por Mario Sales, FRC,SI,CRC gr.18°
A palavra percussão
é sinônima da palavra golpe.
Instrumentos de percussão são instrumentos que dependem, para a produção de
seus sons característicos, de golpes desferidos em uma membrana esticada, que
assim ecoa.
A rigor até o piano é um instrumento de percussão já que as
teclas ferem cordas internas para produzir vibrações e as características notas
musicais.
Os tambores e bumbos, no entanto, são exemplos mais
imediatos que vêm à nossa mente quando usamos a expressão percutir.
Repercutir seria portanto ecoar uma percussão anterior,
repetir os sons anteriores de outro tambor, como nas técnicas primitivas de
comunicação entre as tribos da áfrica, que golpeavam troncos ocos ou
instrumentos mais elaborados para transmitir mensagens além.
A imagem que fica é de que aquilo que repercute se espalha,
avança sobre o espaço, se expande.
Faço essas considerações por causa da repercussão do meu
mais recente ensaio, "A Importância da Paixão", que teve uma
inesperada repercussão.
Digo inesperada porque há tempos não publico nada de minha
própria lavra. Os bloqueios criativos são normais e hoje convivo com eles
pacificamente, aceitando-os como silêncios cíclicos necessários no ritmo da
música da vida.
Aprendi com o poeta:
"Não existiria som se não houvesse o silêncio
Não haveria luz se não fosse a escuridão
A vida é mesmo assim
Dia e noite, não e sim
Cada voz que canta o amor não diz tudo o que quer dizer
Tudo que cala fala mais alto ao coração
Silenciosamente
Eu te falo com paixão
Eu te amo calado
Como quem ouve uma sinfonia
De silêncio e de luz
Nós somos medo e desejo
Somos feitos de silêncio e som"
Portanto aceito esses instantes de silêncio, mesmo que sejam
instantes que durem meses, por que sei que são naturais e necessários para que
a expressão seja adequada.
Como havia semanas que não publicava, já achava que não
haveria leitores pelo menos atentos e capazes de reagir tão rapidamente a estes
traços.
Súbito, vejo a caixa postal encher de comentários, um
contra, dois a favor, um deles belíssimo e lírico, postada por alguém chamado
Longchempa, a quem agradeço a citação:
"Do Canto Doze: Liberação
Em suma, toda a percepção sensorial consciente,
E tudo o que é inconsciente ou transcendente,
Tudo já está liberado no espaço de agora,
Assim, qualquer tentativa de liberar qualquer coisa de novo é supérflua.
É inútil tentar fazer um esforço no sentido de liberação!
Portanto, não tente! Não tente! Não lute e se esforce na prática!
Não procure! Não procure! Não busque a verdade intelectual!
Não medite! Não medite! Não invente meditação!
Não analise! Não analise! Não analise dentro ou depois de um evento! Não pratique! Não pratique! Não pratique o resultado de esperança e medo!
Não rejeite! Não rejeite! Não rejeite carma emocional!
Não acredite! Não acredite! Não acredite em religião justa! Não se prenda! Não se prenda! Não engaiole sua mente!"
Keith Dowman - Espacialidade"
É isso. Quem já tem , não procura. Quem já é não busca ser.
Não teme ser, já que não se envolve. Viver para ele é apenas contemplar, como
se se afastasse de si por um tempo e deixasse que se corpo e seu coração
fizessem coisas, dissessem coisas, sem se confundir com eles, observando-os
serenamente enquanto vivem, enquanto tateiam na existência e nos sentimentos,
procurando significados e esclarecendo dúvidas que nenhum espírito tem, só os
corpos, só os corações, estas mesclas de carne e alma fantásticas geradas pela
alquimia da existência.
Não confundir-se com o Eu é o segredo.
Sem este equívoco a vida é mais plena, não há culpa, não há
remorso.
O Eu tem uma função, tem um papel, mas o Eu é, mesmo assim,
apenas um instrumento, um óculos através dos quais enxergamos e imergimos na
experiência carnal.
O Eu não é o Indivíduo, a Personalidade Alma como dizemos na
Rosacruz, mas o Eu, tão atacado pelas várias linhas de espiritualidade, não é o
inimigo.
O que nos afeta, o que nos perturba, é a Identificação com o
Eu, a ilusão de acharmos que somos o Eu, de que as necessidades do Eu são as
nossas necessidades.
Desfeita a ilusão da identificação equivocada, a Vida
torna-se plena e sempre agradável.
É este estado que chamamos Iluminação, a libertação da
Errônea Percepção do que nos Circunda.
A Vida em si continua. Tudo permanece o mesmo.
O que muda é a percepção.
Mudando a percepção do que nos circunda e de nós mesmos,
nada muda e tudo muda, ao mesmo tempo.
Achei estranho um budista, o que ficou bravo comigo, ter me
escrito falando que eu tinha pervertido o Budismo ao citá-lo no referido ensaio
anterior.
Não achei estranho ter me corrigido mas a emoção e a paixão
com que o fez.
Havia ira em seus comentários, ou seja, uma atitude não
serena, não budística.
Não sou budista, não sou uma autoridade em Budismo, posso e
devo cometer equívocos interpretativos da doutrina budista todo o tempo. Mas
não me importo de ser corrigido pela mais pacífica e serena comunidade
religiosa de todo o mundo.
Budistas verdadeiros estão mergulhados em um estado de
serenidade permanente, a exemplo de seus líderes, uma serenidade que não é
artificial, mas natural, humana, autêntica.
Não negam as emoções mas sabem que as emoções são coisas do
Eu, e o Eu não é o que somos.
Nós não somos o Eu. O Eu é uma ilusão da mente.
E o budismo diz que libertos da ilusão da mente, das ilusões
do Eu, nos iluminamos.
Também penso assim.
E então recebo às vezes, comentários tensos, preocupados,
falando do que é certo e do que é errado em Budismo, etc, etc.
Curioso.
São os chamados religiosos de texto.
Não sentem a mensagem com o coração. Não deixam que ela
entre, que se aposse de seu ser.
E isto é fundamental na apreensão de um conhecimento
espiritual.
Não podemos aprendê-lo, mas sim apreendê-lo e deixar que ele
nos apreenda e nos inunde.
A verdadeira espiritualidade deve ser absorvida como a
esponja absorve a água.
E assim eu
vejo o budismo, como uma aula permanente sobre a importância do
autoconhecimento, nada mais.
Mais que uma
religião, a Doutrina Budista é um discurso de bom senso e técnica.
Bom senso ao
reconhecer no homem limitações naturais ligadas a sua ignorância daquilo que
ele é realmente.
E técnica na
medida que orienta o interessado em maneiras e métodos de transcender esta
ignorância e superá-la.
Portanto, é
uma linha de pensamento abençoada, porque desfaz, pelo conhecimento, todas as
nossas ansiedades e receios, todos os nossos medos e equívocos.
Ao meu
crítico, como sempre anônimo, peço que tenha tolerância comigo, mas minhas
posições são as posições de alguém naturalmente limitado, que jamais chegará a
falar com segurança de todas as coisas, alguém que quanto mais lê mais entende
que sua ignorância é imensa e que, por isso, não tem medo de errar, já que isto
é inevitável. Mas como diria o personagem humorístico, "não fique bravo".
Afinal, a ira é coisa do Ego, e voce é um Budista, e portanto sabe que não é o
Ego, não é a Mente, voce é Luz, Plenitude, Compreensão Absoluta. Não há lugar
para a ira em corações abençoados pela doutrina budista, e se a ira se
manifestar, olhe-a com tolerância e compreensão, porque são apenas ecos,
repercussões de sons distantes de um passado de ignorância ao qual, graças ao
Buda, Krishna, Melquisedeque, Cristo, Apolonio de Tiana e outros, não
pertencemos mais.
E fiquemos
em paz.
Ao comentadores do post, meu grande
abraço.