Multi pertransibunt et augebitur scientia (Muitos passarão, e o conhecimento aumentará).

quinta-feira, 31 de março de 2016

AS BARBAS DE DEUS


por Mario Sales

Em um seminário ontem a noite em uma loja Maçônica, lá pelas tantas o palestrante entrou pela seara da Cabala.
Como de hábito, dentro da maçonaria, não se faz distinção entre Cabala Judaica, de Luria ou de Moshe de Leon, com a Cabala Cristã, este Frankstein nascido da mente perturbada do pensador italiano Pico de la Mirandola, catequista cristão de primeira hora e que causou, a meu ver, com seu trabalho, um grave desserviço ao estudo do verdadeiro misticismo judeu que desembocou no que se chamou de Cabala Esotérica; mas isto é assunto para outra hora.
O que me chamou a atenção, no entanto, foi a colocação do conceito de que o Ain, o Nada de onde Tudo provém, é essencialmente doador e que ao homem resta a condição de eterno recebedor da Luz do Ain, não tendo maior papel na Criação a não ser receber cada vez mais e melhor esta Luz, pela retirada paulatina dos véus que inibem sua percepção.
Usando uma interessante metáfora na explicação das “cascas” que envolvem o homem, o palestrante comparava estas obstruções à véus que são jogados sobre um abajur em número cada vez maior e que aos poucos chegam a ocultar quase por completo a luz que dele emana.
O processo de avanço espiritual, concluía ele, seria a retirada de véu após véu, até que a luz pudesse novamente voltar a brilhar desimpedida.
Quanto a estas duas afirmações, de que Ain é apenas doador e que Malkuth e os seres que neste plano habitam são apenas receptores, (conceito que o palestrante deve ter colhido em algum dos milhares de textos sobre Cabala que existem pelo planeta hoje em dia, repito, sem a distinção clara daquilo que é genuinamente judeu e o que é oriundo da salada conceitual chamado Cabala Cristã), argumentei que, na minha opinião, (paradoxalmente usando um exemplo do esoterismo árabe-ocidental, a Tábua de Esmeralda), não via da mesma forma a relação , via Árvore da Vida , entre Ain e Malkuth.
Considerando que a Tábua ensina que “o que está em cima está embaixo e o que está embaixo está em cima” vejo a Árvore como uma estrada de duas mãos e Malkuth como o espelho de Deus, tese que encontra amparo em Luria, com sua teoria do Tikun Olam, ou o conserto do Mundo.
Como sabem, após a Shevira Hakelin, Luria diz que os cacos espalhados devem ser recolhidos e reunidos em um único conjunto, de forma a desfazer a dispersão das luzes causada pela explosão das sefirot pela fraqueza dos Vasos iniciais em suportar a Luz de Deus, na primeira tentativa de criação de Malkuth.
A Shevira Hakelin, ou Explosão dos Vasos, para Luria, causou uma situação tal que, sem o concurso e a colaboração de cada um de nós, o Universo e a Criação jamais serão de novo reorganizados, e cada vez que faço algo bom, praticando um ato de misericórdia, ajudando alguém que precisa, demonstrando compaixão, estou envolvido diretamente no processo de Tikun Olam, ou seja, estou reorganizando as luzes espalhadas, reunindo-as e restaurando a Unidade perdida. Para Luria, o ser humano comum, por mais simples que seja, pode e deve colaborar com o Ain na administração e aperfeiçoamento da Criação o que, ao contrário da tese defendida pelo palestrante ontem à noite, faz de Malkuth um lugar de intensa atividade, e não uma região passiva.
Assiah, o nível onde Malkuth se encontra é, pois, uma região viva e atuante.
Então, na minha opinião, melhor seria considerar a Árvore, como disse, uma via de duas mãos e Malkuth como o Espelho de Deus, como já defendi neste espaço mais de uma vez. 
Deus, em sua Sabedoria, não é inerte ou imóvel, como preconiza a visão filosofica de doutores e pensadores da Igreja Catolica, como Agostinho, mas evolui, como pensa o Hinduísmo e sua filha dileta , a Teosofia Blavatskiana, e parte importante desta evolução depende dos experimentos que realiza em cada Criação, em cada Universo que produz, sucessivamente.
Não uma única criação, um único Tzim-Tzum, dentro do espaço em seu interior, como ensina Luria, mas sucessivas criações, a seguinte sempre mais aperfeiçoada que a anterior, consequência das infindáveis informações colhidas por nós, suas sondas energéticas, que neste ambiente temporário de milhões de anos e em sucessivas encarnações ( sim, o Cabala aceita a reencarnação, a Guilgul Neshamot, a Transmigração das Almas, como descrita no Sepher Bahir e no Zohar) buscamos a retirada dos tais véus citados pelo palestrante, não apenas para receber mais luz, mas para melhorar a compreensão de Deus de si mesmo.
Talvez uma imagem mais didática seja a do espelho do banheiro durante um banho muito quente.


Toda vez que saímos do chuveiro após um banho muito quente que tenha produzido muito vapor, encontramos o espelho embaçado e precisamos limpar com as mãos o vidro para que possamos fazer a barba ou terminar nossa higiene matinal.
Deus cria, da mesma maneira, sucessivos Universos, e estes são como espelhos embaçados em que ele procura se olhar e se conhecer melhor. O tempo de duração de um único universo, de uma única experiência de Criação, entre muitas, é o tempo que Deus leva para “desembaçar o espelho” à sua frente. 
O Ain cria mundos e universos para se ver melhor.
Malkuth é o espelho que reflete a Luz que vem do Alto de volta à fonte, imagem reflexa essa sem a qual Ele, o Incognoscível, não poderia ver-se e conhecer-se melhor.
Penso na maioria do tempo como um filosofo Sankhya e acredito no aforisma desta grande escola hindu que diz "Ishwar Avydya”, ou seja “Deus não se discute”.
Com isso quero dizer que discutir a natureza de Deus não leva a parte alguma já que, como se disse, ele é, para nós, algo acima de nossa compreensão.
Discuto , entretanto, estes aspectos acima, animado pelo debate de ontem a noite, apenas porque isto diz respeito à vida humana em Malkuth, e não porque esteja em meio a uma investigação metafísica abstrata.
Se entendermos, como Luria propõe, que somos parte da solução, nossa responsabilidade e nossa auto estima aumentam, na mesma proporção que entendemos a importância de cada ato nosso, por menos importante que pareça, na melhoria da compreensão de Deus de si mesmo e no aperfeiçoamento do próprio Universo. Não somos mais vítimas de um destino, mas criadores do Destino, tão criadores quanto Deus em si já que somos suas extensões.
Todos nós somos, portanto, como diz lindamente o Martinismo, Agentes Divinos na Terra, e nesse sentido nunca poderíamos desempenhar papel de simples receptores da Luz divina, sendo nossa única obrigação, se aceitarmos esta compreensão, ficar cada vez menos afastados da luz de Deus, que nos banha, mas passivos, como alguém que se bronzeia ao sol, em uma praia.
Alguns dirão: não, não se trata disso, pois a exposição à luz de Deus pela retirada dos véus que interrompem o livre fluxo da luz divina pressupõe atividade e aperfeiçoamento e não passividade. Concedo. Só que esta explicação é, embora correta, insuficiente.
A melhoria de nossa espiritualidade não visa apenas o nosso aperfeiçoamento isoladamente, mas o aperfeiçoamento da própria criação, do conjunto do Adan Kadmon, a Humanidade.
Portanto, podemos buscar a progressiva retirada dos véus não pensando em melhorar a nós mesmos, mas ativamente praticando o bem, sem olhar a quem, melhorando o mundo, como um todo.
Quando a bondade em nós se tornar um hábito espontâneo, quando ver o outro não como um estranho, mas como membro de uma comunidade e de um tecido ao qual eu pertenço, tecido este que deve ser preservado por todos para que todos, inclusive nós mesmos, possamos desfrutar de um ambiente melhor, também estamos nos desfazendo dos véus que nos bloqueiam a visão e que impedem de vermos, não diferenças, mas semelhanças entre nós, seres humanos.
Isto também é Tikun Olam, a restauração da Criação, o trabalho de reunir os cacos resultantes da Shevira Hakelin.
Queria dizer , por último, que alguns véus não se tornaram véus apenas por deficiência da espiritualidade humana.
O fato de estarmos em Malkuth, no plano de Assiah, nos obriga a lançar mão de instrumentos de adaptação a este ambiente material, de densidade diferente, da mesma forma que usamos trajes de mergulho especiais que reduzem nossos movimentos e tolhem nossa capacidade de visão como os antigos escafandros, ao mergulharmos em águas profundas.
A maioria dos cabalistas e esoteristas supõem que as explicações das dificuldades do homem são ligadas a problemas de caráter e falta de evolução. Insisto que devemos considerar a possibilidade de que esta seja, como imaginam Hindus, o físico Marcelo Gleiser e alguns Cabalistas, uma criação imperfeita, que não permite ainda maior liberdade às suas "sondas divinas de investigação", nós, seres humanos, tendo-as feito de tal forma mal acabadas que enfrentam graves dificuldades de adaptação na troca entre planos como Atziluth e Briah, Briah e Yetzirah e finalmente, Yetzirah para Assiah, aonde se encontra Malkuth.




Em vez de supor que as dificuldades do homem sempre são consequência de suas opções, consideremos misericordiosamente, que nós humanos fazemos o que podemos dentro das condições que esta criação em particular nos permite fazer, e que mais do que isto, neste atual modelo, seria impossível realizar.
Esta visão, de que o homem é o culpado de sua dor e não a Criação em aperfeiçoamento que o cerca, é bastante judaico-cristã. Culpa e pecado são conceitos caros a estas duas culturas.
Na verdade, sem tirar de cada pessoa sua responsabilidade por seus atos, insisto que temos limitações e que precisamos ter tanta compreensão e misericórdia com os outros quanto conosco, nesta difícil caminhada que é a reconstrução do Universo, deste em que ora estamos, bem como de todas as outras experiências de Universo que o Criador, o Ain, em sua imensa curiosidade sobre Ele mesmo, produzirá, ao longo das eternidades.
Por muito tempo ainda Deus esfregará o espelho da criação com suas mãos para retirar o vapor que o encobre apenas para ver-se, ou talvez terminar de fazer sua própria barba, a divina barba do Criador.

domingo, 27 de março de 2016

A BÊNÇÃO DO DEMÔNIO



Por Mario Sales




É dito no prefácio do Sepher Yetzirah comentado pelo rabino Arieh Kaplan, que “recomenda-se ao estudante de Cabala jamais faze-lo sozinho, já que em determinado momento do estudo, é preciso que a presença de um acompanhante evitará confusões entre o que é real e o que não é”.



Esta afirmação, que estimula a imaginação do leitor, deve ser lida com a prudência necessária.
Eu tenho nesta fase da vida um companheiro de estudo pelo que agradeço a Deus todos os dias. Estudar acompanhado, ter alguém para discutir os detalhes da leitura, profundos ou banais, torna lúdico o que seria sem esta companhia, insuportável.
E no frigir dos ovos, ler em conjunto clareia a mente e melhora a percepção. Ainda mais que, como no meu caso, o interlocutor e companheiro de leitura conhece o assunto mais do que eu.
Ao ler acompanhados, evitamos o engano, a confusão entre impressões falsas e corretas, entre interpretações equivocadas e outras mais sensatas, em consonância com o autor.
Não quer dizer apenas que evitamos que, ao realizarmos materializações ou invocações, e nos deparemos com estranhos seres ou estranhas visões, o fato de testemunhá-las a dois ou três tornaria tal experiência mais fáceis e suportáveis.
Acreditem, não são.
O que a leitura em grupo de textos esotéricos permite, isto sim, é aumentar nossa lucidez sobre os assuntos discutidos e estudados. Vejo por mim mesmo: embora a parte poética me encante, não me satisfaz. Ás vezes até atrapalha.
Em duas ou três pessoas isto fica mais evidente. O diálogo e o estudo em conjunto evita digressões como esta, aqui e agora.
Nem sei mais sobre o queria escrever.
Aliás, frequentemente enveredo por um pensamento e um encadear de idéias que me distrai como se me fascinasse por uma planta no meio do caminho e esquecesse da própria caminhada.
Paciência: não tenho prazos nem compromissos de velocidade, mas preciso aprender a manter o foco.
Talvez seja isso que o Ocultismo retire do Esoterismo puro e simples: o foco. E é isto que a Lucidez no trabalho esotérico precisa retomar.
Existe um autor rosacruz, Joshua Maguid, Ph.D., FRC, que cita Dion Fortune, (codinome de Violet Mary Firth Evans), ao dizer que a “Kabbalah prática” (ou Ocultismo, no Ocidente) “consulta à teurgia e à mágica, tentando influenciar o reino Divino e produzir efeitos práticos no mundo material. A alguma extensão, entretanto, estas distinções podem ser um tanto arbitrárias. Alguns autores modernos na tradição Hermética ou mágica vêem a mágica mais como um sistema do desenvolvimento espiritual melhor que um exercício do poder pessoal”.
Quanto a este trecho sublinhado tenho minhas dúvidas.
Se tomarmos Esoterismo como a prática de estudos teóricos da Tradição e o Ocultismo como a prática desses conhecimentos com a intenção de conseguir certos efeitos na realidade, penso que nenhuma pessoa, ninguém, dedicar-se-ia ao Ocultismo apenas para aumentar sua autopercepção, seu autoconhecimento.




Quando, e se eu faço um Golen, por exemplo, através de certas técnicas meditativas do Sepher Yetzirah, para me ajudar em meu laboratório alquímico, de forma que ninguém tenha acesso ao meu trabalho e mesmo assim eu tenha um auxiliar, existe um objetivo meramente administrativo nesse feito.
E esta é a única forma de usar o Ocultismo da forma correta. Nenhum cabalista sério faz um Golen apenas e tão somente para mostrar que pode fazê-lo. Nenhum Cabalista busca nesta realização, glória pessoal ou envaidecimento. Quer apenas ajuda com os inúmeros trabalhos que um Ocultista judeu ou não, tem em seu metiê. Daí ele cria um androide esotérico para isso. Existe uma razão prática para tal.
Doutro modo, invocar seres astrais, alterar o clima, influenciar pessoas a distância, que outra finalidade pode ter do que exercer Poder sobre tudo e sobre Todos?
Não, Ocultismo, via de regra, não busca aperfeiçoamento espiritual. Dion Fortune está errada. Ocultismo, para a maioria dos aprendizes de feiticeiro espalhados pelas sombras, é uma ponte para o prestígio, sabe-se lá em que meio, uma maneira de ter domínio principalmente sobre personalidades imaturas, prontas a curvarem-se ao primeiro Mago Simão que apareça.
Esoteristas amadurecidos não precisam de efeitos teatrais para confirmarem o que sentem em seus corações, estão livres da maldição da ignorância descrita em João 48:8:
“-Se não virdes sinais e milagres, não crereis. ”
Aliás, pessoas equilibradas não buscam nem mesmo mestres, não precisam de mestres, de Gurus. Pode parecer paradoxal um hinduísta falar estas coisas, mas não posso evitar de pensar da maneira que aprendi e com os elementos que acumulei ao longo desta existência. 
E a minha experiência é que pessoas que precisam de mestres não estão prontas para serem discípulas.
O tal ditado que diz que “quando o discípulo está pronto...” por “pronto” quer dizer amadurecido o suficiente para não ter falsas expectativas sobre qualquer relação de aprendizado. Desfruta desta relação aquele que não transfere ao seu Mentor o peso de carregar o esforço de ambos apenas em suas costas.
E assim segue a existência, com pessoas transferindo responsabilidades a outras que fingem recebe-las apenas para manter aquele status quo de dependência.
Uma coisa é consolar aqueles que sofrem e necessitam de consolo. Outra é querer tirar o direito de cada um de passar pelas dificuldades que a vida lhes apresenta.
Não digo que a convivência com homens sábios não seja útil ou necessária. Ao contrário, a companhia desses indivíduos, nem que seja no mesmo planeta já é, em si, uma bênção indiscutível.
Falo de atitudes internas, de posições mentais e psicológicas. 



É isto que destrói a possibilidade da relação de discipulado.
Quando falamos que é preciso entregar-se ao Guru, render-se à sua orientação, dizemos isto no sentido de que “só Shiva é Guru” e aquele homem ou mulher que aceitamos como nosso orientador e que nos aceita como seu orientando, representa a manifestação de Shiva no corpo de um ser humano. Não ele, mas aquilo que ele representa, deve ser nosso foco. É isto que o Guru é: um foco, um centro de Mandala no qual nos concentramos para chegar a um estado de concentração mais perfeito.


O esforço na busca desse estado perfeito de concentração, entretanto, é nosso, apenas nosso. Nenhum Mestre verdadeiro fará por seu discípulo aquilo que ele, discípulo, precisa fazer por si mesmo.
Não poderia ser de outra forma.
É uma relação entre almas evoluídas, amadurecidas, lúcidas.
Lucidez é fundamental. 

E esta é a simbologia oculta em Satã.


Satã é também Lúcifer, o portador da Luz, aquele que cai por que pensa por si mesmo, por que opta por gerir seu próprio destino e assume as consequências disto.
Uma interpretação esotérica do conceito de Lúcifer deve por isso ser também aquela que dá a ele o caráter simbólico da parte de Deus que mergulha na carne, na criação material, e mudando de meio, inverte seu sinal e modo de manifestação. Satã é um Anjo. Todo Anjo é uma extensão do Altíssimo, o Ain, o Nada que ainda assim, parafraseando Blavatsky, é o Tudo.
Lúcifer, com toda a sua riqueza simbólica e aspecto terrível, também é uma extensão de Deus.
E não admira que esteja cercada do Fogo por todos os lados, seja na sua forma ocidental cristã, como senhor dos infernos, seja na sua apresentação nos mitos gregos como Hefesto, ou nos mitos romanos como Vulcano.



É o fogo o elemento da transformação, que dá sabor ao alimento, que transforma as substâncias que a ele são expostas. Do mesmo modo a Lucidez é um fogo que tudo transforma, que queima as máscaras e revela a face das coisas e das pessoas.
Ela destrói as trevas pois todo Fogo gera Calor e Luz.
E se existe algo do que necessitamos desesperadamente nesta existência incerta e tortuosa é de Luz, da Lucidez que advém desta Luz, ao penetrarmos relacionamentos ou textos.
Existem duas formas de iluminar o Caminho: pela Intuição e pela Razão. A intuição é fenômeno de conexão com o Divino, o Uno; a Razão é a conexão com Satã, o que divide e analisa. Iluminar, muitas vezes, é ver mais claramente as partes componentes de um composto.
Em relação ao exercício interpretativo e de exegese das motivações por trás dos comportamentos das pessoas e do significado dos textos, mais que inextrincáveis que nos chegam, é da Lucidez, e neste contexto, do toque e da bênção do Demônio, que precisamos para avançar em uma floresta de personalidades e práticas todas rotuladas inadequadamente sob o mesmo nome: esoterismo.
Na verdade, o Demônio não está em nós, nós somos o Demônio, fagulha de Deus que mergulha na Carne, anjo que cai e se transforma na Humanidade que habita Malkut.
Nossa marca dessa herança, que só verdadeiros esoteristas entenderão, é a Razão que está em nós e que, quando usada chamamos de Lucidez, a capacidade de lançar Luz sobre todas as coisas e pessoas. 


Guaita


Confirmando estas reflexões, em “O Templo de Satã”, o 2º ensaio de cinco chamados de “Ensaios sobre Ciência Maldita”, o jovem Marquês Stanislas de Guaita escreve, no capítulo 1:
“No sentido vulgar – familiar a todos aqueles que a ciência divina não conta entre seus adeptos – a serpente do Gênese simboliza o Diabo, o espírito do mal, personificação de Satanás.
-Satanás? O diabo? O Maligno?...vamos, você quer que eu ria! Quem jamais o viu, espectro de fumaça? Onde aparece, senão na névoa das imaginações perturbadas e doentes ou no caleidoscópio obscuro das almas fracas e timoratas?... Alguma vez tomou forma acessível aos sentidos, ao testemunho exclusivo de que faço profissão de crer? Não; só para Deus, seu tirânico antagonista, só para Deus, seu carrasco impiedoso, a presença de Satanás se manifesta no Universo...o diabo, senhor, poderia dizer-me aonde mora?
Ao materialista que assim fala ninguém lembra de replicar com simplicidade: - Ele habita em você. ”
Verdadeiros esoteristas devem assumir sua ascendência e suas origens. Ele, Satã, com seu atributo mais exuberante, a Luz, a Lucidez, nos provê a razão que tudo queima e que extrai sentido de todos os acontecimentos.
É a Lucidez que separa, com sagacidade, Fantasia de Imaginação; dá, além disso, instrumentos de navegação ao esoterista, caso este dê o passo em direção ao Ocultismo.
Não é possível atingir refinamento esotérico, ou proficiência no seu braço prático, o Ocultismo, sem antes munir-se de Lucidez.
Esta mesma Lucidez que podemos chamar também de a verdadeira bênção do Demônio em nós.

domingo, 20 de março de 2016

PARA QUE TANTO SEGREDO?


por Mario Sales FRC, SI, MM




"Até que nem tanto esotérico assim
Se eu sou algo incompreensível
Meu Deus é mais
Mistério sempre há de pintar por aí"

Gilberto Gil






 (Em 31 de março de 2014 publiquei um ensaio chamado "Para Que Tanto Segredo?" que discutia aspectos práticos da lida e exegese de textos esotéricos. Agora, no próximo dia 28 de abril, deverei fazer uma palestra em uma Loja Maçonica sobre o mesmo tema, e como tal revi e fiz algumas correções no texto original. Sendo omo é um tema sempre importante, atrevo-me a republicá-lo, agora revisto.)

Quando entrei na senda mística certos conceitos para mim eram absolutamente indiscutíveis e os aceitei de modo dócil, sem questionamento. O mais óbvio de todos estes conceitos foi o de necessidade de sigilo quanto àquilo que eu ia estudar.
Ouvi e li várias declarações, nestes últimos quarenta anos de estudos esotéricos, sobre os perigos de se revelar ao chamado "mundo profano" os conhecimentos que estavam sob nossa guarda, nós, os protetores da sabedoria da tradição do chamado "resto do mundo", sabedoria esta que, pressupunha eu naquela época, o tal "resto do mundo" queria  desesperadamente descobrir, e só não o fazia graças aos nossos esforços de resguardar estas informações atrás de códigos, símbolos e procedimentos os mais variados.
Nos primeiros anos, achei que este precioso conhecimento se compunha de palavras mágicas as quais, quando pronunciadas, modificariam a natureza da realidade de modo súbito e vantajoso. Porém, fora um honroso exemplo, não foi isso que aprendi.
Depois, supus que certos poderes maravilhosos como a projeção astral, a telepatia, a telecinese, depois de alguns anos estudando nestas chamadas escolas de mistério, se tornariam parte integrante do meu cotidiano, após um conjunto de treinamentos perfeitamente delineados; mas isto também não ocorreu.
Achei então que se tratava de uma deficiência e uma peculiaridade pessoais, e que devia existir alguém, em algum lugar, dentro destas Ordens a que eu pertencia, que dominava estas artes, e que não eram poucos os que o faziam. Apenas eu, era minha impressão, não conseguia.
Após anos e anos frequentando corpos afiliados e conversando com outros membros como eu, percebi que, se algum deles tinha algum dom extraordinário, proveniente de seus estudos esotéricos, este era restrito, de manifestação esporádica, episódica, geralmente motivada por uma forte e imperiosa necessidade pessoal.
Nada tão dramático que fizesse diferença em uma situação cotidiana de maneira constante, frequente.
Os efeitos especiais que eu via em filmes de ficção nada tinham a ver com o dia a dia da minha vida de esoterista, muito mais ligada a leitura de textos os mais herméticos possíveis, ou contemplar e tentar interpretar símbolos que tinham sido feitos três, quatro séculos atrás, apenas para manter secretas informações importantes sobre o mundo dos iniciados.
Que informações eram estas a serem mantidas em segredo, eu nem sempre estava certo.
Na maioria das vêzes, a interpretação destes símbolos me trouxe interessantes noções acerca da natureza da vida, todas muito filosóficas e em nada objetivas ou práticas, mostrando que a interpretação destes símbolos não me revelaria poderes especiais quaisquer, mas apenas e tão somente valores morais e éticos, demasiadamente genéricos para resultar em consequências operacionais.
Talvez no passado, em que a opinião sempre valeu mais que a experimentação e a comprovação, onde o cientista era mais um escritor que um pesquisador, informações de cunho meramente conceituais fossem realmente interessantes e merecessem o esforço de debruçar-se sobre elas dias e dias.
Hoje, pragmaticamente falando, não consigo identificar nada de prático no estudo de conceitos morais genéricos, e estudá-los para mim é somente um deleite e um prazer estético, acima de tudo algo que gosto de fazer, que me dá prazer intelectual, mas nada, absolutamente nada além disto.
Não consigo ver nenhum ganho prático no estudo destes textos. Parêntese: não quero dizer com isso que eu como pessoa não melhore minha sensibilidade e espiritualidade com eles. Ética e espiritualidade na vida são coisas sempre necessárias. Podem e devem ser discutidas, porém sem segredos ou mistérios, de forma franca, clara. São valores importantíssimos para a sociedade. Fecho o parêntese. 
Não são, entretanto, como “chaves” de uma casa, termo constantemente usado em esoterismo, que colocadas na fechadura correta, abrem com facilidade uma porta real.
Ninguém lê um texto de Martinez de Pasqually ou de Jacob Boheme como se lê um manual de um sistema de som de um rádio do nosso automóvel.
Pela refinada natureza destes assuntos, não se colhe de textos esotéricos informações realmente aplicáveis ao cotidiano banal, apenas noções vagas e metafísicas da natureza das coisas, (a maior parte do tempo, senão todo ele) invisíveis aos nossos olhos comuns.
Estas considerações vêm a mim enquanto a água do chuveiro desce pelo meu corpo.
Penso: para que tanto mistério? O que escondemos e porquê? Aliás, hoje em dia, de quem escondemos o que supomos esconder?
Quem se interessa pelo que está escrito em livros antigos e empoeirados? Estes mesmos livros, entretanto, continuam a ser reimpressos para satisfação de mentes que provavelmente os lêem sem compreender totalmente seu conteúdo, porém sofrem de uma estranha doença intelectual que os faz fascinar-se pelo incompreensível, pelo texto mais obscuro. Aliás, quanto mais incompreensíveis, melhor. Sim, existem pessoas que tem um estranho prazer em ler, sem grande interesse em esclarecê-las, coisas incompreensíveis.
Não é o meu caso, mas conheço muitos.
Deliciam-se em dizer que encontraram textos de significado "muito profundo", tanto "que não conseguiram alcançá-lo" e, obviamente, são incapazes de explicar algo sobre o texto, terminando sempre com a afirmação-explicação que tudo resolve e que toda crítica afasta:
"-Trata-se de um texto extremamente esotérico."
E em volta, ouve-se um "Ah!", de compreensão e aceitação, que evita discussões ou interrogações indigestas pois, aparentemente, não há entre estes estranhos e tão numerosos seres humanos nenhum interesse em entender o que está escrito ali, em compreender verdadeiramente a mensagem que estava sendo passada quando, quem escreveu o tal texto esotérico, o fez.



E não devia ser assim.
Porque se eu escrevo um bilhete, uma carta ou um livro, minha intenção é descrever algo para alguém.
Existem, portanto, três elementos nesta equação: eu que escrevo ou descrevo uma ideia; o texto aonde faço esta descrição; e, por último, a pessoa que, anos depois, lerá meu texto. Deduz-se que, ao escrever o que escrevi, minha intenção era passar adiante uma informação para aquele que me leria, horas, anos ou séculos mais tarde.
Em suma, quem escreve quer revelar alguma coisa, não ocultar.
Mesmo quem, sendo um esoterista, reveste seu texto de aspectos simbólicos os mais variados, para protegê-lo que seja de olhos menos dignos, não objetiva impedir a compreensão daquilo que escreve com esta manobra, mas dificultar uma compreensão fácil, compreensão do texto esta que, em última análise, é a verdadeira intenção daquele texto.
Um texto esotérico é, mesmo sendo esotérico, um texto. Foi feito por alguém, em alguma época, de forma a preservar e revelar, repito, e não esconder, determinada concepção de mundo, mesmo que seja uma concepção pouco objetiva, de natureza mais filosófica, ou mais mística talvez.
O texto, entretanto, foi feito para ser compreendido, e se não o é, (mesmo que as chaves de compreensão sejam dadas, seja por dificuldades interpretativas intransponíveis, seja pela barreira linguística e histórica), é, ao fim e ao cabo, inútil para sua principal finalidade, qual seja, transmitir um determinado conhecimento para outrem.
Além disso, o conteúdo deste conhecimento também interessa na motivação de quem se dedicar a interpretá-lo e traduzi-lo para nossa visão e compreensão contemporânea.
Logo, como exemplo, concluir, depois de horas de leitura de um texto secreto, que ele afirma, em síntese, que a Natureza de Deus é incompreensível, convenhamos, não traz nenhuma informação retumbante ou mesmo útil.
Não seria nem mesmo necessário que esta verdade fosse disfarçada em símbolos ou esoterisada.
A questão da Natureza de Deus não tem quaisquer implicações práticas na vida cotidiana, seja do ateu, seja do crente. 
E é um tema cuja importância já foi discutida milênios atrás com conclusões semelhantes a esta que enunciei acima.
O mundo hoje está cada vez mais objetivo e pragmático. As pessoas são "acusadas" de quererem "apenas" resultados práticos de seus esforços intelectuais.
Aí eu me pergunto: o que há de pecaminoso nisso?
Porque a busca objetiva de resultados práticos, pode ou tem que ser, contrária ao trabalho esotérico?
Estudemos como exemplo a história dos Ellus Cohen, uma conhecida Ordem Esotérica, não maçônica, mas formada apenas por Maçons de Lyon, na França. Sua história e formação começa em 1774, com práticas teúrgicas, que eles chamavam "O Culto", invocando um ser na época entendido como um anjo, que se materializava durante a reunião.
Vemos, aqui, esforços práticos e palpáveis.
A preperação para este evento com uma sequência de jejuns e orações, os encantos e os círculos que eram traçados no solo, as invocações, tudo era parte de uma estratégia cerimonial que visava abrir, segundo se conta, um portal interdimensional, e permitir que um ser (de natureza, na maioria do tempo, invisível), se tornasse visível, e, uma vez materializado, falasse com sua boca sobre verdades universais e espirituais, que eram tomadas como revelações indiscutíveis da natureza do Universo, mesmo que fossem um relato de apenas um ser, Anjo ou não.
Era um esforço demasiado grande para um resultado pífio, embora do ponto de vista circense, espetacular.
De qualquer forma, o esforço geraria resultados práticos, fossem ou não interessantes.
Sim, buscava-se o espetáculo no passado e quanto mais espetáculo mais profundo achava-se que se ia.
Hoje sabemos que não é assim.
Atualmente, até entre os místicos, as almas estão mais pragmáticas, mais objetivas, e definem com mais clareza o que é e o que não é importante na busca por uma mais perfeita espiritualidade. 
Objetividade é economia, discrição, precisão.
O pouco com Deus, é muito.
A experiência divina, sabe-se hoje, a consciência da Presença Divina, a Shekinah, é silenciosa, discreta e interna, intransmissível, inviolável, inquestionável para quem a experimenta. Não precisa ser escondida através de véus ou textos rebuscados já que é esotérica por sua própria natureza.
Então, porque os textos sobre a busca espiritual, os chamados textos esotéricos, são tão esotéricos às vêzes?
Porque nossos textos estão há anos sendo lidos em segredo e não sendo publicados como material de leitura comum?
Papus, o médico Gerard Encause, esoterista francês do século XIX, achava que se jogássemos nos rostos dos profanos os chamados textos secretos, estes, após lerem algumas folhas, os deixariam de lado, com desinteresse, pois não veriam nenhum sentido, nem extrairiam deles qualquer significado ou ensinamento.
É claro que mesmo textos que nada tem a ver com o sagrado e que por definição são profanos, tem seu próprio esoterismo.
Sem uma explicação coadjuvante, chamada "chave" do código em que estão redigidos, textos médicos, de física, de química molecular são ininteligíveis, mesmo que em nada e por nada discutam temas metafísicos ou espirituais.
Assim ocorre, da mesma forma, com textos esotérico-ocultistas.
Ninguém, a não ser alguns malucos como eu, tem qualquer interesse em lê-los, quanto mais decifrá-los.
E quando os lêem, o fazem com tanta inépcia e ineficiência que só chegam a falar sobre eles coisas das quais não tem certeza, mas que supõem, sabe-se lá porque, esteja em suas páginas.
Para não demonstrarem ignorância até inventam sentidos inexistentes para pessoas que ouvirão seus relatos com a mesma perplexidade e admiração daqueles que nem chegaram a ler tais textos.
Não acredito que esteja dizendo absurdos e chego mesmo a afirmar que você que me ouve e que frequenta lojas maçônicas ou corpos afiliados da AMORC já testemunhou pessoas e cenas como a que descrevi.
E agora peço a tolerância e a compreensão de todos para a próxima afirmação porque a mesma decorre de quarenta anos no meio esotérico: essas pessoas, que lêem textos esotéricos, como o Bardo Todol, o livro dos Mortos Tibetano, ou as Estâncias de Dizyan, base do livro A Doutrina Secreta, de Helena Blavatsky, mas não os compreendem e que, em seguida, inventam interpretações desses textos que não compreenderam, são às vezes, mesmo, consideradas intelectuais destacados em seu meio.


ESTÂNCIAS

E assim o equívoco se mantém e se propaga.
Nada de objetivo, nenhum resultado prático se obtém de tais leituras ou de tais discussões.
Escolas esotéricas deveriam ser locais de formação de homens e mulheres mais sensíveis, mas também mais perspicazes, capazes de mais pensamento crítico e analítico. À exemplo de autores como Raymund Andrea, antigo autor rosacruz, ou Nicola Aslan, na minha opinião o mais produtivo e equilibrado autor maçônico contemporâneo.
Eu, por exemplo, aprendi a ler com devoção os textos clássicos. Por ingenuidade, li com devoção muitos textos não clássicos, feitos por pessoas em que eu depositava confiança, ou avalizados por instituições em que eu depositei a mesma confiança.
Eram textos muito bonitos, profundos e sensatos.
Ou pelo menos me pareceram na época.
Depois, com o tempo, vi que nem todos estes textos não clássicos poderiam ser chamados de sensatos, e que alguns, inclusive tinham sua dose de Obscurantismo.
Uma campainha tocou em minha cabeça, e diminui a velocidade como os consumia, pensando cada linha, cada trecho.
Então, além de perceber que pela profundidade da experiência mística esta não poderia ser descrita apenas através de textos, e que, além disso, nem todos os textos eram ou são produto da inspiração divina, mas sim de pseudo-esoteristas, uma necessária avaliação crítica destes textos passou a ser rotina em minhas leituras, para ver o que valia ou o que não valia a pena ser lido.
Muita coisa dita secreta, percebi, não possuía nenhum segredo a ser descoberto. O rótulo de secreto apenas buscava dar importância a textos sem importância alguma.
De novo: o conhecimento esotérico não o é porque está escondido em um cofre, não corre o risco de ser roubado. Hoje enfrenta a mesma situação da mensagem do Cristo quando exposta por Paulo aos Gregos.
Em suas viagens, o apóstolo enfrentou perseguição, risco de morte física, agressões. Na Grécia, entretanto,  apenas desdém. Sua fala foi considerada banal e desinteressante.
Disse ele que foi seu maior fracasso como pregador
(Cito Atos dos Apóstolos, capítulo 17, versículos 32 e 33 –
“E, como ouviram falar da ressurreição dos mortos, uns escarneciam, e outros diziam: ‘acerca disso te ouviremos outra vez’ e assim Paulo saiu do meio deles”.)
Estamos todos nós, esoteristas, como Paulo diante de uma sociedade cética como a sociedade grega daquela época.
Poucos, muito poucos, se interessam pelo que nos interessamos. Pouquíssimos querem saber o que sabemos. E isto, gostaria de argumentar, porque principalmente não temos nada de objetivo a oferecer.
É comum defenderem, até por um viés religioso, a importância da fala de Paulo Apóstolo, em detrimento da descrença dos céticos Gregos. Mas como estou em uma loja maçônica, em um meio esotérico e não religioso, arrisco-me a fazer uma defesa às avessas, das razões do desinteresse dos gregos pela fala de Paulo.
A sociedade contemporânea, como falei antes, é cada vez mais científica e objetiva, de forma que as pessoas em geral, como os Gregos, gostariam de sentir mais solidez nas afirmações dos esoteristas. Esoteristas não estão isentos de ter um discurso e um comportamento que faça sentido para aqueles que os ouçam e os conheçam.
O Mistério pelo Mistério, cada vez mais vale menos na captação e fidelização de membros em escolas esotéricas, seja na Maçonaria ou na Rosacruz, AMORC.
Cada vez mais as Ordens Esotéricas amargam números menores de membros e se a abordagem do assunto não mudar, suponho que esta seja uma tendência irreversível.
E quando falo em mudança de abordagem, falo em tornar os ensinamentos mais diretos, mais focados em resultados palpáveis, pari passo com procedimentos que por sua natureza mais profunda são mais demorados, como a mudança alquímica da personalidade, que só ocorre ao longo de longos períodos de tempo.
Na AMORC ouço frequentemente a queixa de que os corpos afiliados estão sem membros. Na Maçonaria, vejo aprendizes, membros do primeiro grau, abandonarem a Ordem por tédio.
Mesmo assim o modelo não muda, por inércia mental ou por falta de visão.
E ainda se acredita que a simples ideia de segredo ou de ensinamentos ditos secretos possam manter as pessoas interessadas.
O que é secreto, será secreto até ser revelado. E é bom que a revelação não seja uma frustração para o interessado.
O mundo mudou. As pessoas não se deixam mais seduzir por afirmações sem comprovação por muito tempo.
A não ser que sejam absolutamente desprovidas de inteligência.
A ignorância não é um pecado, mas muito menos é um elogio ou uma virtude.
Todos nós, em sã consciência, queremos mais das Ordens a que pertencemos.
Queremos ensinamentos práticos, operacionais, técnicas que possam ser aplicadas no cotidiano e que, não sendo mágicas, pelo menos possibilitem uma melhora de nosso desempenho profissional, social e humano.
Só isto já justificaria nossa filiação.
E como fazê-lo? Com a ênfase didática na experimentação, na verificação em templo dos princípios que descrevemos em nossos textos, rosacruzes ou maçons.
Para rosacruzes, demonstrações das técnicas que são relatadas nas monografias, grau a grau; entre os maçons, seminários dinâmicos, sem a monótona repetição de palavras ou de instruções, deixando que as colunas se manifestem de modo livre e espontâneo, sobre temas relevantes e fornecidos previamente.
É preciso deixar o Maçon falar e o Rosacruz experimentar suas idéias e conceitos.
Os chamados discípulos precisam de espaço para elaborarem suas dúvidas e questionamentos, sendo o papel dos irmãos mais antigos apenas orientarem o desenvolvimento destes estudos, de forma a preservar um crescimento do espírito do Irmão ou Irmã livre de chuvas e trovoadas, oferecendo-lhe um ambiente acolhedor para o aprendizado e não o rigor de uma disciplina estúpida e inútil, que desencoraja o questionamento e, portanto, o crescimento espiritual e intelectual.
Nas palavras do educador inglês Sir Ken Robinson, "a educação está matando a criatividade". A educação esotérica segue o mesmo caminho.
O esoterismo que se baseia na ilusão de que quanto mais oculto melhor aposta na ignorância e sufoca a capacidade de seus membros de colaborarem como o crescimento de suas Ordens.
Sir Robson chama a educação do terceiro milênio de Educação Botânica, que trata o aluno, o discípulo, não como um papagaio repetidor, mas como uma planta que se desenvolve sozinha, necessitando apenas de condições adequadas dos três S: solo, sol e sombra, para fazê-lo.
Nós precisamos deste impacto e desta revolução educacional em nossas Ordens, de forma que valha a pena para cada membro sair de suas casas e ir, com satisfação, até o seu corpo afiliado ou sua Loja certo de que, naquele encontro, crescerá mais um pouco como ser humano e como esoterista.
A alternativa é testemunharmos (e sinceramente, espero estar enganado) o desaparecimento, por completa obsolescência, destas Ordens que foram o reduto de grandes místicos e esoteristas por muitos séculos até hoje.

quinta-feira, 10 de março de 2016

A VOZ DO SILÊNCIO

Por Mario Sales, FRC, SI, MM


As reflexões ligadas ao ensaio “O Certo e o Fácil” me levaram a alguns outros aspectos da pratica mística e das fantasias ligadas a esta prática.
Freud identificou já há cem anos a tendência dos analisados desenvolverem devoção e, certas vezes, atração pelos seus analisadores, num fenômeno que ele chamou de “Transferência”, ligado a situação de fragilidade em que os pacientes em terapia se encontram, com a suposição da existência de um poder e de uma segurança anormais naquele que cuidaria em princípio de sua dor psicológica. 
A “Contra transferência” seria o fenômeno do Analista que se deixa envolver pela fantasia de seu analisando e crê na possibilidade deste analisando e ele desenvolverem uma relação até mesmo física baseada nestes sentimentos nascidos da circunstância fugaz de influência e poder que ele teria sobre seu cliente.
A transferência, hoje é possível extrapolar, embora seja um fenômeno bem definido e relativo ao processo analítico, pode acontecer em outros tipos de relacionamento humano.
Relacionamentos com líderes espirituais, professores, orientadores de tese, clientes e seus médicos, às vezes estão sujeitos às mesmas fantasias baseadas em falsas impressões e na crença de que, a pessoa a sua frente é um ser humano anormal e dotado de saber transcendental.
O professor Leandro Karnal, Historiador da Unicamp e no momento um dos palestrantes mais cotejados e divulgados na Internet, desabafou no Facebook em sua página que sentiu-se embaraçado ao receber propostas as mais variadas, em função de sua atual fama, de natureza sexual e matrimonial de ambos os sexos, fora o curioso pedido de ajuda para a compra de uma, pasmem, dentadura.
Obviamente, isto tem a ver com a errônea conclusão de que seu conhecimento intelectual, sua habilidade em raciocinar, fruto do esforço de anos dedicados a docência e leitura de vários textos, por prazer e por necessidade, façam dele detentor de algum tipo de capacidade sobre humana em todos os campos da existência, uma fantasia descabida, mas não inesperada de pessoas com menos elaboração intelectual e, sem dúvida, psicologicamente imaturas.
E é aqui que chego ao meu tema, neste ensaio.
Uma pessoa que, intuitiva ou tecnicamente, conheça a capacidade de induzir pessoas, valendo-se desta fragilidade da mente humana, a acreditar que ele não é apenas bom, mas excelente; não é apenas inteligente, mas sim dotado de uma sabedoria inigualável; ou que, como domina bem a oratória em algum campo, é a maior autoridade neste campo e em qualquer outro, pode facilmente controlar e manipular uma ou várias pessoas usando clichês psicológicos e se aproveitando da imaturidade emocional de grande parte da humanidade.
Se o faz de modo consciente, entra na categoria dos criminosos psicológicos, mesmo que não mate ninguém; são líderes do mal, já que usam sua verve e seu carisma para levar um ou vários indivíduos a atenderem seus próprios interesses egoístas, por vaidade, interesse financeiro, ou ambos.
Esse fenômeno não é místico, mas psicocomportamental, e alguém ateu poderia lançar mão deste recurso sem problema, como acontece diariamente na política, nas finanças e nas relações sociais.
Quanto mais no meio religioso.

Aleister Crowley

Portanto, casos como o de Aleister Crowley, ou o falso conselheiro de John Dee, Edward Kelley, quinhentos anos antes, ou do pastor Jim Jones, (o qual levou a morte 918 pessoas, entre elas 270 crianças), ou mesmo dos líderes pentecostais que infestam as televisões em todo o planeta, são apenas uma das formas desta maligna estratégia se manifestar.
Tanto quanto a religião, o esoterismo oferece um ambiente favorável a demagogos, manipuladores da mente de outras pessoas e oportunistas. O simples adjetivo "esotérico", às vezes, de per si, autoriza comportamentos absurdos e descabidos.
Portanto por ser uma Ordem Esotérica um agrupamento de pessoas, do mesmo modo que as chamadas Igrejas de franquia, não exime aquele que dela se aproxima de fazer uma analise racional, dentro do possível, dos discursos e praticas deste grupo, antes de fascinar-se ingenuamente com vestes ritualísticas, aventais coloridos e ambientes na penumbra aonde velas, que podem ser as chamas do charlatanismo, tremeluzam.
A prática mística deveria ser um atividade avançada, do ponto de vista pessoal e psicológico.
Religiões querem ser planetárias mas só o Misticismo Verdadeiro o é.
É preciso esclarecer que muitos estudantes rosacruzes se confundem com a ideia de Ordem Esotérica, por não saberem exatamente do que se trata e, como tal, tentam compreendê-la a partir de um ponto de vista pessoal, e para tal, utilizam o modelo da religião a que pertençam.
Isto torna ainda mais difícil a aceitação de valores planetários ou transreligiosos, que são partes da perspectiva mística, posto que, do ponto de vista esotérico, religiões e crenças são apenas as vestes antropológicas locais, geograficamente determinadas, da necessidade íntima de todos de um contato mais perfeito com o mais profundo dentro de si mesmo. Essa região íntima presente em todos, cuja localização jamais foi objeto de consenso, é uma dimensão transpsicológica, imaterial e, com certeza, não intelectual. Para quem gosta de Cabala, seria a região de Chokmah, a 2ª sefira da árvore da vida, sede da sabedoria.
Como o Google espiritual, a Chokmah interna nos conecta com a sabedoria de todo o universo, libertando-nos do esforço de explicar, por nós mesmos, aquilo que é ou que está diante de nós.
Só a Sabedoria nos liberta dos equívocos ligados a crença de que nosso Ego e nossa consciência é independente do Universo que nos cerca, ou nas palavras do neurocientista kardecista, Sergio Felipe de Oliveira, crer que nossos pensamentos nascem apenas em nossa cabeça, como se as imagens do televisor saíssem de dentro do aparelho e não fosse apenas o resultado da recepção de um sinal enviado de uma estação transmissora de TV distante muitos e muitos quilômetros de nossa casa.
E retornando ao nosso tema anterior, só a nossa ignorância do nosso próprio poder interno e/ou nossa fragilidade emocional supõe que precisamos de auxílio de alguém, além de nossa própria sabedoria interior, para conhecer a Deus e ao Universo.
Tudo que precisamos saber está em nós.
Todo o poder que precisamos está em nós, e só não é plenamente manifesto porque culturalmente fomos treinados para rejeitar, desde a infância, as informações que nos chegam deste núcleo de saber interno, e a acreditar que, o que nos chega ao cérebro, vem apenas pelos sentidos.
A crítica brilhante de Schopenhauer a Kant, no prefácio de “O Mundo como Vontade e Representação”, não sem antes desculpar-se pelo que ia falar por quinze páginas, mostrou que o mestre de Konisberg havia menosprezado o papel dos instintos que nos trazem informações do próprio corpo através da medula e dos nervos aferentes e de propriocepção, a percepção de nós mesmos.
Não apenas aprendemos na horizontal (o que vemos, o que ouvimos, o que tocamos), mas também na vertical (o que vem de nossos intestinos, pulmões, bexiga, glândulas e hormônios, ferormônios, etc.)
Estas milhares de informações atingem nosso cérebro de forma simultânea, nos transformando e ampliando nossa compreensão do mundo.
Agora, o esoterismo nos traz o próximo passo, a compreensão de um terceiro aspecto perceptivo, não só nos sentidos, não só proveniente de nossos órgãos e metabolismo interno, mas sim da percepção dos pensamentos e imagens que não são nossos, mas os quais somos capazes de captar se estivermos adequadamente preparados e disponíveis.
Tudo que o rosacrucianismo deseja é que despertemos para este poder interno.
Não precisamos de mestres, de orientadores, de gurus, de santos aos quais prestar devoção.
Não que seja proibido manifestarmos crenças ou nosso senso do sagrado através de uma religião X ou Y. Qualquer caminho para Deus é bom.
Só digo que não é necessário já que não temos que caminhar até Deus: Deus, ou como quer que o chamemos, está dentro de nós, em nosso íntimo, ou como alguns gostam de dizer, em nosso coração. Toda impressão de distância em relação ao Ser Supremo é, insisto, produto de séculos de condicionamento cultural de religiões, na maioria derivadas da Igreja de Paulo e de Pedro, igrejas que divulgaram a tese de um Deus Antropomórfico, cheio de paixões e qualidades humanas como misericórdia, ou de forma antagônica, desejo de vingança.
Na verdade tal distância entre nós e a Fonte, chamemos assim, não existe.
A situação real é mais parecida com o nosso próprio nariz o qual está tão próximo de nós e tão perto de nossos olhos que tendemos a esquecê-lo e só visualizá-lo ao espelho.
Assim, recuperar esta percepção desta, como Blavatsky gostava de dizer, poeticamente, “Voz do Silêncio”, é o verdadeiro objetivo da educação em qualquer escola esotérica séria, voz que uma vez desperta nos liberta da necessidade de perguntar a alguém e esperar que ele nos responda qual é a natureza da Verdade.
Fujamos dos fenômenos psicanalíticos de transferência psicológica. Aceitemos corajosamente a responsabilidade não só de pensar com nossa própria cabeça, mas principalmente de sentir com nosso próprio coração.
O resto é silêncio.

terça-feira, 1 de março de 2016

O CERTO E O FÁCIL

Por Mario Sales, FRC, SI, MM




Um leitor do blog me procurou particularmente para dividir suas angustias sobre um problema pessoal. Tratava-se de uma questão de saúde, na verdade de saúde mental, e me perguntava qual a posição da Ordem Rosacruz sobre isso.
Expliquei que assuntos daquela natureza não eram objeto de considerações esotéricas e por isso a Ordem não tinha nada a falar sobre o caso. Que se tratava de um problema médico e que como tal o frater deveria procurar auxilio medico e psicoterápico, com uma boa perspectiva de melhora nos sintomas.
Ato contínuo, ele me indaga: “Frater, eu não posso fazer esse tratamento, é muito caro.” Respondi que poderia ser feito através da saúde pública, sem ônus financeiro. Mesmo assim ele questionou: “- Mas não existe um procedimento velado (esotérico) para resolver isso?”.
Enquanto desfazia este último esforço de não dar a atenção necessária ao problema, vi em seus comentários expresso o sentimento de que o Esoterismo, principalmente sua parte operacional, o Ocultismo, esconde soluções simples e rápidas para todas as questões mundanas e cotidianas.
Como ele é leitor do blog e como essa dúvida ou esta falsa convicção, de que no Ocultismo existe uma série de maneiras para evitar o Carma ou as atribulações da existência, deve ser uma impressão não tão incomum, resolvi elaborar mais sobre o tema para complementar minha resposta para ele em particular e para fratres e sorores em geral, que compartilhem dessa perspectiva.
Na verdade, a vida não é fácil para nenhum de nós, seres humanos. E recursos comprovados que possam atenuar nossas dificuldades pessoais não devem ser menosprezados em detrimento de condutas sem suporte nos fatos e nos experimentos, ou mesmo sem domínio de nossa parte.
Se alguém se opuser a essas afirmações dou alguns exemplos de humanidade e limitações presente entre alguns indivíduos acima de qualquer suspeita.
Comecemos pelo Buda, Sidarta Gautama, que conheceu prazer e deleite durante toda a juventude, e que ao se deparar, pela primeira vez, com os três problemas da existência, a doença, a senilidade e a morte, foi tomado de uma emoção tão intensa que embrenhou-se na mata durante uma madrugada, trocando seu palácio por cinco anos de privações, desconforto e meditação. Esses cinco anos não foram cinco dias. Foi um período de dor e cansaço, de momentos de tentação, instantes de dúvida, de sofrimento físico e psicológico. Sua dignidade, sua determinação e firme convicção de busca da iluminação foram suas armas para atravessar sua noite negra e emergir mais sábio ao final.
Assim vemos que ele, o Buda, passou por problemas e optou por aprofundar seu auto conhecimento através do esforço meditativo, com determinação e sacrifício, até que pudesse transcender suas limitações. Sua santidade que se manifestaria a posteriori não livrou-o de pagar o preço da sabedoria.
Pode-se argumentar que após a iluminação sua vida tornou-se mais serena e fácil, o que provavelmente não é verdade, pois "a vida vem em ondas" e manter-se sereno sobre as águas revoltas do Oceano sempre será um exercício permanente, que requer prática e uma convicção que não é comum na maioria das pessoas, como demonstra a passagem bíblica envolvendo Pedro apóstolo, um barco e Jesus.
E para que não restem dúvidas, entretanto, chamo ao palco o mesmo Jesus, o Cristo, outro nobre líder espiritual, agora do Ocidente, embora nascido também no Oriente, já que “a luz vem do leste”.
Homem de rara percepção, capaz de conhecer o futuro e os desígnios divinos, pouco antes de seu martírio ele passa a noite no Getsêmani, um monte perto de Jerusalém, em oração e prece, tomado pelo medo e pela angústia. Atravessa ali momentos de intensa ansiedade; sua sangue. Mesmo assim, não evita, se bem que, supõe-se pudesse tê-lo feito, o destino que julgava ser o mais adequado a criar, historicamente, as bases para um novo conceito de espiritualidade.
É preso, torturado, morto e, após três dias, transcende sua noite negra, como chamam os rosacruzes, ressuscitando transfigurado, em corpo glorioso, e retornando ao convívio dos discípulos, para comer com eles e mostrar a superioridade do espírito sobre a matéria.
De forma alguma seu sofrimento foi menor por causa de seus conhecimentos esotéricos e de seu poder místico.
Os verdadeiros místicos e esoteristas sabem que não podem abrir mão de fazer o certo e trocá-lo pelo caminho mais fácil e que o verdadeiro milagre está em render-se às vicissitudes da existência, de modo estoico, confiando em que Deus tem um plano para nós, mas cumprindo nossa parte nesta relação e buscando, dentro da nossa circunstância, os meios e maneiras de atingir o melhor resultado possível, para nós e para a sociedade.
Pensar que existe um atalho, uma via rápida que nos exime de atravessar as experiências que Deus julga necessárias ao nosso aperfeiçoamento é não compreender adequadamente a razão de nossa passagem por este plano de evolução. Estamos aqui para desfrutar das situações que nos são apresentadas pela vida, podendo ou não sermos bem sucedidos ao tentar resolvê-las com suas nuances e dificuldades inerentes, mas, e o mais importante, empenhando nosso melhor esforço tentando vencer nossos desafios diante de nossas limitações.
Ah! O Cristo e o Buda não são exemplos satisfatórios já que são seres de grande e indiscutível evolução. Muito bem então. Vamos reduzir nossas expectativas a pessoas também importantes no esoterismo e no Ocultismo, mas sem a luz dos indivíduos citados acima. Falemos de três pessoas, dois rosacruzes e um esoterista francês. Os rosacruzes: Francis Bacon, imperador da Ordem no século XVII e o Conde de Cagliostro, conhecido ocultista do século XVIII. E o Esoterista francês será Papus, o reorganizador da Ordem Martinista com Chaboseau, no final do século XIX.
Bacon conheceu glória e respeito, produziu literatura filosófica e esotérica, mas mesmo assim, não evitou passar por um período de sofrimento, vergonha e prisão, mesmo que por pouco tempo, tendo sido afastado de seu cargo de Chanceler sob a acusação de corrupção. E Cagliostro, perseguido por inimigos invejosos, terminou seus dias de bondade e conhecimento na prisão da Bastilha, aonde faleceu.
 E finalmente, o grande vidente Papus, não foi capaz de evitar a sua própria morte de tuberculose em uma trincheira na 1a guerra mundial, para muitos demonstrando assim uma incapacidade de antever o perigo e desviar do perigo.
Todos tinham grande conhecimento esotérico e ocultista. 
Não consta que tenham usado este poder para fugir aos acontecimentos que os atingiram; nem consta que recusaram seu destino através de meios mágicos e secretos. 
Talvez não soubessem como; talvez não quisessem. Acredito que nunca saberemos.
Prefiro creditar estes procedimentos aquele fator imponderável, mas presente em todas as situações difíceis que atravessamos ao longo de uma encarnação: nossa própria humanidade, esta mesma humanidade que como qualidade inerente ao estado de ser humano, nos liga e conecta ao Conde Cagliostro, à Bacon, Papus, Cristo e Buda.
Todos somos homens ou mulheres, todos nós devemos usar tudo que sabemos e o que outros sabem em prol de nossa melhoria de qualidade de vida física e espiritual.
Porque não há atalhos e viver dá trabalho . 
E o mais seguro é seguir o caminho ortodoxo, do esforço pessoal, da humildade em receber orientações que nos ajudem a melhorar, de ouvir o outro e a si mesmo, e, se formos sinceros, marcharmos decididos em direção à solução de todos os nossos problemas.
Nem que levem cinco anos ou nos cause uma dor intensa.
Emergiremos depois aperfeiçoados, ressurrectos, pois aquilo que não nos mata (e, às vezes, o que nos mata) nos fortalece, como dizia Nietzsche.
Não podemos abrir mão de nosso esforço pessoal, já que este esforço, físico , intelectual e espiritual, é, ao fim e ao cabo, a maior magia transformadora que temos a nossa disposição.
E concluamos este ensaio com este pensamento: só está pronto para ser um Mago aquele que não procura resolver tudo pela Magia.