Por Mario Sales
Escrever a lápis faz com que o pensamento flua mais devagar, com mais cautela.
Até a atitude física de quem escreve a lápis é diferente. Não se força muito a ponta do grafite no papel, para que não quebre.
Da mesma maneira que escrevemos com mais prudência, pensamos com mais prudência.
Por ser o lápis tão delicado, não se pode escrever com um lápis sobre assuntos controversos e polêmicos, mesmo que se quisesse.
As idéias descritas com um lápis nunca serão passionais, mesmo que desejássemos. O traço suave do lápis no papel nos impede sobre conflitos e disputas.
Tudo é mais quieto no traço do lápis. Até os contornos das letras são mais artísticos e a caligrafia mais elaborada.
Penso que precisamos, ou melhor, eu preciso, escrever mais a lápis minha vida, descrever com mais esmero e vagar meus sentimentos. Sem pressa, letra após letra. É bem provável que desse modo eu escreva com menos ansiedade, até porque errar com um lápis é sempre menos angustiante.
Os lápis, em sua generosidade, permitem as borrachas, aquelas que fazem desaparecer nossas falhas, nossos enganos e equívocos. Pena que na vida real não exista semelhante recurso.
Infelizmente não podemos, na vida real, apenas apagar os trechos dos quais nos arrependemos.
Textos a lápis são corrigíveis. Vida, nem sempre.
Portanto os lápis, ao contrário das canetas esferográficas, são mais misericordiosos com nossas falhas e lapsos.
Graças as providenciais borrachas, textos a lápis, de correção em correção, ficam mais perfeitos ao final.
Por comparação, a História da Ciência é escrita a lápis, enquanto fundamentalistas religiosos escrevem sua história com esferográficas, geralmente com tinta vermelha.
Em um texto a lápis, é impossível o dogma, só as teorias.
Tudo fica em aberto para ser revisado ou apagado, se necessário.
Como a nossa vida, textos a lápis são efêmeros, podem e serão apagados de acordo com a vontade do pequeno escritor. Nossos traços vitais também podem ser apagados, a qualquer instante, de acordo com a vontade do Grande Escritor. A vida é muito frágil.
Por isso mesmo, devemos ter muito capricho ao escrevermos nossa própria vida, fazendo valer cada letra, cada palavra, cada linha de nossa existência.
Se apenas uma letra for colocada de modo errado, toda a frase poderá perder o sentido.
Velemos com carinho por cada uma das muitas letras de nossos dias, deixando prudentemente em aberto a possibilidade de voltar atrás, sem embaraço, pesar ou lamentação. Afinal correções são normais em qualquer texto que busque a perfeição.
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