Por Mario Sales
“...A Super-Alma, a Causa, a
Divindade;
não revelada pela forma humana ou pela palavra,
mas que preenche e
inspira toda alma
vivente no vasto universo
de acordo com suas medidas;
cujo
templo é a Natureza
e cuja a adoração é a admiração.”
H.P.Blavatsky, in “Isis sem Véu”,
página 123,11ª edição, 2016,
Editora Pensamento.
Quem diria que ela, justamente ela, a paladina que investe
contra os cientistas céticos, (como se a crença pura e simples, sem comprovação
experimental fosse uma virtude de caráter), pudesse produzir um trecho mais afim
com o que chamamos, contemporaneamente de pensamento científico. Enquanto eu,
Flavio e Wilson lemos página após página esse 2º volume dedicado a Ciência,
volta e meia a discussão reaparece: Blavatsky, sentindo-se atacada pelas
posições céticas de sua época, se debate no texto com estes pseudo-inimigos, a
meu ver de forma quixotesca. Sempre comento que uma pessoa com a força e a
autoridade que ela possuía não poderia preocupar-se em obrigar, sim esta é a
palavra, obrigar o meio científico da sua época a aceitar, a força, suas crenças e seus
postulados.
Nenhum esoterista em sã consciência jamais precisou que
alguém do meio científico o apoiasse para se sentir mais seguro nas suas
posições. Um esoterista crê no que crê porque assim supõe que seja a realidade
ampliada, e não por que alguma descoberta científica atual ou pregressa lhe
apoie o pensamento. Vejam, ninguém se dedica ao esoterismo porque quer. Existe
uma afinidade, quase um chamado para que o indivíduo venha participar do
trabalho místico, tornando-se membro de alguma escola tradicional. Mas a
primeira coisa que devemos entender, (e nunca entendi porque ela, Blavatsky,
nunca entendeu isso), é que nosso campo de saber, o esotérico, é um campo
específico, que não dialoga (em detrimento das opiniões de pensadores como
Edgard Morin) com outro campo qualquer da Ciência.
É como dar óculos de lentes coloridas diferentes para duas
pessoas, pedir que os coloquem e depois querer que ambas vejam o mundo do mesmo
jeito.
Esoteristas são esoteristas, cientistas são cientistas, e
melhor seria que não se tentasse esse enxerto de um no outro. Primeiro porque é
desnecessário.
Nem os cientistas precisam dos esoteristas, nem os esoteristas
precisam dos cientistas, mesmo que achem que o que fazem seja um tipo de
trabalho científico.
Só que são campos com parâmetros de trabalho diferentes, partindo de premissas
conflitantes, e a primeira delas, que a Ordem Rosacruz pareceu querer superar,
no início do século passado, é a total ausência de um trabalho experimental, mensurável e sistemático, dentro dos meios esotéricos.
Sem dados colhidos de maneira organizada e em experimentos
controlados, jamais poderemos dialogar com o meio científico.
Os cientistas são céticos porque tem que ser, metódicos
porque precisam, porque sabem que o testemunho humano é o fenômeno menos
confiável que existe na face da terra.
O professor Neil De Grasse em uma palestra recente que está
no YouTube, falando sobre isso, diz ficar impressionado que no direito o
testemunho de pessoas seja considerado uma prova legal. Em 1957, o diretor Sidney Lumet, em um clássico do cinema, "12 homens e uma sentença", com uma atuação memorável de Henry Fonda, defendeu a mesma idéia.
Porque em ciência, e é assim que deve ser, o fato de que
alguém afirma alguma coisa não é prova de que aquilo é verdade.
Não se trata de se desconfiar da boa fé de quem dá seu
testemunho; é apenas reconhecer alguns aspectos da psicologia e da neurologia aplicada,
fatos como as chamadas “ilusões de ótica”, as quais provam e demonstram que o
cérebro e os sentidos podem ser enganados pelos fenômenos ou por algumas
imagens.
Portanto, pessoas não são confiáveis como fiadores do que é
e do que não é real.
É melhor entregar esta questão na mão de um especialista em
investigar a verdade dos fenômenos. E esse especialista, provavelmente, será um
cientista. Praticar ciência é buscar superar as limitações de nossos olhos,
ouvidos e cérebro através de aparelhos que possam, de modo impessoal e não
subjetivo, avaliar os fatos a nossa frente. É seguir um método de investigação
que possa ser checado a cada passo, que possa ser contestado e testado várias e
várias vezes, e observar se outras pessoas conseguem resultados iguais, esta sim, uma demonstração de confiabilidade em meus achados e em minhas
conclusões a partir dele.
Crer por crer não faz parte da Bíblia da ciência.
Os cientistas são mais humildes que os esoteristas e
duvidam, não só de outros, mas deles mesmos. Por isso fazem experimentos, tomam
notas, tiram conclusões que novamente serão testadas muitas e muitas vezes por
várias pessoas em locais diferentes.
Mais: só pelo fato de que todo cientista é por tradição e
profissionalismo obrigado a compartilhar o que sabe é que outros saberão de seu
trabalho e poderão se dar ao esforço de testá-lo por eles mesmos.
Esoteristas, também por tradição, não compartilham, e hoje
ainda, como se vivêssemos na idade média, escondem o que sabem, isto é, quando
sabem e se sabem alguma coisa.
Tenho uma forte impressão de que a maioria dos depoimentos de
esoteristas sobre fenômenos que tenham presenciado não passa de fantasia e
ilusão. O que não impede que em alguns casos realmente algo tenha acontecido. E aí, se houvesse um mínimo de espirito científico nos esoteristas, eles se preocupariam em documentar o fenômeno, descrevê-lo, e se não pudessem
fazê-lo, guardarem discrição e não falarem do que conseguiram, até poder, junto
com a narrativa, apresentar um exemplo palpável do fenômeno desencadeado.
Histórias e relatos são apenas isto e já de há muito,
ninguém confia em afirmações sem comprovações.
É bem verdade que nasce um tolo a cada minuto, como diz o
ditado, e que as pessoas de mente fraca são maioria, deixando-se induzir por
charlatães de toda espécie e até acreditando em absurdos como o atual movimento
antivacinas. Existe, eu sempre comento, uma nuvem de obscurantismo pairando
sobre a sociedade, esperando um momento para avançar sobre tudo que
conseguimos, principalmente nos últimos cem anos, e jogar tudo por água abaixo.
Isto me assusta sobremaneira.
Como místico, como esoterista e como médico.
O esoterismo não é uma religião, mas também se baseia em uma
coleção de axiomas e crenças que, na maioria das vezes, não são comprováveis.
Antes que isso mude, nós esoteristas não conseguiremos o tal
diálogo entre ciência e esoterismo, áreas de conhecimento que não falam a mesma
língua, e que por isso mesmo não terão como se comunicar.
Só uma coisa nos une, cientistas e esoteristas: o mesmo
fascínio pela Criação. Ambos olham para o mundo com respeito e reverência,
acreditando que a criação tem um perfil peculiar “cujo templo é a
Natureza e cuja a adoração é a admiração”.
Pode ser este o ponto de encontro entre esses dois campos,
desde que sem arrogância, sem ilusões ou fantasias e sempre com muita, muita
humildade.
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