedico-me
agora a degustar um saboroso texto cujo título, estimulante, é “A Vida
intelectual”.
Seu autor é “Antonin-Dalmace Sertillanges, conhecido também
como Antonin-Gilbert Sertillanges ou Antonin Sertillanges (Clermont-Ferrand, 16
de novembro de 1863 – Sallanches, 26 de julho de 1948), (o qual) foi um
filósofo e teólogo francês, considerado como um dos maiores expoentes do
neotomismo da primeira metade do séc. XX.”[1]
Não há, sem ler, como descrever a beleza e a suavidade desse
texto, por várias razões, mas talvez a mais significante seja a ponte que
estabelece entre a atividade cerebral e a vida devocional.
Chega mesmo a classificar o intelectual, não aquele
eventual, mas o que está comprometido com a aquisição prazerosa e continuada da
cultura como um “vocacionado”, à semelhança daqueles que se sentem atraídos
para a vida monástica.
Vejam, o adjetivo não está equivocado, esta adesão a vida
intelectual deve e precisa ser prazerosa. Não se pode mentir para si mesmo,
para as tendências internas que nos mobilizam, e a vida intelectual como tantas
outras tendências vem de dentro de cada um, é um chamado, não uma escolha.
O “precioso conselho” de Disraëli: “Faz o que te agrada,
desde que realmente te agrade” se aplica aqui.
E num trecho que aproxima a bioquímica e o misticismo, bem
ao meu gosto, Sertillanges, com muita sagacidade, dispara:
“Nossas disposições são como as propriedades químicas que
determinam para cada corpo, as combinações que esse corpo pode realizar. Elas
não podem ser criadas. Vêm do céu e da geração natural. Toda a questão se
resume a ser dócil a Deus e a si mesmo, depois de ter ouvido essas duas vozes.”
(o grifo é meu)
E em outra brilhante passagem, eivada de devoção cristã, lembrando
a necessidade de que cada um de nós faça de sua vida a mais produtiva possível,
Sertillanges afirma:
“A humanidade cristã é composta de personalidades
diversas, e nenhuma delas abdica de si mesma sem empobrecer o todo e sem privar
o Cristo eterno de uma parte do seu reino. O Cristo reina, desdobrando-se. A
vida inteira de um de seus “membros” é um instante qualificado da sua duração;
toda existência humana e cristã é uma existência incomunicável, única e por
conseguinte necessária a expansão de seu “corpo espiritual”.
Talvez um único reparo possa ser feito a essa edição,
responsabilidade da Kirion, em tradução de Roberto Mallet: o prefacio foi feito
por ninguém mais do que o polemico Olavo de Carvalho, que já deu amplas
demonstrações de instabilidade emocional, a despeito de sua bagagem intelectual,
o que em si em nada afeta a qualidade do texto e não deve, por nenhum preconceito, afastar os interessados dessa leitura.
É um livro, em tudo e por tudo, cativante.
Recomendo entusiasticamente.
[1]
https://ecclesiae.com.br/index.php?route=product/author&author_id=247
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