Galileu Galilei
Por Mario Sales FRC.:,S.:I.:,M.:M.:
“No Brasil, onde cientista não é considerado intelectual, opinião própria é artigo raro e o ensino fracassa redondamente em transmitir conceitos e operações matemáticas, mostrar esse valor de Galileu na mudança de mentalidade humana – a troca do dogma pela pergunta, do sermão pela observação – seria essencial. É comum ouvir nesta cultura contra reformista, que temos de “conciliar” religião e ciência, pondo a ênfase mais na arrogância da ciência do que na religião, esquecendo como as doutrinas religiosas trabalharam com descrições do mundo natural e combateram a liberdade científica, travestindo muitas vezes este combate de loas à humildade. Há um viés irracional na mentalidade brasileira, um dos países menos seculares do planeta, ainda que se considere “do futuro”. Galileu, como Darwin depois dele, diz pela boca de Sagredo, que não vê porque a Terra seria menos nobre e admirável por sofrer “tantas e tão diversas alterações, mutações, gerações, etc. que nela acontecem incessantemente”. Que a Terra se mova é o que a faz viva.”
Talvez o que mais tenha me atraído na afiliação a Ordem Rosacruz AMORC, 37 anos atrás, tenha sido seu caráter positivista e empírico.
Nada que me foi passado, nas primeiras monografias, teve qualquer caráter dogmático. Havia sempre a pressuposição de que eu deveria experimentar a técnica ensinada e testá-la no dia a dia para desenvolver confiança na mesma.
Ao longo dos anos, muito deste arcabouço teórico que me encantou nos primeiros anos de neófito, na prática e no discurso, mudou.
Embora algumas monografias ainda persistam na afirmação da importância do pensamento reflexivo e na atitude científica, principalmente aquelas dos graus acima do 12° grau de templo, nas monografias de graus mais baixos encontramos discretos sinais de estímulo a religiosidade em detrimento do método científico.
Atribuo esta mudança ao fato de nosso atual Imperator ser francês e o quanto esta questão facilita o fortalecimento da mensagem martinista entre os rosacruzes, uma vez que a Ordem Martinista, abrigada pelos rosacruzes, é uma ordem que nasceu na Língua Francesa, fundada por franceses, e que tem seus maiores expoentes naquele país.
A Ordem Martinista é uma Ordem Cristã, ao contrário da Ordem Rosacruz que não tem denominação religiosa ou especificação de linha religiosa.
Já critiquei aqui a confusão entre uma e outra visão em artigo anterior ( “Desconforto”, de 26 de dezembro de 2010) o que faz supor que os nossos líderes não tem claro a importância de preservar a linha divisória entre as peculiaridades da Rosacruz e do Martinismo. Só que isto, confundir as duas tradições, é um perigoso equívoco.
Assim como já defendi aqui neste espaço, que o Rosacrucianismo não é a mesma coisa que Catolicismo, nem segue o pensamento de Paulo, apóstolo ( “As Três Virtudes Teologais” 3 de março de 2010), da mesma maneira defendo agora que Rosacrucianismo não é Martinismo.
E a maior preocupação que tenho em defender esta separação metodológica tem a ver com o perigoso caminho que o Martinismo trilha, do ponto de vista histórico-filosófico, ao estudar a fundo as possibilidades místicas da fé e da oração, sob a bandeira do Cristianismo.
Levando em consideração a importância da mensagem cristã, de seu profeta, Jesus, como mestre espiritual, e da beleza de seu trabalho no seu ministério neste mundo, ainda assim foi em nome desta mesma mensagem que as maiores atrocidades foram praticadas ao longo de dois séculos de poder da chamada Santa Madre Igreja.
Inquisição
Rosacruzes foram perseguidos, cientistas foram mortos, e o desatino chegou a tal ponto que a Igreja como Organização rachou em duas com o movimento Luterano Protestante, que se tornou o defensor do pensamento livre, e que, com certeza, não queimaria Giordano Bruno em nome da “Fé”, nem julgaria Galileu Galilei por heresia apenas por que este percebera que a Terra não era o centro do Universo.
O movimento de Lutero, de 1517, chamado de Reforma, em busca de uma Igreja mais digna, e mais fiel , gerou a Contra- Reforma na Igreja, iniciada em 1545 com o Concílio de Trento, que restabeleceu o Tribunal do Santo Ofício, leia-se Inquisição, esta instituição que tantas tristes lembranças traz a todos os místicos, principalmente aos rosacruzes e maçons, a qual também gerou o Index Librorum Prohibitorum, uma relação de livros e textos proibidos pela Igreja.
A Igreja, por séculos, foi uma poderosa inimiga da ciência. Até hoje, em nossos dias, suas declarações deixam transparecer o ranço do passado. Ela tentou, como Herodes, destruir a Ciência em seu berço, passando a fio de espada toda iniciativa ainda muito jovem de instaurar na humanidade o pensamento reflexivo e livre da superstição.
E tudo o que fez, a Igreja fez, assim dizia, em nome do Cristianismo, transformando para muitos a palavra Cristianismo em sinônimo de Catolicismo e de Repressão ao pensamento livre.
Não são boas memórias.
Claro, Jesus, o Cristo, jamais apoiaria tais práticas.
Elas nada tem a ver com fé ou espiritualidade.
São produto de uma estratégia de poder, que gerou um exército próprio (a guarda suíça) e um feudalismo explícito que deu a Igreja terras em todo o mundo conhecido, que foram pouco a pouco retomadas pelos países em que estavam quando a farsa em que se baseava esta estratégia foi desmascarada.
Na Inglaterra, a luta pelo poder entre o Rei e a Igreja gerou uma Igreja própria, a Anglicana, cujo sumo pontífice é o próprio Rei.
No Oriente, os desencontros das práticas de Roma com os interesses da igreja daquela região gerou a Igreja Ortodoxa, separada administrativamente e com um papa específico.Por mais que o Martinismo defenda que é uma Ordem Cristã, no sentido de que tenta alcançar a plenitude espiritual do Cristo, o fato de intitular-se uma Ordem Cristã, considerando-se o histórico deste termo, parece de um apelo démodé e dúbio.
E lembrando sempre que um dos principais autores do Fama Fraternitatis, Johann Valentin Andreae (1586-1654) era protestante, portanto adversário deste projeto de poder representado pelo Cristianismo de Roma, os rosacruzes sempre se mantiveram afastados de um discurso que pudesse levar ao equívoco de supor que a admiração e o respeito que nossa Ordem tem pela mensagem primitiva do Cristo seja, em qualquer momento, semelhante a uma aliança com o Cristianismo de Roma como movimento político, preconceituoso e inimigo da ciência e do conhecimento.
Precisamos ter muito cuidado ao falarmos de cristianismo dentro do rosacrucianismo, como teríamos da mesma maneira, ao falar do xintoísmo, do islamismo, do budismo ou do vedantismo.
A Rosacruz está acima de rótulos religiosos.
A Rosacruz, pelo menos a meu ver, está além de quaisquer denominações de credo, pois não oramos ao Deus dos Cristãos, dos Hindus ou dos Muçulmanos, mas sim ao Deus de nosso Coração, ao Deus de nossa Compreensão. Nossos membros sempre foram livres para crer do jeito que lhes fosse mais familiar e adequado, pois a Rosacruz ensina que o Deus Único, o Rá dos Egípcios, é apenas um dos inúmeros nomes da mesma Inteligência, sabiamente conhecida entre nós pela denominação internacional e interreligiosa de “O Cósmico”.
E por que este longo raciocínio acerca dos perigos ocultos nas palavras e nos rótulos?
Mais e mais tornamo-nos uma ordem de discursos, não de ciência e experimentação, como nos meus tempos de neófito.
É fundamental ao místico aprofundar sua fé e sensibilidade ao altíssimo, e por isso o enfoque martinista tem lá sua importância, mas lembremo-nos que esta busca nunca esteve ausente da missão rosacruz no mundo, a qual sempre foi unir a busca do desenvolvimento dos potenciais internos dos homens e mulheres a ela filiados no intuito de melhorar a sua conexão com a inspiração divina, sem que isto signifique abandonar a ciência, a cultura ou o pensamento racional, conquistado a duras penas, e com o auxílio de dignos membros de nossa Fraternidade, como Francis Bacon, e seu trabalho quanto a necessidade do empirismo, ou Renée Descartes, e sua ênfase na importância do ceticismo metodológico, ideal que se concretizou no esforço de um terceiro Grande Rosacruz, Sir Isaac Newton.
A ciência, como a conhecemos, deve parte importante de sua concepção e estrutura a estes três grandes rosacruzes, que eram cristãos, mas antes disso, eram cientistas e pensadores, que nunca colocaram suas crenças pessoais a frente de seu trabalho como intelectuais, se bem que no íntimo guardassem, com certeza, a noção exata de que a busca da Verdade Científica está inserida no esforço do Sagrado.
Por isso repito: nós rosacruzes, ao contrário dos martinistas, não somos uma Ordem Cristã, mas também Cristã, como ainda Budista, Vedantista, Hinduísta, Sufi , e tantas outras denominações que a sensibilidade humana e os aspectos regionais deste planeta tenham gerado, ao longo de nossa curta história civilizada.
Mais: não somos religiosos, mas místicos, considerando que nosso valor mais precioso é a liberdade do contato com o divino em nós sem um clero intermediário, que venha nos dizer como crer e como orar ao deus do nosso coração.
E por último, não somos religiosos que fazem ciência, como o padre Mendel, que Deus o tenha, mas Cientistas imbuídos de espiritualidade, que em seus laboratórios, buscam (ou deveríamos buscar) a aplicação dos mais elementares princípios da ciência, certos de que não é com discursos moralistas ou meramente com “sermões” que construiremos uma massa crítica de conhecimentos que nos dê condição de dialogar com o mundo científico ortodoxo, o qual não nos notará em função de nossas afirmações, mas a partir de nossas demonstrações dos princípios que defendemos em nossos discursos.
Existe sempre um ponto onde os universos místico e positivista se tangenciam ou, por vezes mesmo, se interpenetram.
Os comentários de Daniel Piza, no início deste artigo, referiam-se ao Brasil e a prática científica e intelectual nacional, mas bem que poderiam se aplicar a uma parte da Rosacruz Moderna, por mais difícil que seja para mim admitir isso.
Recuperar nosso secularismo, presente no discurso protestante, como presente no discurso reformista, protestante e metodista de retomada dos trabalhos da Ordem para este ciclo, já que era esta a formação religiosa de Harvey Spencer Lewis, é retomar nosso rumo no oceano do conhecimento.
O movimento de Lutero, de 1517, chamado de Reforma, em busca de uma Igreja mais digna, e mais fiel , gerou a Contra- Reforma na Igreja, iniciada em 1545 com o Concílio de Trento, que restabeleceu o Tribunal do Santo Ofício, leia-se Inquisição, esta instituição que tantas tristes lembranças traz a todos os místicos, principalmente aos rosacruzes e maçons, a qual também gerou o Index Librorum Prohibitorum, uma relação de livros e textos proibidos pela Igreja.
A Igreja, por séculos, foi uma poderosa inimiga da ciência. Até hoje, em nossos dias, suas declarações deixam transparecer o ranço do passado. Ela tentou, como Herodes, destruir a Ciência em seu berço, passando a fio de espada toda iniciativa ainda muito jovem de instaurar na humanidade o pensamento reflexivo e livre da superstição.
E tudo o que fez, a Igreja fez, assim dizia, em nome do Cristianismo, transformando para muitos a palavra Cristianismo em sinônimo de Catolicismo e de Repressão ao pensamento livre.
Não são boas memórias.
Claro, Jesus, o Cristo, jamais apoiaria tais práticas.
Elas nada tem a ver com fé ou espiritualidade.
São produto de uma estratégia de poder, que gerou um exército próprio (a guarda suíça) e um feudalismo explícito que deu a Igreja terras em todo o mundo conhecido, que foram pouco a pouco retomadas pelos países em que estavam quando a farsa em que se baseava esta estratégia foi desmascarada.
Na Inglaterra, a luta pelo poder entre o Rei e a Igreja gerou uma Igreja própria, a Anglicana, cujo sumo pontífice é o próprio Rei.
No Oriente, os desencontros das práticas de Roma com os interesses da igreja daquela região gerou a Igreja Ortodoxa, separada administrativamente e com um papa específico.Por mais que o Martinismo defenda que é uma Ordem Cristã, no sentido de que tenta alcançar a plenitude espiritual do Cristo, o fato de intitular-se uma Ordem Cristã, considerando-se o histórico deste termo, parece de um apelo démodé e dúbio.
Newton
Porque falar-se em Cristianismo em 2011, por mais que queiramos, traz a memória tudo o que foi citado acima, e , principalmente, a recordação de quanto a ciência perdeu em nome da “fé cristã” e de quantos pensadores e cientistas foram perseguidos e mortos em nome desta mesma “fé”.
Rosacruzes, embora estejam repletos de religiosidade, não são religiosos.
Johan Valentin Andrea
E lembrando sempre que um dos principais autores do Fama Fraternitatis, Johann Valentin Andreae (1586-1654) era protestante, portanto adversário deste projeto de poder representado pelo Cristianismo de Roma, os rosacruzes sempre se mantiveram afastados de um discurso que pudesse levar ao equívoco de supor que a admiração e o respeito que nossa Ordem tem pela mensagem primitiva do Cristo seja, em qualquer momento, semelhante a uma aliança com o Cristianismo de Roma como movimento político, preconceituoso e inimigo da ciência e do conhecimento.
Precisamos ter muito cuidado ao falarmos de cristianismo dentro do rosacrucianismo, como teríamos da mesma maneira, ao falar do xintoísmo, do islamismo, do budismo ou do vedantismo.
A Rosacruz está acima de rótulos religiosos.
A Rosacruz, pelo menos a meu ver, está além de quaisquer denominações de credo, pois não oramos ao Deus dos Cristãos, dos Hindus ou dos Muçulmanos, mas sim ao Deus de nosso Coração, ao Deus de nossa Compreensão. Nossos membros sempre foram livres para crer do jeito que lhes fosse mais familiar e adequado, pois a Rosacruz ensina que o Deus Único, o Rá dos Egípcios, é apenas um dos inúmeros nomes da mesma Inteligência, sabiamente conhecida entre nós pela denominação internacional e interreligiosa de “O Cósmico”.
E por que este longo raciocínio acerca dos perigos ocultos nas palavras e nos rótulos?
Mais e mais tornamo-nos uma ordem de discursos, não de ciência e experimentação, como nos meus tempos de neófito.
É fundamental ao místico aprofundar sua fé e sensibilidade ao altíssimo, e por isso o enfoque martinista tem lá sua importância, mas lembremo-nos que esta busca nunca esteve ausente da missão rosacruz no mundo, a qual sempre foi unir a busca do desenvolvimento dos potenciais internos dos homens e mulheres a ela filiados no intuito de melhorar a sua conexão com a inspiração divina, sem que isto signifique abandonar a ciência, a cultura ou o pensamento racional, conquistado a duras penas, e com o auxílio de dignos membros de nossa Fraternidade, como Francis Bacon, e seu trabalho quanto a necessidade do empirismo, ou Renée Descartes, e sua ênfase na importância do ceticismo metodológico, ideal que se concretizou no esforço de um terceiro Grande Rosacruz, Sir Isaac Newton.
A ciência, como a conhecemos, deve parte importante de sua concepção e estrutura a estes três grandes rosacruzes, que eram cristãos, mas antes disso, eram cientistas e pensadores, que nunca colocaram suas crenças pessoais a frente de seu trabalho como intelectuais, se bem que no íntimo guardassem, com certeza, a noção exata de que a busca da Verdade Científica está inserida no esforço do Sagrado.
Sir Francis Bacon, Imperator da Rosacruz no século XVI
Por isso repito: nós rosacruzes, ao contrário dos martinistas, não somos uma Ordem Cristã, mas também Cristã, como ainda Budista, Vedantista, Hinduísta, Sufi , e tantas outras denominações que a sensibilidade humana e os aspectos regionais deste planeta tenham gerado, ao longo de nossa curta história civilizada.
Renée Descartes
Mais: não somos religiosos, mas místicos, considerando que nosso valor mais precioso é a liberdade do contato com o divino em nós sem um clero intermediário, que venha nos dizer como crer e como orar ao deus do nosso coração.
E por último, não somos religiosos que fazem ciência, como o padre Mendel, que Deus o tenha, mas Cientistas imbuídos de espiritualidade, que em seus laboratórios, buscam (ou deveríamos buscar) a aplicação dos mais elementares princípios da ciência, certos de que não é com discursos moralistas ou meramente com “sermões” que construiremos uma massa crítica de conhecimentos que nos dê condição de dialogar com o mundo científico ortodoxo, o qual não nos notará em função de nossas afirmações, mas a partir de nossas demonstrações dos princípios que defendemos em nossos discursos.
Uma ordem séria e sólida não se fundamenta em boas intenções, mas em fatos, em realizações.
Faz muito tempo, desde o meu tempo de neófito, que anseio ver a retomada de um trabalho científico rosacruz positivista, como Spencer Lewis sonhava, que nos devolva a condição de herdeiros dos antigos alquimistas e precursores de uma nova ciência, voltada para Deus e para a Verdade, livre de dogmas e de rótulos religiosos perigosos e dúbios, de lembrança tão triste para todos os místicos.
Faz muito tempo, desde o meu tempo de neófito, que anseio ver a retomada de um trabalho científico rosacruz positivista, como Spencer Lewis sonhava, que nos devolva a condição de herdeiros dos antigos alquimistas e precursores de uma nova ciência, voltada para Deus e para a Verdade, livre de dogmas e de rótulos religiosos perigosos e dúbios, de lembrança tão triste para todos os místicos.
pesquisador místico
Existe sempre um ponto onde os universos místico e positivista se tangenciam ou, por vezes mesmo, se interpenetram.
Os comentários de Daniel Piza, no início deste artigo, referiam-se ao Brasil e a prática científica e intelectual nacional, mas bem que poderiam se aplicar a uma parte da Rosacruz Moderna, por mais difícil que seja para mim admitir isso.
Recuperar nosso secularismo, presente no discurso protestante, como presente no discurso reformista, protestante e metodista de retomada dos trabalhos da Ordem para este ciclo, já que era esta a formação religiosa de Harvey Spencer Lewis, é retomar nosso rumo no oceano do conhecimento.
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