Por Mario Sales, FRC
“Conforme
afirmamos, Mme Helena P. Blavatsky foi a primeira a apresentar popularmente aos
estudantes místicos um dos mestres da Grande Fraternidade Branca. Ela obteve
permissão de seu mestre (El Morya) para assim fazer (…). Fez ela muitas
descrições interessantes de manifestações de seu mestre (Morya) e mestre
companheiro (Ku-Thu-Mi). (…) Nós, que já estabelecemos contato com seu
mestre e com outros e que trabalhamos sob sua orientação, conhecemos as
coisas maravilhosas que por eles e por intermédio deles são realizadas
diariamente (…).”
Manual
Rosacruz, H. Spencer Lewis, 6ª edição, coordenação de Maria A. Moura, Ed Renes,
pág. 205 e 206
“Ao
aproximar-se o momento de cada jurisdição ou país promover o renascimento da
Ordem, tomavam-se providências para a habitual emissão de um manifesto, ou
panfleto, que lançava o começo de um novo ciclo. (…) Esse manifesto, decreto,
ou símbolo, anunciava a descoberta de uma “tumba”, em que for a encontrado o
“corpo” de um grande mestre, C. R-C (Cristian Rosenkreutz), juntamente com
joias raras e escritos secretos ou inscrições gravadas em pedra ou madeira, que
conferiam poderes aos descobridores da “tumba”, para restaurar a secreta
organização. (…) É preciso que se torne evidente, para o leitor desta
história, que a descoberta de um “corpo” numa “tumba”, ou do corpo de uma
pessoa conhecida como Cristian Rosenkreutz é alegórica, não devendo ser
compreendida no seu sentido literal. Em primeiro lugar a palavra
“corpo”, na língua em que foi primeiramente empregada simbolizava algo
inteiramente diferente do corpo físico de um homem. Em segundo lugar as
iniciais C. R-C não significavam Cristian Rosenkreutz, exceto na tradução das
palavras que elas representavam para o alemão. Estas iniciais, significando
Christus da Rosa-Cruz, podem ser traduzidas para o latim, o francês e outras
línguas sem qualquer alteração; portanto, as iniciais C.R-C, quando usadas a
primeira vez, não se referiam a palavras alemães ou francesas, e sim latinas.”
In
“Perguntas e Respostas Rosacruzes”, H. Spencer Lewis, Biblioteca Rosacruz,
Grande loja do Brasil, 2ª edição, 1983, páginas 73 e 74.
“Eliphas
(Levi) estudou os manuscritos rosacruzes (agora reduzidos a três exemplares na
Europa). Estes expõem nossas doutrinas orientais com base nos
ensinamentos de Rosenkreutz, que após o seu regresso da Ásia, as revestiu com
uma roupagem semi cristã, com a intenção de proteger os seus discípulos da
vingança clerical. (…) Rosenkreutz ensinou verbalmente. Saint Germain
registrou as boas doutrinas em linguagem cifrada (…).
Ku-Thu-Mi In “Cartas
dos Mahatmas para A.P. Sinnett, 2ª edição volume I, Editora Teosófica,
Brasília, DF, págs. 131,132.
Alguma dessas afirmações não é verdadeira.
Os rosacruzes de AMORC aprendem desde cedo que nosso
hierofante, a mais alta autoridade da hierarquia da Ordem não é o Imperator mas
Ku-Thu-Mi, um dos mestres da Grande Fraternidade Branca, entidade revelada ao
mundo por Helena Petrovna Blavatsky, fundadora da Sociedade Teosófica.
El Morya, Mestre de Mme Blavatsky, e Ku-Thu-Mi, seu mestre
companheiro mantiveram por trinta anos, entre 1870 e 1900, correspondência
pessoal, como todos sabem, com um editor de um jornal indiano chamado Alfred
Percy Sinnett[1],
editor do The Pioneer, em Alahabad. Essas cartas estão disponíveis em Londres,
na British Library. Foram publicadas de dois modos. Uma versão que as organiza
de acordo com seus temas principais, sob a égide de C. Jinarajadasa, à época
presidente da Sociedade Teosófica. A outra versão tem o título As Cartas dos
Mahatmas e foi organizada seguindo a ordem cronológica das mesmas, em dois
volumes. Ambas as publicações foram traduzidas para o português pela Sociedade
Teosófica e estão disponíveis em várias livrarias virtuais.
Alfred Percy Sinnett
Na segunda versão, “As Cartas dos Mahatmas”, Flavio me chamou a atenção para o trecho em epígrafe neste ensaio, na carta número 20. Neste trecho, Ku-Thu-Mi, nosso hierofante, afirma que um personagem, que aprendemos desde cedo na AMORC é fictício e simbólico, na verdade é real e histórico e teve existência física. Embora não se diga nada sobre isso, fica também a impressão nesse trecho que C. R-C foi o fundador da Ordem Rosacruz sendo que todos nós somos os seus seguidores, e isto por volta do século XVI. Embora não tenhamos como demonstrar com documentos nossa origem, nós, rosacruzes, nos consideramos herdeiros das escolas dos templos das pirâmides do Egito, e tradicionalmente é assim que cremos ter sido. Aceitar que toda a Ordem Rosacruz deva sua gigantesca tradição ao trabalho de um único homem e em época tão próxima, 4 séculos atrás, é desconcertante. Principalmente quando tal afirmação é feita por um mestre da Fraternidade Branca, um alto iniciado, além de nosso próprio Hierofante.
Ou o trecho de As cartas dos Mahatmas está equivocado ou adulterado
no original, ou a afirmação de Spencer Lewis sobre a condição literária e
simbólica do personagem C. R-C é falsa.
Não há como conciliar os dois trechos.
Os teósofos dirão que o que está nas cartas é fiel as
declarações do Mahatma Ku-Thu-Mi, e provavelmente nos remeterão ao exemplar
original na British Library para comparação.
British Library, Londres
As autoridades administrativas de AMORC também não abrirão
mão da total confiança nas declarações de nosso fundador no século XX, cujos
textos são as colunas de sustentação do trabalho da Ordem nos últimos 100 anos.
Só uma adulteração do texto de Ku-Thu-Mi poderia desfazer
esse impasse mas caso isso não tenha acontecido, temos que admitir que, se
Spencer Lewis está sendo fiel aos fatos que lhe foram transmitidos por Sar
Hyeronimus, na França, Mestre Ku-Thu-Mi, o Ascenso, não é verdadeiramente
infalível, e cometeu um equívoco.
Os textos teosóficos estão coalhados de declarações pelo
menos errôneas, que na maioria das vezes devem-se a erros de tradução ou mesmo
podem ser fruto de adulteração do original. Pelo menos na edição da Editora
Pensamento de 1976, em português, que já foi dita por Carlos Cardoso Aveline,
da Editora Teosofica em Brasilia, como uma edição não confiável. Ou como no
caso relatado por mim em um ensaio anterior, Filósofos de Fogo, de 26 de julho
de 2018, e que transcrevo abaixo:
Blavatsky demonstra aqui que mesmo grandes esoteristas, orientados por mestres cósmicos, podem incorrer em equívocos.
Mais à frente, nos comentários ao oitavo verso da Estancia 3, numa belíssima passagem que revela todo seu conhecimento universalista e esotérico, diz ela:
“É ainda igualmente significativo o estranho símbolo adotado; seu verdadeiro sentido místico é a idéia de uma matriz universal, representada pelas Águas Primordiais do Abismo, ou abertura para a recepção e a subsequente saída daquele Raio Uno (o Logos), que contém em si os outros Sete Raios Procriadores ou Poderes (os Logos ou Construtores). Daí terem os Rosacruzes eleito por símbolo o pássaro aquático (seja o cisne ou o pelicano) com os seus sete filhotes (símbolo modificado e adaptado à religião de cada país. Ain Sof é chamado no Livro dos Números a "Alma de Fogo do Pelicano". Surge em cada Manvantara como Nârâyana ou Svâyambhuva, o Existente por Si, e, penetrando no Ovo do Mundo, dele sai no final da divina incubação, como Brahmâ ou Prajâpati, o progenitor do Universo futuro, no qual se expande.
É Purusha (o Espírito), mas também é Prakriti (a Matéria).”
Ora, qualquer rosacruz que tenha pertencido ou pertença à Ordem Maçônica, em qualquer de suas potências aceitas, verá que aqui não temos um símbolo rosacruz, mas sim um símbolo eminentemente maçônico, ligado ao chamado "Grau do Cavaleiro Rosacruz", ou Grau 18, que foi , aqui, equivocadamente atribuído aos rosacruzes em si.
Deixo em aberto minha perplexidade e apenas anoto esta contradição entre textos de duas nobres e respeitáveis tradições esotéricas, que atribuem a um mestre ascenso, em princípio infalível, como já dito, declarações contraditórias e inconciliáveis, esperando eventualmente que esta dúvida seja desfeita por um leitor tão detalhista quanto eu.
[1] Alfred Percy Sinnett (18 de Janeiro de 1840 - 26 de Junho de 1921) foi escritor e teósofo.
As cartas dos Mahatmas, que geraram a
controvérsia que mais tarde contribuíram na divisão da Sociedade Teosófica, foram escritas majoritariamente
para Sinnett. Em 1880, Helena Blavatsky e Henry Olcott visitaram Sinnett em Shimla. Em 1881 Sinnett escreveu O Mundo Oculto, e em 1883, Budismo Esotérico. Posteriormente,
Sinnett foi presidente da Loja de Londres da Sociedade Teosófica. Ele foi
Vice-Presidente da Sociedade Teosófica entre 1880-88, 1895-1907, 1911-1921, e
atuou como Presidente por quatro meses em 1907, logo após a passagem de Henry
Steel Olcott.
Fonte Wikipedia
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